Policiais de elite de SP são alojados de forma precária em força-tarefa contra o PCC

PMs foram deslocados ao oeste do estado para evitar o resgaste de presos da facção criminosa

Policiais do Comando de Operações Especiais enviados a Presidente Venceslau para evitar o resgate de Marcola vivem situação precária Jardiel Carvalho/Folhapress

Rogério Pagnan
Presidente Venceslau

Policiais militares de elite de São Paulo estão alojados em condições precárias, enquanto são mantidos emergencialmente há semanas no extremo oeste do estado para evitar o resgate de chefes do PCC de presídios paulistas.

A maioria deles dorme em colchões de 5 cm de espessura e sem capa, não recebe roupa de cama e está hospedada em alojamentos improvisados —parte deles sem cama e iluminação adequada, além de receber do governo uma comida de baixa qualidade.

A reportagem entrevistou dezenas de PMs enviados a Presidente Venceslau e visitou alojamentos onde a tropa está hospedada desde o início do mês passado. “Nem os presos são colocados nessas condições”, disse à Folha um soldado da Rota que pediu para não ter o seu nome divulgado.

Presidente Venceslau fica a 612 km de São Paulo. Estão há um mês na cidade homens da Rota, Coe (operações especiais), Cavalaria e 3º batalhão de choque (distúrbios civis), em uma força-tarefa desencadeada assim que a gestão Márcio França (PSB) descobriu um plano para o resgate de bandidos.

O alvo do resgate seria Marco Camacho, conhecido como Marcola, apontado pela polícia e Promotoria como o número 1 do PCC e preso em uma penitenciária de Presidente Venceslau.

Inicialmente, os PMs de elite foram mandados para lá, segundo eles, para um período máximo de duas semanas, mas não há mais previsão de quando devem retornar para suas bases na capital paulista.

Em conversa com a Folha, policiais se dizem prontos para embate imediato, se necessário, mas reclamam do desgaste físico e psicológico ao serem mantidos nessas condições precárias no interior do estado.

Alguns deles também alegam problemas financeiros. Além de ainda não ter recebido as diárias obrigatórias e de não poder realizar bicos, já que estão em uma missão especial, parte deles passou a comprar as próprias refeições, após ter passado mal com alimentos servidos pela SAP (Secretaria da Administração Penitenciária) --a secretaria não respondeu à Folha se a refeição é a mesma servida aos presos. “Estamos pagando para trabalhar”, disse um outro PM.

Outros PMs também relatam problemas com os estudos. Eles frequentam faculdade, mas vem perdendo muitos dias de aula. “Tenho que ficar chorando para os professores”, afirmou um policial. 

Todos os policiais entrevistados pela reportagem falaram na condição de anonimato, já que temem represálias da Secretaria da Segurança Pública, da gestão França.

A Folha teve acesso aos alojamentos dos policiais no início desta semana com auxílio do deputado federal e senador eleito Major Olímpio (PSL), que esteve em Presidente Venceslau para participar de uma reunião com representantes da Secretaria da Administração Penitenciária e do Ministério Público, responsável pela investigação do crime organizado.

“Não há racionalidade em uma ação que não tem começo, pois [o governo] dizia que era só uma ação de treinamento, não há meio, porque deixam os PMs numa situação degradante dessas, e também não há previsão de fim. Ou o governo diz que não tem problemas e devolve esse efetivo para a capital ou transfere esse pessoal [do PCC] de uma vez”, diz o senador eleito por São Paulo.      

A possível transferência provocou uma divisão entre as forças de combate ao crime organizado. Há uma tensão entre grupos que defendem remanejar os presos para fora do estado e os que são contra essa medida por temerem represálias do crime. Sem o aval do Governo de São Paulo, a Promotoria decidiu pedir a transferência dos bandidos, mas ainda não há decisão da Justiça.

Os policiais da Rota, por exemplo, estão alojados em um ginásio da cidade, que continua aberto à população para práticas esportivas. A presença do público ocorre de manhã e à tarde, períodos em que os PMs têm para descansar, já que as rondas costumam ser noturnas.

Parte dos alojamentos desse ginásio fica em um subsolo e, assim, tem a iluminação insuficiente e um dos espaços de descanso fica no corredor de um banheiro coletivo, onde PMs dormem em colchonetes e usam cadeiras de plástico como armário.

Parte da equipe do COE também está em uma área improvisada, na zona rural da cidade. PMs dormem em um galpão sem janelas. Em alguns dos alojamentos, há beliches e ventiladores cedidos na semana passada pela prefeitura da cidade.

Os policiais da capital se revezam nessa força-tarefa. Eles ficam no interior de quatro a sete dias, são substituídos, retornam às suas bases e, após um período de descanso, voltam a Presidente Venceslau.

​Esse retorno para a capital também é motivo de reclamações. Parte volta em ônibus fretados, enquanto outros precisam dirigir as viaturas em uma viagem que dura em média dez horas. Alguns desses motoristas assumem o volante mesmo depois de passarem toda a madrugada de plantão.

MORADORES

A presença dos policiais em Venceslau é elogiada por moradores da cidade. Um deles é o comerciante José Pereira Dutra, 60, dono do restaurante Frango Tudo, o preferido dos PMs para fugir da comida cedida pela Administração Penitenciária. “Só no meu vem uns 50 policiais todos os dias”, disse ele, que fez um desconto de R$ 2 cada prato servido aos policiais.

Além de ajudar nas finanças, o comerciante também elogia o efeito que tantos policiais de elite provocaram na cidade. “Você não vê falar em nenhum assalto. Antes falavam, entrou na minha casa, lá na vila, mas nem isso não falam mais”, disse.

Segundo a vendedora Mayara Siqueira de Lima, 29, os moradores ficaram mais assustados no início do mês passado quando os veículos da PM chegaram em grande número. “Ficou tenso no começo, mas, depois, o pessoal acostumou com ideia”, disse.

OUTRO LADO

Procurado e informado sobre o teor da reportagem, o Governo de São Paulo informou que o governador Márcio França determinou o pagamento de diárias, no valor máximo possível, acima da remuneração normal, em função do caráter de excepcionalidade, a todos os policiais militares deslocados para Presidente Venceslau. 

“As diárias devem ser pagas de forma retroativa ao dia de chegada dos efetivos policiais. Se a Procuradoria Geral do Estado não encontrar um formato para viabilizar estas diárias por decreto, o governador enviará projeto nesse sentido à Assembleia Legislativa para aprovação em caráter de urgência.” 

Ainda segundo nota, o governador determinou ao chefe de gabinete da Secretaria de Segurança Pública e ao comandante interino da Polícia Militar que se desloquem para Presidente Venceslau para inspecionar as condições dos policiais, incluindo alimentação e alojamento. O secretário Mágino Alves Barbosa Filho (Segurança) está em viagem  de férias na Europa. “França também autorizou a acomodação dos policiais em hotéis, pousadas ou pensões disponíveis.”

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