Sem uso, 'ônibus marítimos' de Ilhabela de R$ 4,5 milhões se deterioram em área privada

Embarcações adquiridas com royalties do pré-sal seriam alternativa ao trânsito caótico da cidade turística de SP

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Reginaldo Pupo
Ilhabela (SP)

Adquiridas por R$ 4,5 milhões, a partir de recursos dos royalties do pré-sal, pela Prefeitura de Ilhabela, no litoral norte paulista, três embarcações que funcionariam como “ônibus marítimos” estão se deteriorando numa marina particular em Caraguatatuba.

Os ônibus marítimos, apelidados pela prefeitura de aquabus, nunca foram utilizados. Comprados no final de 2015 na gestão do então prefeito Antônio Colucci (PPS), foram projetados para para realizar o transporte público de moradores e turistas pela orla de Ilhabela, com o mesmo valor da passagem dos ônibus terrestres, como alternativa ao caótico trânsito na cidade aos finais de semana, feriados prolongados e temporada de verão.

As embarcações têm capacidade para transportar até 60 passageiros, com ar condicionado, TV, som ambiente e local para seis bicicletas e pranchas de surf.

Apesar de toda a comodidade, as embarcações não foram utilizadas pois os píeres de atracação já existentes em diversas praias de Ilhabela não possuem acessibilidade.

Por quatro vezes, a prefeitura, ainda na gestão Colucci, tentou abrir uma licitação para a contratação de uma empresa para readequar os píeres, mas o TCE (Tribunal de Contas do Estado) barrou todas as tentativas, por suspeita de irregularidades.

Após ficarem quase um ano ancoradas no canal de São Sebastião e expostas ao tempo, em 2017, o então prefeito Márcio Tenório (MDB), que sucedeu Colucci, decidiu enviar as embarcações para uma marina particular em Caraguatatuba, onde permanecem até hoje.

A Folha acompanha a situação dos barcos parados desde a aquisição. Em julho deste ano, os vereadores Valdir Veríssimo (Podemos) e Nanci Zanato (PPS) estiveram na marina Juqueriquerê e afirmaram que constataram as más condições estruturais dos ônibus marítimos, o que impediriam sua navegabilidade.

Os barcos estavam fora da água. Os cascos apresentam acúmulo de matéria orgânica e partes da estrutura aparentam estar deterioradas.

“Pelo tempo que os barcos ficaram abandonados na marina, observamos que eles não têm mais condições de navegar. Estão completamente podres e com rachaduras”, disse Nanci. ​

Dois barcos estão ancorados em uma marina, com o logotipo prefeitura de Ilhabela
Aquabus de Ilhabela, em imagem de dezembro de 2018, parados em uma marina de Caraguatatuba - Zanone Fraissat/Folhapress

Em julho do ano passado, durante reunião do Comtur (Conselho Municipal de Turismo), a atual secretária de Turismo de Ilhabela, Bianca Colepícolo, afirmou que seriam necessários R$ 900 mil para recuperar as embarcações.

Além dos R$ 4,5 milhões investidos na aquisição dos ônibus marítimos, a prefeitura também tem que arcar com os custos com a marina, herdados da gestão de Márcio Tenório, embora nenhuma manutenção teria sido feita nas embarcações, segundo o ex-prefeito Antônio Colucci.

A conta, porém, caiu no colo da atual prefeita de Ilhabela, Maria das Graças Ferreira dos Santos (PSD), que era vice de Márcio Tenório, cassado pela Câmara em 16 de maio de 2019 por improbidade administrativa.

Segundo ela, em março deste ano foi celebrado um acordo entre a marina e a prefeitura, no valor de R$ 388.756,28. “Os débitos foram pagos por via judicial porque a administração anterior não deixou contrato firmado e licitado”, disse a prefeita, se referindo ao ex-prefeito Márcio Tenório.

Segundo a prefeita, o município abriu processo para corrigir a questão da infraestrutura, licitando flutuantes para os oito píeres, para permitir o transporte aquaviário.

A prefeita afirmou também que o município não deve operar as embarcações, conforme o plano inicial. “Vamos fazer a concessão do serviço para a iniciativa privada. Os estudos, inclusive, estão previstos em nosso plano de mobilidade”.

Com relação aos gastos com a aquisição das embarcações e com a locação da marina, a prefeita Maria das Graças afirmou que existe uma ação civil pública para apurar as responsabilidades e um possível ressarcimento dos valores à prefeitura.

O ex-prefeito Antônio Colucci, que adquiriu as embarcações, disse que as adaptações de acessibilidade dos píeres de atracação foram uma exigência do MPF (Ministério Público Federal), por tratar-se de transporte público.

“Tentamos iniciar a operação em dois píeres, com rampa e flutuantes, pois não conseguimos fazer a licitação dos demais píeres, já que entidades da sociedade civil questionaram a licitação, atrasando todo o processo”.

O ex-prefeito Colucci, que adquiriu as embarcações, disse também que as adaptações de acessibilidade dos píeres de atracação foram uma exigência do Ministério Público Federal, por tratar-se de transporte público.

Colucci afirmou ainda que as embarcações, que passaram por processo de licitação, chegaram em Ilhabela em perfeito estado e que foram abandonadas, posteriormente, na gestão de Márcio Tenório. “Os barcos, inclusive, vieram navegando de Santa Catarina, onde foram construídos, atravessando esse marzão todo”, afirmou.

Segundo o ex-prefeito, os barcos foram “escondidos” na marina, às margens do rio Juqueriquerê, em Caraguatatuba, e puxados para dentro da propriedade, posteriormente. “Não deram partida nos motores, não fizeram nenhum tipo de manutenção e agora querem cobrar por isso”, denunciou.

O proprietário da marina Juqueriquerê, Jorge Appes, e o ex-prefeito Márcio Tenório foram procurados pela Folha, mas não se manifestaram.​

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