Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire
Descrição de chapéu Eleições 2018

A Argentina e a eleição no Brasil

Candidatos viajam com planos ruins e ameaçam levar país com eles

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Antes de o Brasil descer no ponto final dos infernos, na estação Venezuela, ainda vai uma distância incalculável. Mas a gente pode pegar um trem para a Argentina. Na retórica eleitoral, muita gente compra passagem para uma viagem ruim.

A economia argentina já entrou em estado avançado de degradação, decerto. Os problemas deles são de espécie diferente, uma crise de financiamento externo. Diferentes até certo ponto.

No fundo, o governo argentino tem um problema urgente de arrumar dinheiro emprestado a fim de fechar as contas, pagando um custo cada vez mais suicida. Podemos chegar lá.

Ruas vazias em Buenos Aires em dia de greve geral, nesta terça-feira (25) - AFP

Sim, nosso trem tem mais freios. Em termos institucionais, a economia brasileira é mais arrumada do que a argentina, que mal tem moeda.

O peso é meio uma farsa. Os argentinos, quando podem, poupam em dólar e fazem contas também em dólar, ao menos para despesas grandes.

Cerca de dois terços ou mais da dívida pública é em dólar. Trocando em miúdos, o governo não toma dinheiro emprestado no mercado doméstico, como no Brasil. Ninguém confia no peso ou na dívida do governo em pesos, depois de tantos calotes e confiscos. Não confia nem na dívida em dólar --neste século, o país ficou década e meia fora do mercado mundial.

Quando começa a faltar dólar, o governo argentino quebra de maneira operística, wagneriana. O risco de tal desgraça voltou a crescer muito, desde o início do ano, em parte porque a biruta do dinheiro grosso mundial virou --a fonte para os "emergentes" começou a secar.

O peso se desvalorizou um monte em relação ao dólar, o que eleva ainda mais o tamanho e o custo da dívida. A fim de evitar a espiral da morte, a bola de neve, o governo de Mauricio Macri pediu um cheque especial de US$ 50 bilhões (R$ 206,4 bilhões) ao FMI.

O país tem déficit primário (gasta mais do que arrecada, mesmo sem contar a despesa com juros, como o Brasil).

O liberal Macri prometeu antecipar a zeragem dessa conta para 2019. Pretende cortar gastos em obras, reduzir ainda mais subsídios para energia, aumentar imposto sobre exportações, cancelar a isenção fiscal sobre folha de salários etc.

Mas a promessa de arrocho pode não passar no Parlamento. Nesta terça-feira (25), houve greve geral. As receitas podem cair mais, pois a economia entrou em parafuso.

O PIB crescia 3,6% ao ano até o primeiro trimestre. Baixou a 1,6% ao ano no segundo trimestre. Deve fechar o ano em recessão de mais de 2%.

E daí?

O governo do Brasil pode tomar empréstimos no mercado doméstico por um bom tempo ainda, mas dinheiro cada vez mais caro, o que sufocará a economia.

Caso o governo não apresente plano crível de acerto de contas, com medidas de curto e longo prazos, o custo dos empréstimos subirá. O governo e, por tabela, todo mundo pagaremos juros mais altos. Caso a dívida continue a crescer sem limite, as taxas de juros irão a reboque.

A certa altura da dívida, não fará mais sentido pegar dinheiro emprestado (se alguém emprestar, além do prazo de um dia). É quando começa a inflação desembestada. Isto é, se não ocorrer coisa mais grave antes, na política ou na sociedade revoltada com uma estagnação econômica sem fim.

Caso candidatos continuem viajando na maionese com propostas cheias de salmonela, tais como baixar a receita de impostos ou gastar mais, sem plano de reforma, vão nos embarcar nesses trens dos infernos. Próxima estação, Argentina.

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