Vaivém das Commodities

A coluna é assinada pelo jornalista Mauro Zafalon, formado em jornalismo e ciências sociais, com MBA em derivativos na USP.

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Vaivém das Commodities

Temporais e enchentes levam caos à agropecuária gaúcha

Excesso de chuva e rodovias interrompidas freiam movimentação no setor

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A agricultura do Rio Grande do Sul parecia passar ilesa neste ano da crise climática, mas os temporais e enchentes destes últimos dias colocam em risco boa parte do que ainda não foi colhido.

"O quadro é de dor e vamos ficar na angústia para dimensionar essa situação. É um cenário nunca visto antes no estado."

Assim Rogério Kerber, presidente do Fundesa (Fundo de Desenvolvimento e Defesa Sanitária Animal) e diretor-executivo do Sips (Sindicato das Indústrias de Produtos Suínos), ambos do Rio Grande do Sul, descreve os efeitos dessa catástrofe que ocorre no estado.

Campos alagados em Santa Maria (RS) - Maurício Tonetto/Secom

A agropecuária está totalmente comprometida em várias regiões. As áreas de grãos ainda não colhidas vão apresentar perdas, os animais não saem das propriedades para o abate, a coleta de leite fica comprometida e a ração não chega para alimentá-los.

"Nunca se viveu ou se tem notícia de uma situação tão dramática na falta de mobilidade", diz Kerber.

Os vídeos que circulam pela internet apontam a extensão do problema. Lavouras afetadas, gado boiando rio abaixo, sistema de tráfego interrompido e locais sem comunicação.

Para Ricardo Santin, presidente da ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal), entidade ligada aos setores de suinocultura e de avicultura, ainda não há levantamentos, mas as perdas podem se agravar ainda mais, uma vez que as chuvas continuam.

Segundo ele, algumas situações são irreversíveis, como as de granjas especializadas na produção de ovos. As galinhas continuam botando, mas não há como escoar o produto. Se a situação persistir, a ração não vai chegar às granjas.

Granjas e frigoríficos fizeram obras de contenção nas últimas ocorrências de chuva e enchentes —já são três desde 2023—, mas o volume de água desta vez é bem maior, segundo ele.

Vlamir Brandalizze, analista do setor de grãos, diz que o Rio Grande do Sul ainda tem 1,5 milhão de toneladas de arroz no campo. O quadro atual de excesso de chuva vai dificultar a colheita, reduzir a produtividade e diminuir a qualidade do cereal.

Brandalizze acredita que a safra de arroz no Rio Grande do Sul, antes estimada entre 7,5 milhões e 7,8 milhões de toneladas, deverá ficar um pouco abaixo de 7 milhões.

Com isso, a safra nacional, prevista inicialmente em 10,5 milhões de toneladas, recua para um volume entre 9,5 milhões a 9,8 milhões, uma vez que Tocantins também teve quebra.

Essa redução de produção nacional ocorre em um momento de menor oferta também no Paraguai, no Uruguai e na Argentina, tradicionais fornecedores do cereal ao Brasil. A Ásia, principal produtora mundial, também tem menor oferta.

A soja será afetada. Quanto mais as máquinas demorarem para ir ao campo, maior a perda. Restam ainda próximo de 5 milhões de toneladas para serem colhidos. Estimada entre 22 milhões e 23 milhões, a safra deverá ficar entre 20 e 21 milhões, diz o analista.

Lavouras de milho semeadas após a colheita do fumo também devem ter quebra, o mesmo ocorrendo com o feijão.

A falta de mobilidade é um dos principais problemas, segundo Kerber. As propriedades agrícolas não escoam o produto, e as indústrias, sem a matéria-prima e os trabalhadores —estes em geral localizados em cidades vizinhas—, têm dificuldades para operar.

O diretor-executivo do sindicato das indústrias diz que o Rio Grande do Sul abate 40 mil suínos por dia, mas a movimentação diária desses animais chega a 120 mil, contando com as matrizes repostas, leitões na maternidade, movimentação na creche e animais encaminhados para o término da cria e para os frigoríficos.

As aves abatidas chegam a 3,3 milhões por dia, e o trânsito pelas rodovias 386, 390, 122 e pelas estradas vicinais, comprometem essa movimentação, acrescenta Kerber. Além da dificuldade de saídas das propriedades, muitos animais estão presos em estradas com barreiras caídas, sem opção de alimentação e de movimentação, diz ele.

Não só o vaivém de animais e de ração está comprometido entre campo e indústria, mas há, ainda, a possibilidade de extensão da crise, devido às dificuldades na chegada dos alimentos aos centros urbanos. Mais de cem pontes estão interrompidas.

As chuvas e enchentes varreram boa parte da produção de horfifrutis, e o leite não está sendo coletado nas regiões afetadas.

Diretor do sindicato das indústrias, Kerber diz que não dá, ainda, como calcular a dimensão dos estragos, uma vez que muitas empresas estão sem energia, sem internet, sem celular e sem qualquer possibilidade de comunicação.

Vale do Rio Pardo e do Taquari são as regiões mais afetados, mas os rios dos Sinos e Gravataí também estão sobrecarregados.

O Rio Grande do Sul é o terceiro maior produtor e exportador de carne de frango do Brasil. Ele participa com 11,4% da produção nacional e 14,8% das exportações, segundo a ABPA.

No setor de suinocultura, o estado ocupa o terceiro lugar na produção, representando 19,8% do volume do país, e o segundo lugar nas exportações, com participação de 23,1%.

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