Jornalista e escritor, com humor e prosa. É autor de "Modos de Macho & Modinhas de Fêmea" e "Chabadabadá - Aventuras e Desventuras do Macho Perdido e da Fêmea que se Acha", entre outros livros. Na Folha, foi repórter especial. Também mantinha um blog no site da Folha.
Curvas da estrada de Santos
Amigo torcedor, amigo secador, se você pretende, saber quem eu sou, eu posso lhe dizer, entre no meu carro, e na estrada de Santos você vai me conhecer...
Final de semana em ritmo de Roberto & Erasmo, toca para a Baixada, lá uma morena da praia me espera, sorriso de fechar Zé Menino e Gonzaga, paella, caprichos à espanhola, uma bela "siesta", slow food, slow sexo e na sequência o show da Vila Belmiro, o estádio mais charmoso do universo.
Um Sansão como nunca dantes neste domingo. Um Santos e São Paulo com protagonistas, papéis bem definidos e a chance de um drama digno do melhor de Shakespeare e de Plínio Marcos juntos, para não esquecermos o gênio santista do teatro, ele mesmo um jogador de bola e tão decifrador dos subsolos do homem quanto um Dostoiévski.
Mil vivas a Plínio Marcos. Sempre. E passemos a falar das duas estrelas do embate. De um lado Neymar, o inquestionável menino-homem ou homemenino. Do outro, Paulo Henrique Ganso, ainda sob a suspeita, não a minha, que o julgo craque, embora gauche, embora sob filtro de uma melancolia amazônica, se é que você me entende.
PH desce a serra pela primeira vez para enfrentar o time para o qual nasceu e vice-versa. Ninguém mais tem a cara do Santos do que este caboclo paraense. Página virada do folhetim da vida. Acontece. Eis que a mão invisível do mercado, como diria o Adam Smith e o seu fã Laor --presidente do Peixe--, conduziu o rapaz aos morumbescos ares.
Você vai pensar que não gosto nem mesmo de mim, cantará Ganso nas curvas da estrada, avistando ao longe a cidade que lhe deu chance e guarida. O craque que deixou o Peixe assobiará baixinho, na janela do ônibus do novo time: "Só ando sozinho / E no meu caminho/ O tempo é cada vez menor".
Um Sansão dramático. Pelos personagens do campo. Plínio faria uma grande peça deste jogo. Em apenas dois atos. O homemenino feito e o melhor enigma do futebol brasileiro. Os dois que antes se completavam agora se fragmentam no saudável racha para nosso futuro. Neymar e Ganso fizeram inclusive uma aposta. Um jantar. Romântico.
É linda a amizade entre esses moços, pobres moços ricos. No que o neotricolor, emocionado, cantarola na descida para enfrentar o ex-time do peito: "Um amor que eu tive/ E vi pelo espelho / Na distância se perder". Um Sansão lindamente dramático. Sem violência, óbvio, mas que também não desminta o coração dos homens. Não se pode exigir que a torcida do Peixe, a organizada ou a anárquica --mais verdadeira--, bata palminhas e cante nana-neném ao ex-amado. A vida é incrível pelos sentimentos verdadeiros.
Que seja melhor que Shakespeare a peleja, que seja digna de uma peça do Plínio Marcos, o maior dramaturgo do mundo. Que seja um verdadeiro Sansão x Dalila.
Livraria da Folha
- Coleção "Cinema Policial" reúne quatro filmes de grandes diretores
- Sociólogo discute transformações do século 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade