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Cronista esportivo, participou como jogador das Copas de 1966 e 1970. É formado em medicina.

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Os grandes talentos são especiais pelas suas obras

Não só no futebol, a fama costuma empobrecer, iludir e fragilizar o ser humano

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Escrevi esta coluna antes da partida entre Brasil e Argentina. Independentemente do resultado, se o garoto Endrick entrou em campo e brilhou ou jogou mal, ele continuará sendo uma grande promessa de craque. Ainda não é. Já é um ótimo jogador, com seus dribles em velocidade e finalizações precisas.

Para Endrick se tornar um fenômeno, como se espera, necessitará, além de sua excelente técnica, ter capacidade de antever os lances, de tomar decisões lucidas e, em uma fração de segundos, perceber os movimentos dos companheiros e adversários. Terá de pensar o pensamento do outro. É a inteligência cenestésica, espacial.

Endrick na partida Flamengo 3 x 0 Palmeiras, no Maracanã - Ricardo Moraes - 8.nov.23/Reuters

Endrick tem sido exageradamente exaltado como se já fosse um craque com dez anos de sucesso. Brevemente farão um documentário sobre sua vida, antes de ser vivida. É a pressa do mundo do espetáculo, à procura de heróis e vilões. Parece até que Endrick é o único jovem do mundo com 17 anos que faz parte da seleção de seu país.

Lamine Yamal, com 16 anos, já está no time principal do Barcelona e da seleção da Espanha.

O meio-campista francês Emery, com 17 anos, é titular do PSG e fez um gol na goleada da França contra Gibraltar por 14 x 0.

Warren Zaire-Emery na partida França 14 x 0 Gibraltar, em Nice - Claudia Greco/Reuters

Pedri, com 21 anos, e Gavi, com 19, são destaques do Barcelona e da seleção espanhola. Os dois já ganharam o titulo da Fifa de melhor jovem do mundo com menos de 21 anos. Nesta temporada, quem conquistou o premio foi Bellingham, destaque da seleção inglesa e do Real Madrid. Com 19 anos, Bellingham brilhou na Copa de 2022.

No passado, Pelé, Coutinho e Edu, os três do Santos, participaram da seleção brasileira com menos idade do que Endrick. Um grande numero de jogadores brasileiros com idades próximas à do garoto do Palmeiras jogaram também pela seleção. Eu fui titular da equipe principal do Cruzeiro com 16 anos e com 19 atuei na Copa do Mundo de 1966.

Tostão, marcado por Rivellino, atrás, em partida Corinthians x Cruzeiro no fim da década de 60 - Acervo Folhapress

Tempos atrás, os europeus raramente escalavam jovens com menos de 20 anos no time principal, pois preferiam contratar estrangeiros já prontos. Essa conduta prejudicava as seleções pela pouca formação de grandes jogadores. Isso tem mudado progressivamente e cada vez mais surgem jovens talentos.

Atualmente, os jovens são muito mais bem preparados por causa da tecnologia, do desenvolvimento científico dos clubes e da orientação de inúmeros especialistas. No passado não havia academia, estatísticas nem exames especializados. Continua faltando uma melhor ajuda psicológica aos atuais jogadores.

Pelé não foi apenas um fenomenal talento. Ele executava no mais alto nível possível todos os fundamentos técnicos. Pelé sem ter as vantagens modernas era também um fenômeno físico. Jogava muito e treinava pouco, pois o Santos, uma atração mundial, viajava pelo mundo, atuando três vezes por semana. As suas pernas fortes pareciam com as de Endrick.

Pelé em lance contra o Bahia em que faria o milésimo gol, evitado em cima da linha pelo zagueiro Nildon - Antônio Pirozzelli - 17.nov.69/Folhapress

Por outro lado, os atuais jovens atletas, por causa do endeusamento precoce, pelo numero absurdo de notícias sobre suas carreiras e vidas pessoais, sofrem uma pressão muito maior, o que leva a mais problemas emocionais. O mundo do espetáculo cria uma expectativa muito acima da realidade, como se tivessem de jogar sempre como um grande craque e se comportar de uma maneira exemplar.

Os grandes talentos, em todas as profissões, com raras exceções, são especiais pelo que fazem, pelas suas obras. São pessoas comuns, com virtudes e defeitos. A fama costuma empobrecer, iludir e fragilizar o ser humano.

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