Thiago Amparo

Advogado, é professor de direito internacional e direitos humanos na FGV Direito SP. Doutor pela Central European University (Budapeste), escreve sobre direitos e discriminação.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Thiago Amparo
Descrição de chapéu Folhajus

STF vai decidir se lei protege negros contra abusos policiais

Corte poderá dizer se há dois códigos penais no país a depender de sua cor

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

No Supremo Tribunal Federal, há casos difíceis e há casos fáceis que tornamos difíceis. O habeas corpus em que se discute abordagens policiais e racismo, ora em julgamento na corte, cai na segunda categoria.

Se o STF limpar o que turva seu olhar no caso (a saber, interpretações equivocadas sobre questões raciais no país), verá que a questão jurídica é, ao menos legalmente, simplória e quiçá até entediante: a lei que impõe o critério de "fundada suspeita" para abordagem policial vale em abordagens para pessoas negras ou não? Eis a questão.

Jovem negro é abordado por policiais militares na Cidade Ocidental, em Goiás; ele gravava um vídeo para seu canal no YouTube quando foi parado - Reprodução/YouTube

Nem o placar (3 a 1, a favor da subjetividade nas abordagens) nem a argumentação dos ministros animam a quem se aventura a assistir ao julgamento. Equívocos precisam ser endereçados a tempo.

Erro 1: se o Supremo reconhecer a existência de perfilamento racial, estaria dizendo que policiais cometem crime de racismo. Errado: o argumento confunde racismo institucional (como a polícia opera) com eventual tipificação penal (se houve ou não crime de racismo); as duas coisas são separadas e não se anulam. Confundi-las turva o debate.

Erro 2: reconhecer ilegalidade do perfilamento racial implicaria um salvo-conduto para cometer crimes de drogas. Errado. Primeiro, o argumento ignora a relação entre abuso policial e guerra às drogas, vasta na literatura. Segundo, o argumento pressupõe que um Estado de Direito apenas consegue combater drogas com abuso policial —é o argumento consequencialista que, no limite, justificaria a tortura. Terceiro, a cor nunca foi um salvo-conduto, basta ver a cor de quem é morto pela polícia e quem lota prisões por um grama de droga.

Erro 3: o caso é sobre polícia. Errado. O caso é sobre o Judiciário, ou melhor: sobre a omissão judicial de fiscalizar se o requisito legal de fundada suspeita é respeitado pela polícia.

O Supremo tem a chance de dizer se há dois códigos penais no país a depender de sua cor: até agora está dizendo que há.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.