Samuel Pessôa

Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP.

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Samuel Pessôa
Descrição de chapéu PIB

Dois anos de epidemia

Ainda é preciso crescer muito para voltarmos à tendência anterior à Covid

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O IBGE divulgou na sexta-feira (4) o resultado da atividade no quarto trimestre de 2021. A economia rodou 1,6% acima do mesmo trimestre de 2020 e cresceu 0,5% em relação ao terceiro trimestre. Resultado um pouco acima do que esperava o mercado. Haverá leve revisão para melhor das estimativas para o crescimento em 2022. A equipe do FGV Ibre, liderada pela economista Silvia Matos, foi bem e cravou o resultado.

É útil olharmos o quarto trimestre do ano passado em comparação com o mesmo período de 2019, o último trimestre antes de a epidemia chegar por aqui. A economia rodou 0,5% acima. Dado que a tendência de crescimento observada no triênio de 2017 até 2019 foi de pouco menos de 1,5% ao ano, deveríamos estar, no quarto trimestre de 2021, 3% acima do mesmo período de 2019. Ou seja, estávamos, no quarto trimestre de 2021, 2,5 pontos percentuais abaixo da tendência anterior à epidemia.

Lojas da região da 25 de Março, no centro de São Paulo, fechadas na pandemia do coronavírus - Eduardo Knapp - 19.abr.2020/Folhapress

Três setores rodaram abaixo dos níveis observados antes da epidemia: indústria de transformação, outros serviços e serviços da administração pública. A indústria tem sofrido muito com a falta de insumos e os problemas de logística em geral. Ainda parece que a queda até o fim do ano passado deve-se mais à escassez da oferta do que à carência de demanda agregada. Mas essa constatação deve deixar de valer ao longo de 2022, com os efeitos defasados da elevação dos juros sobre a demanda.

O item "outros serviços", isto é, entretenimento, alimentação fora do domicílio e serviços pessoais, rodou, no quarto trimestre de 2021, 1,4% abaixo do mesmo período de 2019. Já serviços da administração pública, 1,7% abaixo.

O cenário do FGV Ibre para 2022 é de crescimento de 0,6%. Meu cenário é um pouco mais otimista. Trabalho com expansão na casa de 1% a 1,5%.

O carregamento estatístico de 2021 para 2022 será de 0,3%. Há ainda muito crescimento para que voltemos à tendência anterior à epidemia e, adicionalmente, a política fiscal será fortemente expansionista, tanto da União quanto dos estados e municípios. Temos que lembrar que em 2022 há eleições e o caixa dos estados e municípios em dezembro de 2021 rodava na casa de 2% do PIB. Esse caixa será consumido. Por outro lado, a política monetária contracionista reduzirá o crescimento. A resultante deve ser um crescimento um pouco maior de 1%.

Nesta coluna de análise conjuntural, temos que tratar do câmbio. Entre meados de dezembro último e agora, o câmbio valorizou-se pouco menos de R$ 0,75 por dólar. Esse fortalecimento da moeda é fruto do encarecimento das commodities. Como somos exportadores de commodities, sempre que estas sobem de preço no mercado internacional nossa moeda se fortalece, e vice-versa.

Esse mecanismo deixou de funcionar entre maio de 2020 e novembro de 2021. A partir de dezembro, normalizou-se a gangorra entre câmbio e commodities. É por esse motivo que a eclosão da guerra entre a Ucrânia e a Rússia não teve muito impacto no real. A subida do preço das commodities compensou. Temos que lembrar que, em 2021, o saldo da balança comercial de petróleo e seus derivados foi superavitário em US$ 20 bilhões.

O choque da guerra lembra os anos 1970: após um choque de oferta fortíssimo, a triplicação do preço do petróleo na década de 1970 e agora os choques provocados pela Covid, temos um novo abalo, o segundo choque do petróleo, de 1979 e, hoje, a guerra. A diferença é que lá nos anos 1970 éramos importadores de petróleo e agora somos exportadores.

Por esses motivos penso que a guerra não terá impactos apreciáveis sobre o crescimento, apesar de piorar um pouco o cenário inflacionário. A ver se haverá ou não reflexos sobre a política monetária. Cedo ainda para sabermos.

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