Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire
Descrição de chapéu São Paulo Governo Lula

Decepção com Lula e Tarcísio no caldeirão do Huck animam conversa da elite sobre 2026

Frustrados com Lula buscam alternativa, mas ricos 'frente ampla' rejeitam bolsonarismo

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Certa elite brasileira adotou a candidatura de Tarcísio de Freitas a presidente em 2026, por gosto e por pragmatismo bruto, pois ainda não há alternativa na direita. A campanha midiática para passar um verniz no governador de São Paulo é cada vez mais legível, audível e visível.

Figuras típicas dessa turma aceitam Tarcísio assim como ele é. Outras, não. Mas podem se render a ele. Essa a novidade.

Gente com aversão ao programa destrutivo do bolsonarismo pensa em adotá-lo, dar-lhe polimento e expandir as alianças do governador paulista. O problema é como uma candidatura Tarcísio pode ser viável sem a transfusão de sangue de Jair Bolsonaro. Um Tarcísio muito limpinho levaria Bolsonaro a ameaçar um apoio a Caiado?

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao lado do governador Tarcísio de Freitas durante celebração dos 132 anos do Porto de Santos - Adriano Vizoni - 2.fev.24/Folhapress

Certa elite brasileira desanimou-se de vez com o governo Lula 3 ao longo do primeiro terço de 2024. Coisas como a dívida do governo ainda sem controle e intervenções na Petrobras têm peso. A falta de ação e rumo na educação e no programa ambiental causa decepção, irritação ou desprezo.

Essas pessoas são parte minoritária do mundo rico com algum interesse político ou social. No espírito, são como a velha elite tucana, mais "programática", "técnica", por assim dizer. Nada a ver com o que se tornou o PSDB, que morreu de modo purulento entre 2014 e 2016, com febre golpista. São os mesmos que aderiram à "frente ampla" que votou em Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno de 2024.

Não são, claro, um partido, nem há demarcações claras de grupos. Muitas dessas pessoas ainda são próximas de Luciano Huck, por exemplo, que em 2014 apoiou a candidatura presidencial de Aécio Neves (PSDB-MG). Em 2017, Paulo Guedes achava que Huck seria um veículo para seu programa ultraliberal. Não rolou, aderiu a Jair Bolsonaro. Aécio, por sua vez, inspirou ideias como desconfiar das urnas e campanha legislativa para destruir governos, como fez com Dilma 1. Como se pode ver, trata-se de um contínuo, um espectro de cores ou uma ciranda.

Parte dos "frente ampla" diz que o candidato viável da oposição terá algum apoio bolsonarista, mas que é preciso adotar uma versão civilizável dessa criatura da direita. Por isso, haja "jantares" de aproximação. Para quem tem a fantasia da "Faria Lima" na cabeça, é preciso dizer que muita gente do topo da banca e da finança tem aversão a Bolsonaro.

Essa conversa sobre alternativas se tornou um zunzum mais alto desde março. Suscitou mais fofoca depois do jantar que Huck ofereceu a Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) e a Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, na sexta-feira, 17 de maio. O jantar causou impressão mesmo entre aqueles próximos do apresentador e que estão acostumados a esse tipo de reunião.

Os "frente ampla" mais centristas torcem a cara. Dizem que Tarcísio toca uma política de segurança violenta, que administra a educação de modo escandaloso e incompetente, que quer detonar a ciência e a universidade paulistas, que não tem programa social, de aumento de oportunidades, e que despreza o problema da desigualdade.

Para alguns das turmas dos "jantares", Huck queria tornar Tarcísio mais palatável para a família Marinho, proprietária da Globo; para outros, Huck seria um batedor, atenderia a uma encomenda da empresa.

Participantes do jantar de Huck disseram que o assunto eleitoral no Brasil mais e mais será a segurança pública; que o povo vai ficar animado com a linha-dura. Outros próximos dizem que Campos Neto teria, sim, ambição política, de ser ao menos ministro da Fazenda de Tarcísio, de quem é amigão.

Empresários, altos executivos e ricos em geral não inventam candidatos. Quem define nomes é a política. Mas a elite pode adotar uma candidatura linha-dura, que seria normalizada, difundida e adoçada com fantasias político-ideológicas. Em parte, fizeram isso com Bolsonaro já em fins de 2017.

A eleição está longe, mas está difícil de imaginar um nome novo para a direita (aliás, para a esquerda também). Sempre pode haver balões de ensaio que peguem, como Fernando Collor em 1989. Naquela eleição, Ronaldo Caiado (União Brasil), ora governador de Goiás, também concorreu, candidato ruralista do cavalo branco. Mas Caiado seria "conversa difícil", "esquentado", com ideias ruins sobre reforma tributária e dívida pública, e não teria voto bastante, em especial no Nordeste, dizem certas pessoas.

Tarcísio apenas seria candidato se houvesse uma degradação grande e certa das possibilidades de Lula, difícil de imaginar, menos ainda até fins de 2025. Gilberto Kassab (PSD), secretário de governo de Tarcísio, diz que o governador não seria candidato de jeito nenhum em 2026 (hum). Pessoas dos "jantares" dizem, de resto, que seu lançamento precoce pode causar uma crise no bolsonarismo, divisões na direita e ataques de adversários de centro e esquerda.

O fato é que querem lançar Tarcísio e normalizá-lo; que há quem torça o nariz para o bolsonarismo, mas se desespera com a falta de alternativa, gente que está frustrada com o governo Lula e decepcionada com o fato de o presidente ter esquecido da "frente ampla", que era para inglês ver.

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