Jornalista e escritor, com humor e prosa. É autor de "Modos de Macho & Modinhas de Fêmea" e "Chabadabadá - Aventuras e Desventuras do Macho Perdido e da Fêmea que se Acha", entre outros livros. Na Folha, foi repórter especial. Também mantinha um blog no site da Folha.
Estatística como superstição
Amigo torcedor, amigo secador, hoje estou mais triste do que rapariga na sexta-feira da Paixão. Donde rapariga, cá no meu Nordeste geográfico e mental, vem a ser puta, simples assim para vocês que não se ligam no léxico além do pobre eixo imaginário do juízo.
Sexta da Paixão. O único dia em que as raparigas são, segundo a moral cristã, proibidas de exercer o ofício. Pense numa melancolia. Pensou? Viaje mentalmente para seu Crato particularíssimo, seu interior.
As raparigas na Sexta da Paixão, caro Tostão, repetem, por crença ou mística, o futebol brasileiro. Algo que beira o religioso. É proibido furar defesas ditas superiores, como assim?, furar uma seleção que ainda não levou um gol na vida --soem as polcas e mazurcas da toda superiora equipe russa. À merda, supersticiosos homens dos números.
A estatística é a nova superstição, amigos. Espanta mais que bruxa no medievo. Acreditamos nos nossos pobres narradores e comentaristas. Acreditamos no grande espetáculo da Champions League. Carecemos, urgentemente, de alguém que diga: "Ok, é importante, mas, peraí, rapaz, joguemos o nosso jogo".
Digo, sem temer a hipérbole, homem que é homem berra o exagero desde o choro de nascença: a nossa crônica esportiva está matando a possibilidade de sermos nós mesmos em matéria de futiba. Só pensam na Europa, e isso contamina tudo. Cadê a mamadeira? Cada a mãe, velho Édipo, cadê a várzea?
Aqui ruminando o meu capinzim mental vos digo: a ideia da vida é Mirassol. Meter seis sem saber quem está do outro lado. Foi contra quem mesmo? Juro que não sei até agora.
Analogia futebol clube, simbora. Igual encontrar a mulher mais bonita da tua vida e não tomar conhecimento. Acreditar que os galãs vencem por nocaute, os feios triunfam por pontos. É disso que precisamos. Ir para cima. Desajuizadamente.
Se este mal-diagramado que vos escreve acreditasse que quem está do outro lado é só lindeza, sabe o que teria acontecido? Nunca teria comido ninguém na vida. Viver é antropofagia pura.
Vida aqui é tupinambá, é caetés, não é matar um leão por dia, é comer um bispo Sardinha a cada missa de corpo presente.
Sejamos mirassóis, bora para cima, porra, como me diz aqui o amigo Peréio. O que justifica um milionário Muricy jogar recuado e aguentar o sufoco dum Palmeiras que no meio de semana levaria meia dúzia no primeiro tempo de um técnico que ganha só para comer a quilo? Tem algo errado na falta de imaginação dos professores.
É muita grana para pouco estudo de matar defesas. Carecem aprender com meu pai, velho Francisco, caçador de nambus e codornizes, que repensava sombras e veredas para botar uma mistura nos pratos dos seus seis filhos na janta.
@xicosa
Livraria da Folha
- Coleção "Cinema Policial" reúne quatro filmes de grandes diretores
- Sociólogo discute transformações do século 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade