Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Maioria é contra pontos-chave de pacote anticrime de Moro, diz Datafolha

Pesquisa aponta discordância de parcela da população sobre armas e polícia

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São Paulo

As principais propostas do governo Jair Bolsonaro (PSL) para a segurança pública, boa parte das quais foi consolidada no pacote anticrime do ministro da Justiça, Sergio Moro, não contam com apoio da população.

É o que apontam dados inéditos de pesquisa Datafolha.

Eles evidenciam que, para a maioria dos brasileiros, a posse de armas deve ser proibida (64%) e a sociedade não fica mais segura com pessoas armadas para se proteger (72%).

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O ministro da Justiça, Sergio Moro, participa de reunião para apresentar aos deputados as propostas do pacote anticrime - Pedro Ladeira/Folhapress

Uma parcela expressivamente maior também avalia que a polícia não pode ter liberdade para atirar em suspeitos porque pode atingir inocentes (81%), que policiais que matam devem ser investigados (79%) e que quem atira em alguém por estar muito nervoso deve ser punido (82%).

A segurança pública, ao lado do combate à corrupção, foi a grande bandeira da campanha bolsonarista.

Entre as principais promessas do presidente estavam a facilitação da posse de armas, instituída via decreto nos primeiros 15 dias de governo, e o que ele chamava de "retaguarda jurídica" para ações de combate ao crime.

Na prática, trata-se da instituição de um excludente de ilicitude, ou uma imunidade, para policiais e militares que matarem pessoas em serviço.

O pacote Moro prevê que o juiz poderá reduzir pela metade ou mesmo deixar de aplicar a pena por morte cometida em legítima defesa se o "excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção".

Apenas 16% dos entrevistados concordam que não deve ser punida uma pessoa que atira em alguém por estar muito nervosa.

Minuta comentada do pacote anticrime do ministro, liberada à Folha depois de pedido feito com base na Lei de Acesso à Informação, mostra que Moro não amparou as propostas em evidências, estudos ou boas práticas.

No lugar delas, destacou indícios de apoio popular a duas medidas: a prisão de condenados em segunda instância e o confisco de bens de criminosos. Esses tópicos não foram objeto de perguntas aos 2.806 entrevistados pelo Datafolha em 130 municípios do país, nos dias 2 e 3 de abril.

Com base no critério popularidade, no entanto, os resultados da presente pesquisa ensejariam mudanças nas proposições do pacote de Moro antes que esse paradoxo respingue na boa reputação mantida até agora pelo ministro.

Sergio Moro é o mais popular e mais bem avaliado ministro do governo Bolsonaro, segundo pesquisa Datafolha.

O ex-juiz federal é conhecido por 93% dos entrevistados, e seu desempenho na pasta é considerado ótimo ou bom por 59% dos brasileiros.

A ideia de que a posse de armas deveria ser proibida porque representa ameaça à vida de outras pessoas é especialmente alta entre mulheres (74%), jovens de 16 a 24 anos (69%) e pessoas com renda de até 2 salários mínimos (72%).

Por outro lado, a ideia de que o cidadão tem direito à posse de arma legalizada para se defender é mais difundida entre homens (47%), pessoas de cor branca (44%), com formação em nível superior (40%) e com renda maior que 10 salários mínimos (40%).

Entre 71 cruzamentos disponíveis na pesquisa, a posse de armas como direito é majoritária em apenas sete deles: empresários (64%), partidários do PSL (73%) e do PSDB (60%), eleitores de Bolsonaro (54%), aqueles que avaliam seu governo como ótimo ou bom (59%), quem já possui arma de fogo (72%) e quem pretende comprar uma (81%).

 

Apenas 27% dos entrevistados diz já ter cogitado a compra de arma. E 20% declaram considerar a efetivação da compra após o governo ter mudado as regras.

Outro indício de falta de apoio a medidas envolvendo a flexibilização e consequente aumento da posse de armas no país está no percentual de concordância com a frase: "A sociedade brasileira seria mais segura se as pessoas andassem armadas para se proteger da violência".

Apenas 26% dos brasileiros concorda total ou parcialmente com ela, enquanto 72% discordam da afirmação.

