Suzana Herculano-Houzel

Bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA).

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Suzana Herculano-Houzel
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Uma ajudinha esperta para dormir bem

A inteligência artificial chegou aos equipamentos contra apneia do sono

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Olha aí um bom uso de inteligência artificial e que merece seu nome: os aparelhos de pressão de ar positiva agora aprendem a acompanhar a respiração do usuário em vez de simplesmente aplicarem pressão sobre os pulmões.

O resultado é uma noite de sono de qualidade como havia muito já não se tinha, no caso de pessoas com apneia obstrutiva do sono.

(Apneia é um nome quase bonitinho que não dá noção da severidade do problema, então deixa eu usar o português comum: parada respiratória, que é bem mais assustador. Assustei? Ótimo!)

Se você sempre acorda cansado, precisa dormir muito para se sentir descansado ou se quem dorme ao seu lado se queixa do seu ronco constante ao longo da noite a ponto de ameaçar mudar de quarto, você é um forte candidato a um diagnóstico de apneia obstrutiva do sono.

O problema é resultado do colapso da traqueia sob o peso do pescoço quando o adormecido entra em sono REM, cheio de sonhos, e a musculatura do pescoço relaxa completamente. Isso, aliás, é exatamente o que faz cair a cabeça de quem precisa dormir sentado em ônibus ou avião, acordando o adormecido e transformando o sono sentado numa forma de autotortura.

Para quem dorme deitado mas tem problema de sobrepeso, a perda do tônus muscular durante o sono profundo pode acabar causando o próprio despertar, exatamente como se a pessoa estivesse dormindo sentada. A causa é o estrangulamento da traqueia, que é uma mangueirinha da grossura de um dedo indicador feita só de cartilagem.

Um pouquinho só de estrangulamento perturba o fluxo de ar pela traqueia, normalmente laminar, lisinho e silencioso, mas agora turbilhonado de um jeito perfeitamente audível: é o ronco, que acorda quem está por perto. Mais estrangulamento e a obstrução da traqueia se torna grave o suficiente para interromper a troca do ar dos pulmões a ponto de o cérebro ficar afogado em gás carbônico –o que faz o cérebro acordar.

Ilustração de sonho
Martin Kovensky/Folhapress

Talvez o estrangulamento da traqueia cause apenas um despertar imperceptível, tanto do dono quanto do vizinho; ainda assim, qualquer despertar atrapalha o repouso, sobretudo quando é repetido dezenas de vezes ao longo da noite. Quando a apneia é grave, são bem mais de 200 eventos de parada respiratória em uma noite só, porque a pessoa entra em apneia assim que adormece de novo. Não há quem descanse assim.

Há mais de 20 anos que as máquinas ajudam quem sofre do problema, aplicando pressão positiva contínua ao ar que se respira através de uma máscara –como foles, mesmo, empurrando ar para dentro na marra. O resultado era notável para quem precisava, só que, contínua, a pressão também agia... contra a expiração. Funcional, mas um tanto burro, no sentido de inflexível.

Entram em cena, em tempos de inteligência artificial, os circuitos que permitem aprendizado por máquinas, ou "machine learning", e agora os apneicos contam finalmente com ajuda externa flexível e, portanto, de fato inteligente pela minha definição: as máquinas que leem a pressão do ar e aplicam pressão somente quando necessário, ajustando-se automaticamente ao ciclo de sono do usuário.

Agora sim. Dormir atrelado a um tubo não é o sonho de ninguém, mas se é o que permite o sono próprio e o do próximo, que maravilha é possuir a tecnologia!

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