Descrição de chapéu Folha Mulher

Em 177 anos de história, Polícia Civil do RS tem primeira mulher como chefe

Delegada feminista defende que os homens também combatam a violência de gênero

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Porto Alegre

O Brasil ainda era um Império quando a Polícia Civil do Rio Grande do Sul foi criada, no final de 1841. Em seus 177 anos de história, a instituição gaúcha é chefiada pela primeira vez por uma mulher. A delegada Nadine Tagliari Farias Anflor, de 42 anos, assumiu o principal cargo do órgão no mês passado. 

Atualmente, em todo o país, conforme levantamento de Folha, são apenas duas mulheres nessa posição em 27 estados. A outra chefe de polícia é Ana Claudia Saraiva Gomes, no Rio Grande do Norte. 

“Me descobri feminista dentro da delegacia. Ser feminista não é feio, pelo contrário. É defender os direitos por uma busca de igualdade. A gente não quer ser mais [que os homens], a gente quer ser igual”, disse a gaúcha à reportagem. 

Cerimônia de posse da chefe de Polícia Civil do Rio Grande do Sul, Nadine Tagliari Farias Anflor
Cerimônia de posse da chefe de Polícia Civil do Rio Grande do Sul, Nadine Tagliari Farias Anflor - Leonardo Contursi/CMPA

Com quinze anos de profissão, antes de ser delegada-chefe, Anflor atuou sete anos à frente da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, em Porto Alegre. Foi ali que percebeu a importância do feminismo ao lidar diariamente com pelo menos 40 casos de mulheres vítimas de violência doméstica. “A violência de gênero atinge todas classes sociais. É uma violência sofrida por serem mulheres, é um sentimento de posse dos homens”, disse.

A delegada iniciou o trabalho voltado especificamente às mulheres assim que a Lei Maria da Penha entrou em vigor. Ela ministrava palestras e se reunia com comunidades para explicar sobre a nova legislação. 
“Mas por que não tem Delegacia do Homem? A gente também é vítima, as mulheres mentem, agridem.”

Anflor costumava escutar esse tipo de questionamento do público masculino presente. “Todas as outras delegacias são para os homens. O número de violência doméstica exige atendimento especializado. Preferia que os dados mostrassem que podemos fechar as Delegacias da Mulher, mas não é o que a realidade revela”, respondia. 

Anflor ressalta que diferentemente da criminalidade que atinge toda sociedade, as mulheres são agredidas por seus maridos, ex-companheiros, pais, padrastos e até filhos. No Rio Grande do Sul, os feminicídios cresceram 41% no último ano, de 83 em 2017 para 117 em 2018. 

Para mudar o quadro, Anflor diz que é importante a adesão dos homens à causa feminista. Além disso, o assunto também precisa ser debatido nas escolas, “especialmente com os meninos”, segundo ela. A discussão do tema nos colégios é prevista na Lei Maria da Penha. 

Antes de comandar a delegacia especializada, durante um plantão convencional, Anflor atendeu uma prostituta estuprada. “Ela chegou sem os dentes da frente, enrolada em um lençol”, relembrou. O que deveria se rum programa se transformou em uma sessão de espancamento. O homem foi preso em flagrante. 

Mas, ao trocar o plantão, a delegada sentiu resistência da equipe seguinte com o caso. “Eles queriam entender como autuá-lo por estupro se ele havia contratado o serviço. Como se, por ser prostituta, o homem pudesse fazer qualquer coisa. Ele quase matou ela!”, disse. “A sociedade ainda é machista, a gente já evoluiu, mas precisa evoluir mais”, concluiu.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.