Solange Srour

Diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management.

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Descrição de chapéu inflação juros

Os juros no Brasil têm mesmo que cair?

Não é só a política fiscal que definirá a política monetária

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Em breve saberemos qual é a proposta para o novo arcabouço fiscal que substituirá o teto de gastos.

Há grande expectativa por parte da equipe econômica e do governo de que tal anúncio —em conjunto com a reoneração dos tributos sobre gasolina e etanol e as demais medidas focadas na diminuição do déficit esperado para este ano— irá finalmente abrir espaço para que o Banco Central inicie o tão esperado processo de redução de juros. Será que essas iniciativas serão suficientes para assegurar à autoridade monetária que diminuiu consideravelmente o risco de a inflação ficar acima da meta?

Há dois principais canais de transmissão da política fiscal para a inflação.

O primeiro é via demanda agregada: elevação dos gastos do governo ou menor taxação impulsionam o consumo e o investimento privado. O crescimento do PIB pressiona a capacidade produtiva da economia, o que pode levar a inflação a subir. Quando a política fiscal é contracionista ocorre o inverso.

O segundo é o canal das expectativas para a trajetória da dívida pública: uma política fiscal vista como insustentável ao longo do tempo (seguidos déficits primários estruturais) resulta em aceleração da inflação. Isso porque quando se torna difícil vislumbrar a sustentabilidade fiscal, investidores exigem juros maiores para financiar os déficits fiscais, agravando o problema.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente Lula - Adriano Machado - 24.fev.23/Reuters

Em geral, como consequência do aumento do prêmio de risco, ocorre uma depreciação cambial e aumento das expectativas de inflação. Em alguns casos, investidores passam a esperar que o governo opte por melhorar os indicadores fiscais aumentando a inflação (imposto inflacionário) ou que o Banco Central desista de controlar a inflação a fim de não piorar a dinâmica da dívida —ambas as situações causam impacto sobre as expectativas de inflação.

As expectativas de inflação são uma das principais variáveis utilizadas pelo Banco Central, pois são incorporadas diretamente nos preços de produtos, serviços e salários. Além disso, elas são imprescindíveis para estimar as taxas de juros reais, as quais impactam decisões de consumo e investimento e, assim, o nível de atividade e a inflação.

Sem dúvida, as recentes medidas que aumentam a arrecadação ajudam a reduzir o impulso fiscal expansionista deste ano, no entanto pouco contribuem para diminuir a incerteza em relação à dinâmica da dívida nos anos à frente. Essa é a importância do novo arcabouço fiscal: trazer maior previsibilidade e confiança acerca dos superávits primários futuros, reduzindo as expectativas de inflação que começaram a desancorar com a aprovação da PEC da Transição.

De nada adianta pregar que o novo arcabouço será transparente, flexível e sustentável. Para que o Banco Central corte os juros será necessário que as expectativas de inflação reajam a essas qualidades.

Não é só a política fiscal que definirá a política monetária —outras variáveis são importantes para determinar a inflação. Uma, em particular, mudou bastante desde o fim do ano passado: o cenário global. Já não vale mais o consenso de que o processo de normalização da política monetária nos países avançados está perto do fim. Depois das recentes surpresas inflacionárias nos EUA e na Europa, há muitas dúvidas sobre quão longe os bancos centrais dessas regiões ainda irão com os juros e por quanto tempo eles precisarão ficar em patamares restritivos.

Juros globais mais altos requerem mais cautela na condução de nossa política monetária.

Outra variável relevante para o início do processo de queda de juros é a evolução do crédito. O aperto significativo das condições financeiras e seus impactos tanto nas concessões de crédito bancário quanto no acesso de empresas ao mercado de capitais estão prestes a desencadear a volta dos subsídios com uma possível mudança na lei da TLP (aprovada em 2017).

Por ser difícil separar o problema de contágio no mercado de crédito do estágio do ciclo de crédito, o caminho a ser escolhido parece ser o de amortecer o efeito restritivo da Selic e das taxas de mercado. Quando finalmente a política monetária começar a funcionar, corremos o risco de, ao invés de discutirmos melhorias estruturais no mercado de crédito, produzirmos o enfraquecimento de seu canal de transmissão.

Estamos no começo de um processo de reconstrução do arcabouço fiscal que requer credibilidade em um ambiente externo mais desafiador. Se formos na direção correta com políticas alinhadas, o Banco Central poderá executar com eficiência a tarefa de manter a inflação em torno da meta, criando condições para a economia brasileira retomar o crescimento. Caso contrário, corremos o risco de repetir a rota da profunda recessão entre 2014 e 2016.

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