'Meu erro foi ter nascido mulher', diz advogada filmada enquanto fazia ioga no Rio

Vítima vê como afronta nota de esclarecimento de empresário que a filmou e publicou vídeo em rede social

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Rio de Janeiro

“Meu único erro foi ter nascido mulher e gostar de fazer ioga”. Assim termina a mensagem que a advogada Mariana Maduro, 33, divulgou em rede social na noite desta terça-feira (4), depois ter sido filmada praticando ioga no sábado (1) na lagoa Rodrigo de Freitas, zona sul do Rio de Janeiro. O vídeo foi publicado na internet com mensagens de cunho sexual.

Na filmagem não autorizada, o empresário Ricardo Machado de Sá Roriz, 62, conversa com o ambulante Celsão enquanto este faz gestos obscenos. Ele publicou o vídeo em uma das suas redes sociais, na qual tem cerca de 300 mil seguidores.

Roriz é dono de uma loja de artigos militares em Copacabana. Na perna, ele tem tatuagens do presidente Jair Bolsonaro e da Polícia Militar, mas, de acordo com a delegada Valéria Aragão, titular da delegacia que investiga o caso, o empresário é apenas um admirador da PM e não tem vínculos com a instituição.

No vídeo do último sábado, é possível escutar a conversa entre o empresário e o ambulante identificado como Celsão: “Ela está plantando bananeira? Vê, vê, vê”, diz Celsão. “Celsão, você fica disfarçando. Vai botar a água ali e ficar fingindo. (...) Celsão, você é o maior ‘voyeur’ , responde Roriz, enquanto filma as mulheres se exercitando. “Eu gosto pra blau blau blau”, afirmou Celsão simulando masturbação.

A nota de esclarecimento do empresário foi publicada na página de sua loja de artigos militares na terça-feira, depois que ele prestou depoimento na delegacia. Mariana diz, porém, que o texto de retratação aparece datado como se tivesse sido publicado no dia 2.

“Não estou bem. Essa nota de esclarecimento é uma afronta à minha inteligência”, afirma Mariana, que se diz emocionalmente exausta. Desde o episódio do vídeo, ela diz que apenas saiu de casa para ir à delegacia e dar entrevistas perto de casa.

Mulher de cabelos compridos segura um papel
A advogada Mariana Maduro, 33, em imagem de rede social. Ela foi vítima de assédio, sendo filmada fazendo ioga com comentários de cunho sexista na Lagoa Rodrigo de Freitas, zona sul do Rio, no sábado (1) - Reprodução

“Pode ser que ele edite depois que eu fiz esse vídeo. Mas a data até agora, e isso já está salvo, óbvio, é do dia 2 de agosto. Como se ele tivesse imediatamente se preocupado em fazer um esclarecimento. Hoje estamos no dia 4 de agosto para relembrá-lo, e a postagem foi feita por volta das 16h, 17h”, comentou a advogada no vídeo.

De acordo com a delegada Valéria Aragão, Roriz e o ambulante vão responder por ato obsceno, injúria e perturbação da tranquilidade

Em sua retratação, Roriz disse que a "conversa íntima entre dois amigos" foi a público "por meio de uma publicação infeliz" feita por ele em seu Instagram.

"Venho externar minha solidariedade a quem se sentiu ofendido ou depreciado pela referida postagem, assim que tomei conhecimento do erro cometido, retirei imediatamente a postagem que não durou mais de 50 min ativa, deixo claro que a partir desta data supracitada não foi por mim impulsionada mais nenhuma postagem nesse teor. Assim, registro minhas escusas públicas a todos aqueles que se sentiram ofendidos(as)", escreveu.

“Então essa conversa entre 300 mil amigos vazou? Eu quase cheguei a ter um pouco de pena. O que ocorreu não foi um infortúnio. Não foi alguém que o filmou inadvertidamente. Era uma postagem“, afirma Mariana.

Segundo ela, o empresário já tinha publicado outro vídeo similar em julho, no qual ele filma a advogada e outros colegas de Ioga durante um passeio que faz na Lagoa.

“Naquele vídeo, ele diz: ‘Ninguém aqui quer ver ioga. Queremos ver alcatra abrindo’”, diz a advogada. Segundo ela, o vídeo foi apagado.

A delegada afirma que todos os ilícitos cometidos pelo empresário e pelo ambulante preveem pena privativa de liberdade, mas, como a penalidade é inferior a dois anos, o mais comum é uma sanção restritiva de direitos e a obrigatoriedade de um curso educativo ou de trabalhos assistenciais, além de pagamento de valores a estabelecimentos de assistência.

“Se comentários infelizes existem, que permaneçam sigilosos e jamais sejam divulgados, principalmente, a quem tem seguidores às escâncaras, mais de 300 mil em uma [rede social] e 18 mil em outra”, afirmou a delegada.

O advogado Valdo Tavares, que defende Roriz, afirma que o seu cliente está arrependido do episódio. Tavares ressaltou que o acontecimento “foi uma conversa íntima entre amigos”.

“O conteúdo do vídeo ficou publicado no Instagram dele por não mais de 40 e 50 minutos. Nesta rede social, ele tinha 18 mil seguidores. Ela (Mariana) publicou o vídeo no seu próprio Instagram e deixou lá por quatro dias. O entendimento da defesa é que foi uma infração de menor potencial ofensivo”, diz.

Ainda de acordo com Tavares, ele se comprometeu em ajudar à polícia a levar o ambulante, identificado como Celsão, a prestar depoimento na delegacia. “Ele é um ambulante que vende bebidas. Desde o acontecimento, não apareceu mais no seu ponto de trabalho."

A advogada filmada em aula de ioga diz que pretende processar a dupla civil e criminalmente. Uma amiga que também se exercitava com ela na Lagoa já prestou depoimento na sede da delegacia.

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