Na casa em Embu das Artes (SP) onde vivia, Cláudia acordava antes do sol. Com o volume do rádio alto, cantava músicas sertanejas e arrumava a casa —era fã de Bruno e Marrone.
Não dava importância a comentários maldosos sobre seus trejeitos, nem durante a infância em Lagoa, interior da Paraíba. Afinal, estava sempre rodeada de amigos.
Na escola, fazia a maquiagem e o cabelo das meninas antes de festas e desfiles de 7 de setembro. Aos 18, mudou-se para São Paulo.
Chegou a morar na Europa, período em que conseguiu juntar dinheiro para pagar várias intervenções hormonais e cirúrgicas em seu corpo.
De volta ao Brasil, era incapaz de recusar ajuda a quem precisasse. Aos poucos, suas economias acabaram. A vontade de auxiliar, não. Limpava a casa de amigas doentes, cozinhava, contava histórias divertidas. Alimentava cachorros de rua, levava para casa.
Muitos homens paravam para vê-la dançar em suas noitadas. A mesa estava sempre cheia de bebidas, que comprava e distribuía aos amigos.
A mãe não aceitava sua identidade. Ainda assim, Cláudia dizia que foi ela a pessoa que mais amou. Em 2017, iniciou um processo judicial para alterar nos documentos seu nome e seu gênero. Era mulher transexual. A mudança era seu sonho. Acreditava que, assim, conseguiria empregos melhores do que as faxinas que fazia.
A sentença favorável à alteração veio quando Cláudia estava internada por conta de uma bactéria, no dia 6 de agosto. Não houve tempo para a mudança nos documentos.
Morreu no dia 8, e o atestado de óbito foi registrado com o nome de batismo. Não importa. Para os amigos e familiares, como os sete irmãos que deixa, será sempre Cláudia.
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