Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire

Lula e o milagre do Natal dos cargos

Presidente tem pouco presente para satisfazer Congresso de direita, a doze dias da posse

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Lula da Silva tem ainda seis ministérios gordos para distribuir entre candidatos a aliados do governo. Quanto a estatais, têm pouca coisa no bolso, a não ser que resolva fazer picadinho da Lei das Estatais e jogar a imundície no ventilador.

Não tem mais a Eletrobras, histórico cabidão. A Petrobras talvez não dê nem para o PT. Bancos públicos maiores podem render alguma diretoria, mesmo assim com restrições "técnicas". Restam uma Codevasf, empresa de escoamento orçamentário, por assim dizer, fundações/fundos na Saúde e na Educação (grande risco de roubança aí), alguma diretoria de banco regional, estatais menores, mas meio falidas.

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva durante a sessão de encerramento dos trabalhos de transição de governo - Ueslei Marcelino - 13.dez.2022/Reuters

Os ministérios mais vistosos em disputa são Saúde, Infraestrutura, Minas e Energia, Cidades, Integração Regional e Desenvolvimento Social (Bolsa Família).

No governo Dilma 1, a Saúde ficou com o PT, Infraestrutura com o PL, Minas e Energia com o MDB, Cidades com o PP e Integração Regional com o PSB, na verdade com Fernando Bezerra Coelho, ora no MDB e ex-líder de Jair Bolsonaro. O Desenvolvimento Social ficou com o PT.

Na segunda divisão, o Desenvolvimento (MDIC) também ficou com o PT, a Agricultura com o MDB (Kátia Abreu) e a Previdência com o MDB.

Mesmo dando fatias gordas do bolo para a coalizão, Dilma Rousseff sofreu no Congresso, que acabou por cortar sua cabeça. Na primeira leva do gabinete, de resto, havia ministros cheios de rolos, gente que acabou caindo na então chamada "faxina" dilmiana.

No Congresso eleito em 2010, o PT era o maior partido da Câmara (68 deputados). O aliado ou inimigo íntimo MDB tinha 65 e a oposição maior era o PSDB, com 54 (o DEM tinha 21). O resto quase todo era negociável. Em números, a situação de Lula é pior.

O maior partido agora é o PL bolsonarista-negocista duro, com 99 deputados (o PT tem 68). PP, bolsonarista-negocista maleável, mas com muito antipetista, União Brasil, PSD, MDB e Republicanos juntam 231 deputados. É uma mistura adúltera de tudo, mas é aí, com muitas defecções direitistas, que Lula pode buscar um bloco de apoio, por ora instável, para juntar à pequena esquerda parlamentar.

União Brasil, MDB e PP querem meia dúzia de ministérios gordos. Não vai dar para todo mundo.

Se a Saúde ficar com uma nomeação de Lula (Nísia Trindade, da Fiocruz), sobra ainda menos, a não ser que um aliado receba um presentão como a Funasa, o que transformaria o ministério em um pato manco. Além do mais, depois do desastre de Bolsonaro e generais, entregar a Saúde a qualquer um seria um insulto nacional.

Se Lula jogar ao mar Simone Tebet, tirando-lhe o Desenvolvimento Social (que o PT também quer), vai acabar com as ilusões de "frente ampla".

Turismo pode ser um prêmio menor, que deve ir para o PSD. Agricultura deve ficar com o PP. Dá para acomodar MDB, outro PP e um União Brasil em Infraestrutura, Cidades, Minas e Energia e Infraestrutura, mas Lula vai arrumar desafetos no Senado ou na Câmara (cada partido quer um ministro de cada Casa). Disputas regionais dificultam ainda a composição. E o Republicanos, da Universal, leva o quê?

Como Josué Gomes, da Fiesp, recusou o MDIC, sobra uma cadeira menor. Mas Lula vai jogar um estranho no ninho da economia, toda arrebentada e sob desconfiança dos donos do dinheiro?

Lula vai ter de entregar mais ministérios do que Dilma. Tem mais oposição, menos estatais para regatear, a direita é muito forte, não há dinheiro para nada (o que permitiria fazer outros arranjos) e o PT parece estar com escassa inclinação para "união nacional".

Lula tem uma semana para conseguir tirar as meias sem descalçar os sapatos.

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