Vaivém das Commodities

A coluna é assinada pelo jornalista Mauro Zafalon, formado em jornalismo e ciências sociais, com MBA em derivativos na USP.

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Vaivém das Commodities

Liberação de importação de grãos não segura inflação dos alimentos

Patamar recorde dos preços internos não é definido pela quantidade de grãos à disposição, mas pela taxa de câmbio

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O esforço do governo para elevar as compras externas de grãos, a fim de reduzir a inflação dos alimentos, não deve surtir efeito. O patamar recorde dos preços internos não é definido pela quantidade de grãos à disposição, mas pela taxa de câmbio.

As importações podem, porém, colocar um teto nos preços internos. A paridade entre os valores externos e a taxa de câmbio vai impedir novos aumentos no mercado doméstico. O dólar em patamar
elevado torna o produto brasileiro mais competitivo no mercado externo, mas desestimula as importações.

Foi o que se deu com o arroz, que teve a alíquota de importação zerada na primeira quinzena de setembro, sem que os preços cedessem. Negociada a R$ 104 naquele período, a saca estava a R$ 105 no Sul na sexta (16), conforme o Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada).

O milho, comercializado hoje nos valores recordes de R$ 70 a saca em Campinas, tem estoque, e os produtores do Paraná e de Mato Grosso do Sul dispõem do cereal para vender. A Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) estima estoques de 10 milhões de toneladas no final desta safra, um volume para quase dois meses.

Lavoura de milho no norte do Paraná - Mauro Zafalon - 7.nov.2019/Folhapress

No caso da soja, o cenário é mais complicado. Não há estoques, e as empresas que precisam da oleaginosa vão importar, mesmo que a alíquota não tivesse sido reduzida, de acordo com Daniele Siqueira, analista da AgRural.

Nos nove primeiros meses deste ano, o país já importou 528 mil toneladas de soja. Apenas nos 11 primeiros dias úteis deste mês, as compras externas somam 38 mil toneladas.

É a segunda vez nos últimos quatro anos que as empresas encontram dificuldades na compra de grãos no mercado interno. Diante das incertezas do dólar, elas vão ter de fazer um planejamento melhor de aquisição de produtos.

Não dá para ficar em posição confortável à espera das supersafras que o país vem conseguindo, afirma Vlamir Brandalizze, analista do setor.

Empresas e associações de produtores se reuniram, há três anos, para definir parâmetros de um acordo entre elas. As negociações não avançaram e poucas empresas fizeram esse planejamento.

Ricardo Santin, presidente da ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal), diz que falta transparência ao mercado. O Brasil não deve fazer nenhuma interferência no setor, como faz muitas vezes a Argentina, mas tem de seguir o padrão americano.

Nos EUA, toda venda externa acima de 100 mil toneladas de grãos deve ser comunicada ao Usda (Departamento de Agricultura do país). Com isso, as empresas vão se programando conforme as exportações, afirma ele.

Para Santin, ainda não se sabe o teto dos preços das commodities para a indústria. Uma coisa, no entanto, é certa: o custo vai ser repassado.

Brandalizze diz que a única posição confortável no setor, por ora, é a do produtor. Pelo menos enquanto o dólar estiver favorável às exportações.

A analista da AgRural ainda vê dificuldades para os próximos meses. O plantio de soja, que estava em 8% na semana passada, é o menor em dez anos para esse período. No ano passado, estava em 21%.

Esse atraso deve retardar ainda mais a colheita de soja, reduzindo a oferta no mercado no início de 2021.

No caso do milho, há uma preocupação com o clima muito quente em algumas regiões, o que poderia reduzir a produtividade. A reação do produtor poderá ser a de retardar ainda mais as vendas.

Santin diz, porém, que já há negociações avançadas para a compra de três carregamentos de milho nos EUA, produto que seria destinado ao Nordeste e ao Espírito Santo.

A safra brasileira de grãos, a exemplo deste ano, deverá ser recorde também em 2021, conforme previsão da Conab.

O dólar no patamar atual, contudo, vai novamente impulsionar as exportações e onerar as importações. Sendo que não há uma previsão do mercado para um patamar da moeda americana inferior a R$ 5 no próximo ano, o consumidor continuará pagando caro pelos alimentos.

Nesta segunda (19), a Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) divulgou que o óleo de soja teve evolução de 24% nos últimos 30 dias na cidade de São Paulo. O arroz subiu 11%, e os preços médios dos alimentos tiveram aumento de 2,10%. Essa taxa é o dobro da inflação média do período.

A oferta de arroz pode melhorar nas próximas semanas. Segundo informou a Secex nesta segunda-feira (19), as importações diárias do cereal beneficiado somam 5.465 toneladas nos 11 primeiros dias úteis deste mês, 72% mais do que em setembro de 2019.

*

Mais um recorde Dados ainda preliminares do Cepea indicam que os preços do leite captado em setembro, e com pagamento neste mês, poderão vir com mais um recorde. Há estabilidade em algumas regiões, mas evolução em outras.

Concorrência O recorde anterior, ocorrido no mês passado, era de R$ 2,1319 por litro, na média Brasil. Em termos reais, o leite já teve alta de 55,4% no campo neste ano. A alta se deve a uma concorrência das indústrias pelo produto.

Balanço ajustado Clima seco em algumas regiões produtoras e alta de consumo dará um balanço mais apertado para o açúcar no mercado internacional. O real desvalorizado favorece as exportações brasileiras.

Etanol Um mix de 45% para açúcar, atrelado a uma alta de 8% no consumo de etanol, provocaria a necessidade de importação superior à 1 bilhão de litros, segundo o Itaú BBA.

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