Solange Srour

Diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management.

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Expectativas de inflação desancoradas são preocupantes

Credibilidade da autoridade monetária é crucial para expectativas

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As expectativas de inflação desempenham um papel crítico na eficácia da política monetária. É muito mais provável que um banco central seja bem-sucedido em alcançar uma inflação baixa e estável se conseguir ancorar as expectativas de inflação de longo prazo perto de seu objetivo de inflação. Isso porque estas afetam a inflação corrente por meio de seu impacto na fixação de salários e preços. Se os agentes econômicos acreditarem que choques exógenos que causem um desvio da inflação da meta tendem a se propagar de forma limitada, a ação do Banco Central no combate a pressões inflacionárias torna-se menos custosa.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, durante seminário realizado em São Paulo
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, durante seminário realizado em São Paulo - Rubens Cavallari-22.abr.24/Folhapress

É claro que credibilidade da autoridade monetária é crucial para a ancoragem das expectativas. No entanto, não menos importantes são o ambiente macroeconômico mais amplo, as características estruturais da economia e, em particular, a condução da política fiscal. Como a política fiscal impacta diretamente a demanda agregada e por conseguinte a inflação, se esta for percebida com expansionista em um horizonte longo, impactará as expectativas. O grau de confiança na sustentabilidade fiscal é outro ponto-chave: é improvável que as expectativas de inflação estejam bem ancoradas se houver temor de que a política monetária possa ser restringida pelo fato de que altas taxas de juros implicam em uma dinâmica pior para a trajetória da dívida pública.

Estamos, hoje no Brasil, com as expectativas desancoradas: as projeções de inflação da pesquisa Focus para os anos de 2025-26-27 estão descoladas da meta de 3% já faz alguns trimestres. No primeiro trimestre do ano passado, chegaram a 4%, com a discussão sobre uma eventual revisão para cima da meta. Depois de sua manutenção em 3,0%, as expectativas recuaram, mas não totalmente ficaram até recentemente 50 p.b. acima da meta pata os próximos 3 anos e nas últimas semanas, a expectativa de 2025 voltou a subir, chegando em a 3,60%. O que mais surpreende é que isto esteja acontecendo justamente quando a inflação corrente se realiza abaixo do esperado. Em geral, expectativas para um ano a frente, são bastante influenciadas pela inflação do ano em curso, pois quanto menor for esta, menor é a inércia para o ano seguinte.

Quando consideramos as inflações implícitas nos títulos indexados ao IPCA, vemos o mesmo movimento de desancoragem acontecer, inclusive para prazos mais longos. O que está por trás deste movimento, objeto de atenção especial nos discursos recentes dos membros do BC?

Primeiro cabe analisarmos por quê mesmo depois da manutenção da meta em 3%, as expectativas longas não convergiram para este valor. Algumas hipóteses possíveis:

1. Permanecem dúvidas sobre a condução da política monetária: será esta adequada para seu alcance, principalmente com a alteração da composição do Copom ao longo do tempo, em especial ao final de 2024, quando um novo Presidente do BC será escolhido?

2. O novo arcabouço fiscal e as metas de superávit não são suficientemente críveis para o alcance da estabilidade da dívida pública.

Já o mais recente aumento das expectativas, principalmente para 2025, pode estar relacionado:

1. A reprecificação dos mercados para o ciclo de afrouxamento monetário nos EUA. Quanto maior a taxa de juros americana, menor será nosso diferencial de juros, que impacta a taxa de câmbio. Um real mais depreciado implica em pressão altista para inflação;

2. Perda mais acentuada da credibilidade da regra fiscal com a mudança da meta primária de 2025/26/27 e ausência de medidas que indiquem que as blindem de novas alterações junto do avanço de pautas-bombas no Congresso;

3. A queda na popularidade do governo desencadeou medidas de estímulo à demanda (crédito e investimentos) e intervenções em empresas, públicas e privadas.

Diante dos fatores acima descritos, parece haver pouco espaço para redução das expectativas de inflação à frente, o que, por sua vez, impactará a própria dinâmica de preços. Com uma desancoragem, que se mostra persistente, será necessário manter a taxa de juros em nível contracionista por mais tempo para que a inflação convirja para a meta.

Neste momento é fundamental que o BC tenha uma comunicação transparente e efetiva para evitar que a desancoragem se torne maior. No entanto, sem contar com medidas que tragam de volta alguma credibilidade para a regra fiscal em um cenário externo mais desafiador, esta será uma tarefa inglória.

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