Tati Bernardi

Escritora e roteirista de cinema e televisão, autora de “Depois a Louca Sou Eu”.

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Tati Bernardi

Vera Iaconelli: uma esperança

Talvez seja a minha bolha, mas quem sabe seja um movimento muito maior

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Meses atrás, buscando inspiração para um seriado de TV, eu e alguns colegas do sexo masculino fizemos uma reunião com a Vera Iaconelli, psicanalista e colunista da Folha.

Vera, 52, é uma mulher linda e interessante, mas eu passei a vida inteira achando que o seu tipo de beleza (refinado, desafiador, intelectualizado, sem ostentar as vaidades sedutoras clichês na roupa, no cabelo, nos penduricalhos ou no modo de falar) instigava menos do que uma jovem brejeira pronta para rir das piadas ruins que os homens contam quando estão inseguros (e quase sempre eles estão).

Feministas, peço licença aqui. Me deixem criar e estereotipar a personagem sonsa e a personagem mulherão porque sou escritora, e literatura com superego militante e “cancelador” quase nunca rende bons livros. A própria Vera disse algo parecido com isso em sua participação no podcast Café da Manhã. 

Lançamento do livro "Como criar os filhos no Século XXI", da escritora, psicanalista e colunista da Folha, Vera Iaconelli
Lançamento do livro "Como criar os filhos no Século XXI", da escritora, psicanalista e colunista da Folha, Vera Iaconelli - Marlene Bergamo - 21.set.2019/Folhapress

Mas voltando à reunião. A frase “que mulher!” foi repetida ininterruptamente da hora que a psicanalista partiu até uns 20 dias depois. E passados três meses eles ainda falavam dela. Quase fizeram um grupo de Whats com sua foto e o nome MUSA. 

Observei encantada todo esse frenesi. Desde muito nova, e ainda sem conhecer a Vera, eu já a tinha como um modelo.

Eu ainda preciso de muitos mestrados e talvez nascer de novo, mas, se existe uma missão para mim nesta vida, é me tornar uma pessoa a cada dia mais intelectualmente relevante, culta, disposta a debater com segurança sobre qualquer assunto e ser autônoma em minhas escolhas profissionais e em meus desejos sem perder o humor e a generosidade.

Porém, que me desculpem as feministas, tudo o que eu mais queria com a minha liberdade sexual era ter um homem... que não saísse correndo apenas porque eu podia falar e escrever e observar e fazer graça e ganhar dinheiro e ser lida e, por fim, não ser uma moça inexpressiva, tola e leve.

O que eu mais queria era ter um desgraçado roncando na minha orelha, um filho me sujando de ranho, um cachorro lambendo todo o meu creme da perna e um domingo tedioso arrumando cacarecos pelo chão.

Hoje, que tenho tudo isso, sinto vontade de fugir para alguma praia de nudismo bem distante e então correr com as tetas balançando e gritar CHEGAAAAAA até o eco dar cinco voltas na Terra. Mas tudo bem. Respira. Passou. Freud já disse que não existe felicidade. 

Meu marido, quando viu a Vera pela primeira vez, falou “nossa, que mulher, hein?!”, e eu tive a certeza, novamente, que nem tudo estava perdido.

Depois, o Bruno (nome fictício porque na verdade ele se chama Beto) passou semanas me mandando áudios narrando seu amor avassalador pela minha colega colunista. Eu disse “colunista”. Se você leu “comunista” é problema seu.

E assim aconteceu sucessivamente com amigos que a conheceram no lançamento do meu livro, na Flip, escrevendo neste jornal, falando em algum podcast ou na televisão. E isso, caros leitores, se chama esperança.

Talvez seja a minha bolha, mas quem sabe seja um movimento muito maior que, apesar de tanto retrocesso na política, mobilizou as pessoas a entenderem que uma mulher poderosa não é menos feminina, menos fêmea, menos mãe.

Não precisa ser chamada de fálica, não precisa aparecer em pesadelos com uma faquinha de pão para decepar um pênis. Uma mulher fodona é apenas tão atraente, mas tão fascinante, que é preciso crescer pra dar conta disso.

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