Shireen Mahdi

Economista principal do Banco Mundial para o Brasil e doutora em economia pela Universidade de Manchester (Reino Unido)

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Riscos globais e resiliência brasileira

Em vista do sombrio cenário global, Brasil deve tirar o máximo proveito de sua resiliência econômica.

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O início do ano é uma época agitada para os analistas econômicos, que fazem muitas previsões para o período que se inicia. Para 2024, a maioria prevê um cenário global sombrio.

Segundo a última edição do relatório Perspectivas Econômicas Globais do Banco Mundial, o crescimento mundial deve registrar o terceiro ano consecutivo de desaceleração em 2024 —chegando a 2,3%— em meio aos efeitos persistentes de arrochos na política monetária, restrições nas condições de crédito e o enfraquecimento do ambiente de investimento global.

O baixo crescimento da China enfraquece ainda mais essas perspectivas. Além disso, há riscos geopolíticos aumentados, associados aos conflitos na Europa e no Oriente Médio e à fragmentação do comércio, que podem levar a disrupções significativas nos mercados de commodities e no comércio internacional.

Clientes compram frutas em banca no Rio de Janeiro
Alimentos continuam sendo uma fonte importante de renda para o Brasil - Ricardo Moraes - 02.set.2021 / Reuters

Esse é um cenário desfavorável para o Brasil, que, como a maioria das outras economias do mesmo porte, está exposto a esses ventos contrários vindos de várias partes. Ainda assim, a economia brasileira tem certas fontes de resiliência capazes de ajudá-la a superar essas turbulências globais ao longo do próximo ano.

O Brasil tem um banco central confiável, o que ajuda a garantir que as expectativas de inflação permaneçam bem ancoradas e abre caminho para cortes futuros nas taxas de juros. Além disso, seu mercado financeiro interno é robusto e estável, tendo enfrentado bem a crise da Covid-19 e outros choques que se seguiram. Ambos os fatores são cruciais para a manutenção da estabilidade macroeconômica e da confiança na economia, além de serem essenciais no contexto de taxas de juros globais mais elevadas durante um período mais longo.

O aumento da capacidade do setor agrícola, que sustentou o desempenho comercial do Brasil nos últimos anos e o crescimento econômico acima do esperado em 2023, é cada vez mais impulsionado pelo progresso tecnológico e por melhorias na logística.

Isso aumenta a resiliência da balança comercial a choques e posiciona o Brasil como um fornecedor confiável de alimentos e outros produtos agrícolas num mercado global que, em geral, enfrenta muitas turbulências. Um bom exemplo disso foi a capacidade do setor de expandir sua oferta nos mercados globais em 2023, compensando a queda nos preços das commodities naquele ano.

Uma demanda interna resiliente, que também contribuiu para o desempenho do crescimento no ano passado, continua a ser apoiada pela desaceleração da inflação, por um mercado de trabalho robusto e pelo volume significativo de transferências sociais do Bolsa Família e de outros programas de assistência social.

Além disso, o Brasil alcançou marcos importantes em termos de confiança dos investidores, avançando concretamente em reformas estruturais importantes, entre elas a reforma tributária (com foco na tributação indireta) e o novo arcabouço fiscal. Esses esforços contribuíram para melhorar o perfil de risco de investimento do país nos mercados global e doméstico.

No entanto, isso não significa que 2024 será um ano fácil para o Brasil. É prevista uma desaceleração do crescimento este ano: as estimativas do Banco Mundial apontam para uma queda do crescimento dos esperados 3,1% em 2023 para 1,5% em 2024, com espaço fiscal limitado.

Além disso, a economia está significativamente exposta a choques relacionados com os mercados das commodities ou a fenômenos climáticos (secas e inundações) que podem agravar as perspectivas econômicas. Logo, os formuladores de políticas públicas serão confrontados com desafios e "tradeoffs" significativos quando se trata de promover o crescimento, mantendo simultaneamente a disciplina fiscal e a credibilidade macroeconômica.

Todavia, a economia brasileira é capaz de superar essas turbulências, promover investimentos e talvez até superar as atuais expectativas de crescimento, como fez em 2023. Experiências globais demonstram que acelerações do investimento nas economias de mercado emergentes se seguiram a (ou foram acompanhadas por) mudanças nas políticas destinadas a melhorar a estabilidade macroeconômica, as reformas estruturais, ou ambas.

Quando o ambiente externo impõe desafios, tais esforços de reformas estruturais desempenham um papel crucial na catalisação de investimentos. O Brasil precisa demonstrar seu forte controle das finanças públicas e a credibilidade do novo arcabouço fiscal, ao mesmo tempo que continua a avançar nas reformas estruturais necessárias para acelerar o investimento e a produtividade. Isso será fundamental para que a economia consiga manter seu curso e superar os atuais ventos contrários globais sem sobressaltos.

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