É regra de ouro no direito internacional o princípio da distinção: no conflito, as partes beligerantes devem saber diferenciar entre combatentes e civis. Não o fazer pode constituir crimes de guerra. Ao menos 516 civis morreram na guerra da Ucrânia. Há relatos de diversos possíveis crimes de guerra pelas forças russas: ataque a um hospital infantil em Mariupol durante cessar-fogo, uso de bombas "burras" –sem guiagem e mais letais– em Chernihiv, e de bombas cluster matando civis numa pré-escola em Okhtyrka.
Há, ainda, relatos de exposição de prisioneiros de guerra por forças ucranianas e desrespeito dos corredores humanitários por ambas as forças.
Os dois tribunais de Haia —a Corte Internacional de Justiça (ICJ) e o Tribunal Penal Internacional (TPI)— estão atentos. A diferença entre eles é que a ICJ julga Estados, enquanto o TPI julga indivíduos. Na ICJ, Ucrânia processa a Rússia contra alegações russas de genocídio. TPI investiga crimes internacionais. O resultado esperado é pouco. ICJ é refratária a julgar fatos no calor do momento. TPI tem como dificuldade processar Putin; mesmo que os Estados tenham a obrigação de cooperar com a corte.
Se é verdade que a lei está suja até o pescoço do lamaçal de embates geopolíticos, também é verdade que a própria existência do direito internacional permite que o tencionemos. Por seu caráter universal, podemos legitimamente criticar tanto os crimes de guerra cometidos por Putin quanto apontar o quão hipócrita é o fato de serem os EUA os primeiros a nomear tais crimes ao mesmo tempo em que cometeram sua boa dose de crimes (de Guantánamo a Abu Ghraib, passando pela chuva de drones no Iêmen e Paquistão).
A força da lei internacional reside em tencionar a hipocrisia de seu caráter universal de aplicabilidade seletiva. Putin provavelmente nunca sentará no banco dos réus; mesmo frustrados com a incapacidade da lei internacional em puni-lo, é a mesma lei que nos permite chamá-lo de criminoso de guerra.
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