Sem projeto, parque Augusta precisa de aval do patrimônio histórico

Duas resoluções de conselho de SP restringem o que pode ser feito na área

Thiago Amâncio
São Paulo

Dois meses após um novo anúncio de que o parque Augusta finalmente seria criado, a área verde na região central de São Paulo ainda não tem projeto executivo para sair do papel e arrisca ter um novo entrave: o patrimônio histórico.

Há pelo menos duas resoluções do Conpresp (órgão municipal de preservação do patrimônio histórico, cultural e ambiental) que restringem o que pode ser feito na área.

O conselho precisa aprovar qualquer projeto para o local, mas ainda nem sequer foi consultado para a criação de um parque municipal.

Uma resolução de 2002 classifica o terreno que agora virará parque como área envoltória de um casarão já tombado nas redondezas e estabelece que qualquer projeto que envolva “alteração, corte ou poda na vegetação de porte arbóreo e nos ajardinamentos existentes” no lote deve ser submetido ao conselho.

A outra resolução é de 2004, específica sobre o terreno onde estará o parque. É que o local foi o antigo colégio Des Oiseaux, escola construída no começo do século 20 e demolida nos anos 1960. 

Essa decisão tomba as árvores e as edificações que restaram da demolição (portaria, muros e guarita), além de estabelecer normas para a ocupação do local. A publicação também faz um inventário da vegetação, que vai de abacateiro e eucalipto a pé de café.

Procurado, o conselho disse que, no passado, “aprovou projetos para a área citada para a construção de empreendimento comercial” —o Conpresp aprovou em 2008 e em 2015 projetos de construção de edifícios no terreno.

O órgão disse também, em nota, que “até o momento não foi protocolado nenhum pedido de aprovação de projeto de parque”. Apesar da consulta obrigatória, representantes do conselho ouvidos pela reportagem afirmam que não deve haver resistência para aprovar o parque —embora avaliem que a consulta deveria ter sido feita antes de qualquer anúncio oficial.

O anúncio foi feito em 10 de agosto, pelo prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), no que pode ser o fim de décadas de disputa judicial.

Prefeitura e as empresas detentoras do terreno do parque, as construtoras Cyrela e Setin, assinaram um acordo com o Ministério Público do Estado que prevê que as companhias doem o lote (de cerca de 24 mil m²) e construam e mantenham o parque.

O parque Augusta, prometeu a prefeitura, pode ser entregue à população até 2020. Em troca, as empresas receberão um mecanismo chamado Transferência do Direito de Construir, certificados que liberam a construção acima do permitido em determinadas áreas sem pagar a mais por isso.

O trato propõe acabar com as ações judiciais que há contra empresas detentoras do lote, como uma que pede indenização pelo fechamento do terreno do parque. Os processos serão encerrados, e as empresas pagarão R$ 10 milhões de indenização. Esse dinheiro será usado para construir o parque.

“Nós já esperamos muito. O imbróglio foi muito grande. Depois que assinamos o acordo, até agora, passou-se pouco tempo. Agora, homologado, arquivando o processo, em seguida, nós vamos cobrar a execução”, disse o vereador Gilberto Natalini (PV), um dos autores da ação que será arquivada agora, após a homologação do acordo.

O advogado Helder Câmara, da Associação de Moradores e Amigos da Consolação), descarta a possibilidade de, desta vez, o parque não sair. “Não existiu em nenhum momento [nos anúncios anteriores de criação do parque] um documento com esse, de concordância de todas as partes envolvidas e de órgãos da sociedade”, afirma. “O projeto tem que ser feito com toda cautela”.

A Secretaria do Verde e Meio Ambiente diz que o parque possui um projeto preliminar aprovado e que esse documento dará subsídio para o projeto executivo, a ser realizado pelas empresas donas do terreno, conforme acordo com o Ministério Público. 

“No entanto, toda a produção será acompanhada pela equipe de arquitetos da pasta e passará por todos os ritos de aprovação necessários, inclusive pelo Conpresp”, afirma.

A pasta diz que o projeto preliminar foi “inspirado em outros cinco projetos apresentados pelo Movimento Parque Augusta, com ajustes para atender às exigências técnicas e legais. 

A pasta não diz quando o parque será entregue à população nem quando as obras vão começar, fala apenas que isso ocorrerá após a conclusão do projeto executivo, quando deve também começar a ser construído o boulevard da rua Gravataí, que ligará o parque à praça Roosevelt.

Quando assumiu, o então prefeito João Doria (PSDB) afirmou que concederia a administração de todos os 107 parques da cidade à iniciativa privada (ele renunciou à prefeitura sem conseguir conceder nem sequer um deles). 

A prefeitura disse à Folha que o parque Augusta será administrado pela prefeitura “e qualquer eventual proposta de concessão será discutida futuramente.”


Entenda o vaivém do parque Augusta

Câmara Em 2011, Câmara de SP aprova criação do parque

Portões Construtoras compram terreno em 2012

Ocupação Em 2015, ativistas ocupam o terreno e conselho municipal aprova projeto para empreendimento privado 

Reviravolta Em 2017, prefeito João Doria (PSDB) diz que vai oferecer terrenos públicos às empreiteiras em troca do parque. Acordo é abandonado 

Parque Em agosto deste ano, prefeitura e construtoras anunciaram novo acordo, com prazo para 2020

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