Tatiana Prazeres

Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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Descrição de chapéu China Ásia

Por que a agenda do clima interessa à China?

Pequim enxerga a oportunidade de se posicionar como peça-chave na nova economia que se conforma a partir dessa transição global

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Quando a China anunciou o objetivo de atingir neutralidade de carbono até 2060, houve críticas. Muitos queriam mais detalhes ou mais ambição —mas ninguém achou que se tratava de uma meta fácil de se cumprir.

Como o maior emissor global de CO2, a China tem uma montanha muito alta de carbono para descer. E as emissões chinesas ainda continuam crescendo. Com isso, o país terá que “descarbonizar” sua economia numa velocidade nunca antes vista, se quiser atingir o objetivo.

Carros circulam pelo centro de Pequim
Carros circulam pelo centro de Pequim - Thomas Peter - 5.mar.21/Reuters

Para ser bem-sucedida, a China precisará passar por uma transformação econômica brutal e contar com tecnologias que ainda não existem. A economia chinesa consome muita energia —especialmente porque a indústria, em particular a indústria pesada, ainda é importante. E a energia consumida no país continua muito dependente de carvão, de que a China dispõe fartamente.

Apesar disso, Pequim terá que acelerar a aposentadoria de minas e usinas, verá gente desempregada e cidades esvaziadas para atingir os novos objetivos. Sem impor custo às suas empresas, não viabilizará a transição climática. Governadores e prefeitos terão que sacrificar outros objetivos para viabilizar esse.

O caminho não é uma linha reta —como mostra a construção de novas termoelétricas na China hoje—, mas a orientação pró-baixo carbono está dada. E por que mesmo? O que leva a China a abraçar a agenda climática, apesar do ônus elevado, especialmente quando já não cresce com a exuberância do passado? O que Pequim ganha com isso?

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Em primeiro lugar, o governo está convencido de que a China está muito exposta aos impactos de mudanças climáticas. Não acham que o assunto é invencionice de país rico para promover suas agendas. O aumento do nível dos mares, por exemplo, pode deixar partes de Xangai e Guangzhou debaixo d’água —e não há negacionistas no comando.

Há, em segundo lugar, a dimensão econômica, financeira e tecnológica. A China enxerga a oportunidade de se posicionar como peça-chave na nova economia que se conforma a partir dessa transição global.

Neste momento, o país coloca em operação um mercado de crédito de carbono no nível nacional, depois de anos de testes em sete cidades. Será o maior do mundo.

Pequim ademais busca a liderança das tecnologias que viabilizarão a transformação climática. “Green tech” permite combinar objetivos econômicos e ambientais, vistos frequentemente em oposição.

Além disso, se não agir, a China, que é o maior exportador mundial, encontrará barreiras ambientais cada vez maiores em outros mercados.

Em terceiro lugar, política externa, reputação e "soft power" importam. Para a campeã mundial de emissão de dióxido de carbono, a inação teria um custo de imagem alto.

Ainda, segurança energética e considerações geopolíticas têm seu peso. A China importa 75% do petróleo que consome. Desmamar do carvão é complicado, mas desenvolver energias renováveis não é mau negócio.

Por fim, política interna também entra na equação. A via é indireta, mas o peso é grande. Aqui, a preocupação com outro problema —poluição atmosférica— serve de forte incentivo para que o país aposte na redução de emissões de carbono. Mesmo que essas agendas não sejam necessariamente vinculadas, aqui elas o são. Tudo faz parte da ideia de civilização ecológica, conceito incluído na Constituição em 2018.

Para os cidadãos chineses, mudanças climáticas podem representar um conceito muito abstrato. Mas poluição do ar, não. À medida que a população tem necessidades básicas atendidas, suas demandas passam a ser outras. As expectativas aumentam.

Se mudança climática não é visível para o cidadão, a poluição atmosférica é —e muito. O problema não pode ser escondido mesmo que se quisesse. E público insatisfeito não é um bom negócio nem na China.​

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