Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire
Descrição de chapéu Rússia

Guerra pode melhorar economia do Brasil no curto prazo?

Para alguns economistas, Brasil pode faturar uns trocados com alta de commodities

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A guerra na Ucrânia tende a beneficiar o crescimento da economia brasileira no curtíssimo prazo —​digamos, até o final do ano. O argumento zanza faz uns dez dias por relatórios de conjuntura escritos por economistas de bancos.

Nem é argumento novo: preços de commodities em alta costumam estar associados a um crescimento maior no Brasil. O país exporta petróleo, grãos, minério e carnes.

Qual o tamanho da melhoria? Alguns décimos de porcentagem. O bastante para o país não fechar o ano no vermelho, com encolhimento do PIB.

Plantação de trigo em campo da região de Stavropol, na Rússia - Eduard Korniyenko - 7.jul.2016/Reuters

A inflação será maior, afora milagres. O povo continuará esfolado e dificilmente haverá aumento do salário médio real (uma abstração, está certo, mas uma medida sintética da dureza geral). A conta da crise vai pesar no ano que vem, com taxas de juros mais altas (por causa da inflação mais alta). Enfim, o efeito político para quem está no poder tende a ser de nenhum a negativo (por um tempo, o PIB pode crescer e o povo continuar esfolado).

As projeções de crescimento da economia em 2022 têm sido revistas —costumam estar muito erradas a esta altura do ano, mas é o que temos. Outros fatores também provocaram revisões.

O PIB do final do ano passado foi melhor do que o previsto. Os governos estão gastando. O governo federal diminui impostos e vai liberar um bom dinheiro do FGTS, por exemplo. Há aumentos de salários de servidores nos estados e municípios, que de resto também devem aumentar a despesa de investimento, pois é ano de eleição e os caixas estão cheios.

Para ajudar, o preço do dólar vem caindo desde janeiro, por motivos variados (preço de commodities, juros altos, ativos financeiros com valor de xepa, não teremos recessão no sentido estrito etc.).

O conflito não afeta o Brasil diretamente, se diz, pois as relações econômicas diretas com os países afundados na lama da guerra são pequenas (a não ser que o fornecimento de fertilizantes vá à breca). A guerra tem seu peso negativo também porque o crescimento econômico mundial será menor, em particular na Europa.

Ainda assim, o argumento do "benefício" da guerra tem alguns problemas. De que efeitos da guerra estamos tratando? Estão todos mapeados? Sabe-se o tamanho da desaceleração europeia?

Ainda não há perspectiva de fim do conflito. Ainda que venha um cessar-fogo ou armistício, as mudanças econômicas causadas pela crise geopolítica vão continuar fervendo baixo (regionalização de comércio, protecionismos, problemas em cadeia de abastecimento internacional, insegurança, incerteza).

A guerra ainda pode ter efeitos daninhos explosivos no comércio mundial de energia, comida e metais. A partir de qual tamanho de choque inflacionário o aumento de preços de commodities não nos quebra as pernas?

Difícil saber, até porque ninguém são irá chutar o destino da guerra e de possíveis sanções e interrupções de comércio por vir. Há pouco acordo até sobre o que vai ser da taxa de juros no Brasil daqui a dois ou três meses, um assunto aqui do nosso vilarejo. Para alguns bancões, a Selic não passa de 12,75%. Para outros, vai a 13,75%. Não temos ideia, como de costume, do que vai ser da taxa de câmbio. De fevereiro de 2020 a dezembro de 2021, o dólar ficou 30% mais caro, um choque brutal. Desde dezembro, caiu quase 11% (comparações com base nas médias dos meses).

Em suma, a melhoria pode ser ninharia e os riscos são enormes. Muitíssimo mais importante é saber se haverá acordo nacional para lidar com o desastre a partir de 2023. Por ora, vemos candidatos apenas se esmerando no disparate.

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