Solange Srour

Diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management.

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Descrição de chapéu juros Selic inflação

A alta dos juros globais preocupa bancos centrais?

Crescimento, emprego e inflação determinarão crescimento dos juros

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Nesta semana, os rendimentos dos títulos do Tesouro americano de dez anos atingiram seu maior nível em 16 anos. A pressão refletiu-se globalmente, com as taxas de juros de mesmo prazo no Reino Unido e na Alemanha alcançando também os maiores níveis desde 2008 e 2011, respectivamente. No Brasil, tanto a curva de juros quanto o real têm sofrido os impactos dos juros globais mais elevados. Em geral, juros globais mais elevados pressionam preços de ativos vistos como mais arriscados.

Uma das explicações possíveis, não a única, para esse movimento é a resiliência da economia americana aos juros altos, que traz dúvidas sobre a continuidade da desaceleração dos núcleos de inflação (menos sensíveis aos movimentos de commodities e mais correlacionados à demanda). O crescimento econômico americano está acima das estimativas do Fed de sua taxa "potencial" de longo prazo de cerca de 2%, sugerindo que as taxas de juros em seu nível atual, de 5,25% e 5,5%, podem não ser muito restritivas para trazer o núcleo de inflação para a meta. Será que a chamada taxa de juro neutra, aquela que é consistente com inflação na meta e crescimento do PIB igual ao crescimento potencial, terá subido?

Fachada do Federal Reserve, o Banco Central dos EUA, em Washington - Reuters

A taxa de juros real de equilíbrio, no longo prazo, depende de fatores estruturais que condicionam a poupança e o investimento de uma economia: demografia, variação da produtividade, propensão de agentes econômicos a poupar, perspectivas de longo prazo da política fiscal, fluxo de capital, inovações no sistema financeiro, entre outros.

Dois fatores em particular têm chamado a atenção de analistas como possíveis causas para o aumento da taxa neutra americana. Em primeiro lugar, o aumento dos déficits e o aumento do endividamento público tendem a gerar um desbalanceamento entre a demanda por recursos e a oferta de poupança, provocando elevação na taxa de juros de equilíbrio da economia. Em segundo lugar, oportunidades de investimento que aumentem a produtividade, como a inteligência artificial, e o crescente investimento em energias limpas também pressionam a procura por poupanças, podendo aumentar a taxa neutra.

Nesta semana em especial, os investidores estarão atentos à mais importante reunião dos bancos centrais mundiais, que começa na sexta-feira (25), conhecida como Simpósio de Política Econômica do Federal Reserve de Kansas City, ou Simpósio de Jackson Hole, pois nela podem ser apresentados estudos acadêmicos que mostrem um aumento na estimação da taxa neutra americana.

Embora muitos documentos interessantes sejam discutidos todos os anos na conferência, é o discurso do presidente do Fed que concentra a atenção do mercado; e Jay Powell, assim como seus antecessores, costuma moldar sua comunicação dependendo das circunstâncias. Algumas vezes eles sinalizam medidas iminentes de política monetária; outras vezes aprofundam questões de política monetária de longo prazo. Os discursos de Ben Bernanke, que foi presidente do Fed entre 2006 e 2014, marcaram história: os feitos em pontos cruciais durante a grande crise financeira acabaram por antecipar medidas importantes de política monetária, como o segundo QE (ou quantitative easing, programa de compras de ativos) em novembro de 2010, a Operação Twist em setembro de 2011 e o QE em setembro de 2012.

Jerome Powell, presidente do Fed - Elizabeth Frantz - 26.jul.23/Reuters

Há um ano, Powell proferiu um discurso centrado nos custos necessários para reduzir a inflação: desaceleração econômica e aumento do desemprego. Agora, um ano depois, diante de um crescimento robusto e do desemprego perto de mínimo histórico, não é provável que o Fed esteja pronto para declarar o final inequívoco do ciclo de aumento de juros. Estará o Fed confortável com o aperto das condições financeiras causada pela alta dos juros longos? Ou a preocupação com sua permanência pode já se manifestar de alguma forma?

O título do simpósio deste ano, "Mudanças Estruturais na Economia Global", indica que as discussões serão mais focadas em temas como transformações no mercado de trabalho, novos padrões de consumo, reconfiguração das cadeias produtivas, migração energética e, consequentemente, possíveis mudanças de patamar do juro considerado neutro.

Sendo a taxa de juros neutra uma variável não observável e cuja estimação contemporânea é sujeita a elevada incerteza, o melhor que os bancos centrais podem fazer é estar atentos às possíveis mudanças nas suas estimativas. O comportamento dos juros globais nos próximos meses será, na prática, determinado pelo crescimento, emprego e inflação. No entanto, no longo prazo, as mudanças estruturais importam e são cruciais para os modelos que norteiam a política monetária e para comunicação dos bancos centrais.

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