Outros resultados da pesquisa são mais ambíguos em relação a medidas do pacote Moro que são apontadas por seus críticos como promotoras de mais encarceramento, num país que já tem uma das maiores populações prisionais do mundo.

Entre elas estão a impossibilidade de concessão de liberdade provisória e o aumento de penas para certos crimes.

Para 54% dos brasileiros, quanto mais pessoas presas, mais segura estará a sociedade. Outros 42% discordam.

Ao mesmo tempo, 62% concorda que, quanto mais criminosos nos presídios, mais as facções se fortalecem, afirmação da qual 34% discordam.

Se facções do crime organizado são responsáveis por parte da violência e da sensação de insegurança, fica latente o conflito entre as posições dos entrevistados.

Para 81%, polícia não deve atirar sob risco de atingir inocentes

A pesquisa explicita que o combate ao crime ao custo de vidas inocentes não encontra respaldo na população.

Para 81% dos brasileiros, a polícia não deve ter liberdade para atirar em suspeitos sob o risco de atingir inocentes. Apenas 17% admitem esse tipo de ação.

O dado contraria a postura do presidente Bolsonaro e dos governadores de São Paulo, João Doria (PSDB), e do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC).

Em rede social, o presidente tem exaltado ações policiais cujo desfecho inclui a morte de suspeitos. Já o governador paulista chegou a dizer, na campanha, que "a Polícia Militar no Brasil tinha que matar mais". Depois de eleito, afirmou que "o bandido que reagir vai para o cemitério".

 

O ex-juiz federal Witzel defende o "abate" de criminosos portando armas pesadas desde a campanha.

Em São Paulo, as mortes provocadas por policiais militares em serviço em março aumentaram 48% em relação ao mesmo mês do ano passado, segundo dados preliminares da Corregedoria da PM.

No Rio, 305 pessoas foram mortas pela polícia em janeiro e fevereiro deste ano, estabelecendo um novo recorde na série história deste dado.

Segundo a pesquisa Datafolha, o percentual daqueles que admitem o extermínio de criminosos como uma espécie de política de segurança pública é de 29%.

O percentual daqueles que concordam que a sociedade brasileira seria mais segura se policiais matassem mais suspeitos é maior entre pessoas de baixa escolarização (39%) e entre aquelas que possuem arma de fogo (41%) ou que pretendem adquiri-la (42%). A maioria dos brasileiros discorda desta afirmação (68%).

Para 79% dos entrevistados, policiais que matam suspeitos de crimes devem ser investigados, o que contraria a proposta do presidente de instituir um excludente de ilicitude para ações de forças do Estado em que ocorram mortes.

Quando a questão é a permissão do uso da força letal para legítima defesa do policial, no entanto, o quadro se inverte e 72% concordam que este tipo de ação deva ser permitido, contra a discordância de 25% dos entrevistados.

O Código Penal já prevê a exclusão de ilicitude quando o agente público intervém para legítima defesa.

Estudos apontam que mortes provocadas por oficiais, mesmo quando não ocorrem em legítima defesa, tendem a ser reportadas como se o fossem às autoridades.

No caso emblemático mais recente, soldados do Exército dispararam 80 tiros contra um veículo no Rio de Janeiro, matando o músico Evaldo Rosa dos Santos. No primeiro comunicado do Comando Militar do Leste, o caso foi descrito como reação dos militares a uma "injusta agressão". A versão, desmentida, foi feita com base no relato da patrulha.

Por essas e outras que a relação da população com a polícia oscila entre dois polos opostos: a confiança e o medo.

Segundo o Datafolha, 51% dos brasileiros têm mais medo que confiança na polícia, enquanto 47% confiam na corporação mais do que a temem.

Homens (52%), pessoas de cor branca (51%) e com renda superior a 10 salários mínimos (58%) estão entre as que mais confiam nas forças policiais.

Já o medo supera a confiança entre mulheres (55%), jovens de 16 e 24 anos (53%), pessoas de cor preta (55%), amarela (56%) e indígenas (60%), além daqueles com renda de até 2 salários mínimos (54%).

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