Descrição de chapéu Dias Melhores Natal

Natal inclusivo tem Papai Noel cadeirante e ajudante com Down

Shopping também tem bom velhinho que fala Libras; especialistas elogiam representatividade

Jairo Marques
São Paulo

Keyla, Eduardo e Bianca, todos com quatro anos e moradores de comunidades pobres da cidade de São Paulo, pareciam nem ter notado que o Papai Noel que abraçavam e beijavam enquanto recebiam um presente de Natal não estava em um trenó, mas em uma cadeira de rodas.

 

Assim como o trio, outras dezenas de crianças que estão visitando o bom velhinho e uma árvore de Natal de 21 metros de altura dentro de uma garagem de ônibus na Capela do Socorro, zona sul, estão recebendo afagos e batendo papo com um personagem natalino diferente.

“Parece que toda a inocência desses pequenininhos é transportada para mim e fico assim, sorrindo e com lágrimas nos olhos ao mesmo tempo. Nunca pensei que um dia eu seria um Papai Noel, ainda mais na cadeira de rodas”, diz Júlio César da Silva, 45, cadeirante há 17 anos em consequência de um assalto.

O carro que ele dirigia levou 32 tiros. Dois o atingiram e o deixaram paraplégico e sem visão no olho direito. À época, ele era policial militar. Agora, é funcionário da empresa de transportes Transwolff, idealizadora do Natal inclusivo.

Ao todo, 6.000 crianças de até sete anos receberam brinquedos da ação natalina, que envolve também a visitação, aos finais de semana, dos enfeiteis, da árvore —com 54 mil pontos de luzes coloridas e outras 84 luzes de LED—, e do Papai Noel cadeirante.

“Eles ficam tão emocionados que quase não percebem a cadeira de rodas. Poucos me perguntaram a razão de usá-la e eu disse que, como já estou muito velhinho, preciso de uma forcinha”, conta Júlio.

Segundo José Nivaldo Souza Azevedo, diretor de relações institucionais da empresa, a iniciativa pode ajudar as crianças a conviver melhor com a diversidade. A valorização das diferenças no Natal também fomentou a ação de um shopping, na zona leste, que treinou seus profissionais para falar o básico em Libras com crianças surdas que utilizam os sinais. Os funcionários também foram orientados sobre atenção à criança com autismo e outras deficiências.

“Recebemos cerca de 800 crianças todos os dias na praça de eventos do Papai Noel, por isso a importância de identificar as especificidades de cada uma”, diz Fábio Quintana, gerente de marketing do Shopping Metrô Itaquera, realizador da ação.

Ainda segundo ele, “é fundamental promover a inclusão de pessoas com deficiência na sociedade. E é isso que buscamos fazer com essas pequenas mudanças."

O centro de compras também inovou contratando uma “noelete” —auxiliar de Papai Noel— com síndrome de Down. Beatriz Siléo, 16, fica seis horas por dia no shopping ajudando na entrega de pirulitos e de papéis de carta para crianças.

“Há dois anos estamos preparando a Bia para esse momento. Ela também faz aulas de fotografia e de bateria junto com um grupo de jovens com deficiência intelectual. Agora, é a primeira noelete do país com Down”, diz a mãe da garota, Fabiana Siléo, 41, neuropsicopedagoga.

Segundo ela, a experiência para a filha tem sido muito boa para ela melhorar sua autonomia, sua autoconfiança e suas relações.

A produtora Lilia Alves Hashiguti, da Fênix Eventos, responsável pela ação do Natal do shopping, disse que tentava havia três anos fazer o trabalho de inclusão em algum centro de compras, mas sem sucesso. Agora, ela comemora a repercussão positiva.

Em São José dos Campos (a 97 Km de SP), o Natal da diversidade conta com um Papai Noel negro, que virou sucesso de público em um shopping local, o Vale Sul. O metalúrgico aposentado Rubens Campolino, 70, também causou mobilização nas redes sociais, onde recebeu elogios e incentivo pelo trabalho realizado. Em princípio, ele resistiu ao convite, mas acabou se convencendo da importância do trabalho. 

Ainda em São José dos Campos, o Colinas Shopping também investiu em inclusão. O aposentado José Mario dos Santos Graciano, 69, Papai Noel do empreendimento, aprendeu Libras para se comunicar com as crianças e adultos surdos que fazem uso dos gestos e visitam as instalações natalinas.

Pesquisadora de assuntos relativos à inclusão, Marta Gil avalia que as iniciativas geram impacto positivo na sociedade e ampliam a visibilidade das pessoas com deficiência. “Precisamos de mais medidas assim. Mostrar as diferenças de um jeito alto astral, positivo. É importante também para crianças com deficiência ou outras ‘diversidades’ se identificarem. Elas têm direito à magia e à fantasia.”

Ricardo Sales, doutor em ciências da comunicação pela USP e fundador da empresa Mais Diversidade , diz que a representatividade é “fundamental para a formação de cidadãos que prezem pelo diálogo e pelo respeito”.

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