Solange Srour

Diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management.

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Descrição de chapéu juros Selic inflação

Um mundo de mais riscos e mais inflação

Aumento de incertezas geopolíticas traz enormes desafios para a economia global

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O aumento dos riscos geopolíticos traz enormes desafios para a economia global. A Guerra da Ucrânia, a guerra no Oriente Médio e as tensões em curso entre os Estados Unidos e a China já têm impactado os mercados de matérias-primas, as cadeias de abastecimento, os padrões de comércio e os fluxos de capitais, além de amplificar incertezas sobre o futuro da oferta de produtos e serviços.

Não há dúvidas de que um dos efeitos colaterais mais diretos de um mundo fragmentado será mais inflação. Independentemente de a economia global continuar resiliente aos juros altos atuais ou da possibilidade de vermos uma desaceleração mais brusca, a probabilidade de voltarmos a ter uma inflação de equilíbrio ao redor dos níveis pré-pandemia parece muito baixa.

Uma trincheira com instrutor militar e soldados durante treinamento.
Soldados ucranianos treinam em trincheiras em campo militar na Inglaterra - Folhapress

A principal via de transmissão dos riscos geopolíticos para a inflação é a ruptura nas relações comerciais e na disponibilidade de insumos. Conflitos militares destroem ou tornam inacessíveis a infraestrutura-chave para o comércio internacional.

Após o início da guerra Rússia-Ucrânia, a imposição de sanções pelo Ocidente e a paralisação do transporte na região levaram a uma escalada nos preços das commodities produzidas pelos dois países, chacoalhando também as economias dependentes dessas exportações e trazendo um questionamento relevante sobre a necessidade de fortalecer a segurança energética e alimentar.

Por parte das empresas, as estratégias da cadeia de suprimentos têm mudado em resposta a esses riscos, com o nearshoring, o friendshoring e o reshoring, que priorizam a resiliência da cadeia de suprimentos em detrimento de preocupações com a produção ao menor custo.

Do lado dos governos, voltamos a privilegiar políticas industriais de subsídios para setores vistos como estratégicos. EUA e União Europeia canalizaram recentemente quase US$ 81 bilhões para a próxima geração de semicondutores, intensificando um confronto com a China pela supremacia dos chips no mundo. A imigração —que nos últimos dois anos tem ajudado a segurar a valorização dos salários nos EUA— é uma séria candidata a ter fortes restrições nos próximos anos.

Já a imposição de tarifas tem sido a mais frequente ameaça com impactos negativos imediatos. Tanto Biden quanto Trump mostraram uma postura dura em relação à China durante seus mandatos, e isso provavelmente continuará, independentemente de quem ganhe as eleições.

Trump menciona em sua campanha a possibilidade de uma tarifa de 60% sobre produtos chineses, bem como uma tarifa de 10% sobre todas as importações dos EUA. Embora os patamares pareçam mais parte da retórica, novos aumentos parecem ser uma proposta política séria. Já Biden anunciou, nesta semana, novos aumentos de tarifas sobre produtos como painéis solares, aço, alumínio, chips e veículos elétricos provenientes da China.

Outra fonte de pressão inflacionária é o aumento substancial que haverá com os gastos militares nos próximos anos. No ano passado, tivemos o valor recorde de US$ 2,44 trilhões —o maior acréscimo anual nos gastos com armas desde 2009 (6,8% em relação a 2022 e o nono ano consecutivo de aumento)—, de acordo com um novo relatório do Sipri (Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo, na sigla em inglês). Um dos maiores problemas para Europa, por exemplo, é como aumentar substancialmente seus gastos com defesa, que estão hoje bastante longe das metas da Otan.

Atrás de cargueiros militares da Alemanha e da Espanha, F-16 da Força Aérea da Romênia decola durante exercício da Otan na base de Turzii, na Romênia - Daniel Mihailescu - 14.mai.24/AFP

Tudo isso posto, um cenário geopolítico global relativamente estável e o amplo consenso de que o acesso às redes globais de produção e aos mercados financeiros internacionais apoiariam o crescimento econômico com inflação baixa não fazem mais parte do cenário de médio prazo, e as implicações para a política monetária certamente não serão desprezíveis.

Depois de experimentarem a grande sensibilidade da inflação às restrições de oferta e embarcarem no maior e mais sincronizado aperto da política monetária global em décadas, os bancos centrais ao redor do mundo terão o desafio de manter as expectativas de inflação ancoradas e impedir que tais choques impliquem em uma inflação ainda maior.

Infelizmente, não parece que terão apoio de políticas fiscais mais restritivas, o que levaria o mundo a trabalhar com taxas de juros mais altas.

Ou será que entraremos em uma discussão global sobre aumentos das metas de inflação?

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