Tabata Amaral

Cientista política, astrofísica e deputada federal por São Paulo. Formada em Harvard, criou o Mapa Educação e é cofundadora do Movimento Acredito.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Tabata Amaral

Médicos contra a vida

Profissionais da saúde coniventes com negacionismo são corresponsáveis por chegarmos a 600 mil mortes

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

“[Rogério foi] submetido a choques elétricos por todo o corpo, inclusive nos órgãos sexuais, afogamentos, espancamentos, de modo especial na cabeça, tendo tais torturas cessado somente quando o interrogando perdia os sentidos; que, nessas ocasiões, era chamado um médico, o qual era consultado sobre se podiam ou não continuar as torturas.”

ONG Rio de Paz faz um tributo na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, às 600 mil vítimas da Covid-19 - Pilar Olivares/Reuters


Esse é um dos muitos relatos de tortura revelados pelo “Projeto Brasil: Nunca Mais”, que analisou mais de 1 milhão de páginas de processos do Superior Tribunal Militar (STM). Uma das principais contribuições do projeto foi explicitar o papel desempenhado por uma parte da classe médica que deu suporte às torturas e protegeu a ditadura militar, emitindo, inclusive, laudos falsos.

Os depoimentos e documentos que estão sendo analisados pela CPI da Covid nos mostram que, infelizmente, o passado está mais próximo do que imaginávamos. Médicos, empresários do ramo da saúde e dirigentes do Conselho Federal de Medicina (CFM) foram não só coniventes como corresponsáveis por milhares de mortes que poderiam ter sido evitadas.

O Gabinete Paralelo, fiador do negacionismo que nos fez chegar a 600 mil mortos na pandemia, era integrado também por médicos. Profissionais da saúde conduziram experimentos na Prevent Senior em que pacientes recebiam, sem o seu consentimento, medicamentos sem eficácia contra a Covid.
Essa mesma operadora de saúde encaminhou pacientes com chances de sobrevivência ao tratamento paliativo e falsificou atestados de óbito para esconder que o coronavírus era a causa das mortes. Tudo isso enquanto o CFM dava autonomia para que médicos prescrevessem o kit covid, apesar da sua ineficácia e efeitos colaterais graves.

O historiador Richard Wolin cunhou o termo “jurista da coroa” para descrever quem se subordina e serve cegamente ao poder político do momento. O principal exemplo seria Carl Schmitt, jurista que deu sustentação ao nazismo. A pandemia nos mostrou, infelizmente, que temos ainda em nosso país “médicos da coroa”, que foram contra o princípio da vida que deveria guiar todos os profissionais da saúde.

A anistia fez com que não se construísse uma memória coletiva dos crimes da ditadura militar. Ainda assim, Harry Shibata, Isaac Abramovitch, Orlando José Bastos Brandão e todos os outros que foram coniventes ou participaram diretamente de seus horrores terão seus nomes marcados na história para sempre.

No entanto, para que tamanhas atrocidades já não tenham lugar em nosso país, é imperativo que os “médicos da coroa” de hoje paguem, em vida, pelos crimes que cometeram.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.