Tabata Amaral

Cientista política, astrofísica e deputada federal por São Paulo. Formada em Harvard, criou o Mapa Educação e é cofundadora do Movimento Acredito.

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Tabata Amaral

Pobreza menstrual: tabu e preconceito

Sem dinheiro para absorvente, milhares de brasileiras faltam a aula e trabalho

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Fome, miséria, desigualdade, mudanças climáticas e corrupção são algumas das muitas batalhas que temos que enfrentar como humanidade. O conhecimento sobre a gravidade e a urgência desses problemas fez com que fossem criados consensos globais em torno deles. 

O que poucas pessoas sabem é que temos uma determinação da ONU sobre uma outra necessidade básica que ainda passa longe do debate público no Brasil: o acesso a absorventes femininos. 

E não é à toa que esse tema tenha passado despercebido até hoje. A política é dominada por homens. A imprensa, as empresas e todos os grandes espaços de poder também.

Países como Canadá, Índia, Austrália e Quênia, e 33 dos 50 estados dos Estados Unidos, já possuem legislação que trata da pobreza menstrual.

Enquanto isso, o sangue corre pelas pernas de meninas e mulheres brasileiras que, todos os meses, faltam à escola e perdem dias de trabalho.

 

A Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, que aprovou um projeto de distribuição de absorventes em escolas, estima que as estudantes perdem até 45 dias de aula durante o ano por não terem acesso a itens de higiene pessoal para lidar com o fluxo menstrual.

A ONU estima que 1 em cada 10 meninas falte à aula durante a menstruação. Além disso, em casas e presídios de todo o Brasil, mulheres usam miolo de pão ou jornal como absorvente, e algumas contraem graves infecções por isso. 

Como esse é um problema que atinge apenas as mulheres mais pobres e a menstruação ainda é um grande tabu na nossa sociedade, muitas pessoas prefeririam que continuássemos sem falar sobre essa verdade inconveniente.

Ao propor a distribuição de absorventes, recebi duras críticas por estar criando mais um custo para o Estado brasileiro. Minha resposta é que a busca pela responsabilidade fiscal não deve se dar a qualquer custo, abandonando quem mais precisa, mas sim com a construção de um Estado que usa seus recursos de forma mais eficiente e entrega serviços melhores.

Além disso, quem se indigna com a proposta demonstra desconhecimento da realidade do nosso país. Cerca de 13,5 milhões de pessoas vivem na extrema pobreza no Brasil, com menos de R$ 7 por dia.

A minha proposta é que absorventes e outras soluções sustentáveis sejam distribuídos em locais públicos, como escolas, postos de saúde e penitenciárias. Se considerarmos mulheres de 10 a 50 anos, com renda per capita domiciliar até um salário mínimo, chegamos em um contingente de 40 milhões, ou seja, 30% das mulheres. 

Parece razoável, se fizermos um paralelo simplista com a distribuição gratuita de camisinhas. Somente 30% dos homens que usam camisinha de fato aderem à opção gratuita.

A reação virulenta e machista contra o projeto de lei que apresentei, em pleno mês das mulheres, só me mostrou a importância de continuar lutando por essa causa. 

Ensinaram-nos que menstruar era sujo. Fizeram-nos sentir vergonha e criaram mitos e mentiras que temos que quebrar dia após dia. Libertar essa verdade desequilibrou muita gente. Mas trouxe muitos apoiadores também —meninas, mulheres, professoras e também pais, filhos e irmãos. 

Muita gente que nunca tinha parado para pensar sobre isso se sensibilizou, e isso, por si, já é uma grande vitória. Seguiremos trabalhando pelo direito de menstruar livremente.

Menstruar não é opção. Escolhi lutar para garantir dignidade a meninas e mulheres que não têm condições de comprar absorventes. Estou disposta a pagar o preço por elas.

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