Tatiana Prazeres

Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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Descrição de chapéu Ásia Rússia

A falta que faz aos EUA uma estratégia comercial para a Ásia

China se move no tabuleiro, e submarinos nucleares não substituem engajamento econômico

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Enquanto os olhares estavam voltados para alianças militares, houve movimentos importantes no tabuleiro comercial da Ásia nas últimas semanas.

O mais interessante deles: a China quer fazer parte do que era para ser um acordo anti-China. Sob Barack Obama, os EUA lideraram a criação da chamada Parceria Transpacífico, que buscava lhes assegurar influência econômico-comercial na região, em detrimento da China.

No seu primeiro dia como presidente, Donald Trump anunciou que os EUA não estavam mais interessados no acordo. Num movimento surpreendente, o pacto acabou sendo concretizado mesmo sem os EUA e foi rebatizado pelos demais 11 participantes de CPTPP, na sigla em inglês.

Monitor exibe a reunião virtual do presidente dos EUA, Joe Biden, com o primeiro-ministro da Austrália, Scott Morrison, o então primeiro-ministro do Japão, Yoshihide Suga, e o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi
Monitor exibe a reunião virtual do presidente dos EUA, Joe Biden, com o primeiro-ministro da Austrália, Scott Morrison, o então primeiro-ministro do Japão, Yoshihide Suga, e o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi - Kiyoshi Ota - 12.mar.21 / AFP

Pois é a esse clube que a China agora quer se juntar. Os EUA não gostam da ideia, mas Joe Biden tampouco quer reconduzir o país aos termos do que foi negociado quando era vice-presidente.

Curiosamente, para a China entrar no CPTPP, teria que realizar reformas econômicas há anos desejadas por Washington. As regras da Parceria Transpacífico foram desenhadas ao gosto dos americanos, cobrindo, à sua maneira, temas que lhe são caros, como propriedade intelectual, direitos trabalhistas, comércio digital e atuação de empresas estatais.

Entrando no CPTPP, a China em princípio teria que aderir a esses padrões. Mas não é a economia ou o comércio que comandam a agenda dos EUA a respeito da China. Se o foco é a rivalidade geopolítica, então Washington prefere ver Pequim fora do clube.

Além disso, a China, atenta ao interesse de Taiwan em juntar-se ao bloco, moveu-se primeiro ao protocolar seu pedido. O pleito de Taiwan foi feito poucos dias depois. Pequim embolou o meio de campo. Fica politicamente difícil para os membros do CPTPP considerarem o pedido de Taipé sem analisar o de Pequim. Com isso, a dita província rebelde da China corre o risco de nunca entrar no clube, para a satisfação de Pequim.

Aliás, além de China e Taiwan, o ingresso no CPTPP também havia sido solicitado pelo Reino Unido. O país não poderia estar mais distante do Pacífico, mas isso é apenas um detalhe diante de todo o resto.

O ingresso da China no CPTPP dificilmente acontecerá no futuro próximo, a começar porque isso exigiria a aquiescência dos atuais parceiros, entre os quais a Austrália e o Japão, politicamente cada vez mais próximos dos americanos, via Aukus e Quad.

Ironicamente, no cenário hipotético em que a China seja aceita no grupo, Pequim em tese passaria a ter o poder de vetar uma entrada futura dos americanos no bloco, o que seria o cúmulo da reviravolta.

A lição dessas movimentações recentes: para os EUA, uma estratégia comercial para a Ásia tem feito enorme falta. Desde a saída da Parceria Transpacífico em 2017, o vácuo gerado pelos EUA embaralha as negociações comerciais da região e, sobretudo, abre espaço para Pequim.

Além de complicar a vida de Taiwan, a China quer contrastar sua postura com a dos EUA ao pleitear ingresso no CPTPP. Quer firmar presença econômica e sinalizar interesses geopolíticos na região. Busca transmitir a mensagem de que o país não está se fechando.

Diferentemente do clima em Pequim, não há apetite em Washington para que o país faça parte do CPTPP. No entanto, submarinos nucleares não compensam a falta de uma estratégia comercial se os EUA desejam ampliar sua influência na Ásia.

Por mais que acordos comerciais pareçam politicamente tóxicos nos EUA de hoje, em algum momento os americanos terão que voltar a pensar no engajamento econômico-comercial com a região. Enquanto isso, a China se movimenta.

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