Descrição de chapéu Coronavírus

Os estabelecimentos tradicionais de SP e do Rio que fecharam na pandemia

Relembre ícones da vida urbana que sucumbiram em 2020, como Filial e Hipódromo

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Rio de Janeiro e São Paulo

Ainda que o fechamento de bares, cafés ou restaurantes nunca possa se comparar à perda de uma só vida pelo flagelo da pandemia de Covid-19, a derrocada do setor representa a desestabilização de toda uma cadeia econômica e de um grande número de profissionais e suas famílias.

Na capital paulista, até meados de 2020, a estimativa da associação do setor era de que 12 mil estabelecimentos já haviam encerrado suas atividades devido aos efeitos da pandemia. Em todo estado, esse número seria de cerca de 50 mil.

O ano em que nos fechamos em nossas casas, abusamos do delivery e assistimos amedrontados à escalada do número de vítimas —que se aproxima de 200 mil pessoas, em dados subestimados— foi o ano em que cidades como Rio e São Paulo perderam casas tradicionais que por anos e décadas fizeram parte da vida e da história de seus habitantes.

Quando, finalmente, o pior ano de nossas vidas passar e 2021 puder se diferenciar de 2020, será triste andar por essas duas capitais e ver o tamanho dos estragos da pandemia refletidos nas portas fechadas de bares e restaurantes.

*

PASV
O balcão de fórmica e as paredes revestidas em madeira e azulejos antigos deixavam claro que o Pasv, inaugurado em 1970, era um dos últimos restaurantes com a cara de um centrão que já não existe. Paella, feijoada, cozido à espanhola e prato feito: era possível almoçar ali até o meio da tarde.
A equipe andava desfalcada. Há poucos anos, Maria, sexagenária, quebrou a perna e não voltou mais. Ficam a memória de pratos bem-feitos, da garçonete que fazia contas com cálculos mentais que você jamais contestaria e a certeza de que os almoços com os colegas do trabalho —oxalá voltem a existir— nunca mais terão a sensação de estar prestando tributo a um clássico.

ilustração da fachada do Pasv
Pasv - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Filial
Fechado desde o início da pandemia, o bar que já foi o reduto da boêmia da Vila Madalena ainda tentou sobreviver com a entrega de comida. Não deu certo. Combalido, o Filial teve faturamento normal apenas em janeiro. Durante o Carnaval, em fevereiro, com as restrições aos foliões no bairro da zona oeste, o faturamento já havia caído. Os cinco sócios ainda tentam um acordo com um investidor para reabrir. Seja como for, passar pelo número 245 da rua Fidalga nesses tempos bicudos e ver fechado o bar que era o último a encerrar o expediente no bairro é de partir o coração.

Ilustração da fachada do Bar Filial, com mesas na calçada
Bar Filial - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Marcel
Lá se foram quase 65 anos. Nesse período, um dos mais importantes e tradicionais restaurantes franceses de São Paulo sobreviveu a presidentes populistas, ditadores militares, a Nova República, dois impeachments e o retorno do populismo —agora destro—, crises e planos econômicos sucessivos. Sobreviveu. À pandemia do Covid-19 e à derrocada da economia brasileira, não. A casa do chef Raphael Durand Despirite, que já pertenceu ao seu avô, promete voltar no futuro, em novos modelo e local. Nela se fazia um dos melhores suflês da cidade.

Ilustração da fachada do Marcel
Marcel - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

La Frontera
O restaurante de comida sul-americana, que oferecia opções como a milanesa grelhada com manteiga clarificada, rúcula, tomate cereja e mostarda Dijon, funcionava numa simpática casa ao lado de uma viela sem saída atrás do cemitério da Consolação. Em abril, ainda no início da pandemia, foi uma das primeiras casas a anunciar que estava fechando. De lá para cá, a prolongada quarentena deixou claro que seria impossível continuar aberta. Irmão mais velho do La Frontera, o argentino Martin Fierro, na Vila Madalena, continua funcionando.

Ilustração da fachada do restaurante La Frontera
La Frontera - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Mandíbula
Mesmo se você torcesse o nariz para um lugar que poderia ser chamado de “descolado” e “moderninho”, as chances de gostar do Mandíbula eram grandes. A combinação de cerveja, gin-tônica e o ambiente da Galeria Metrópole faziam do bar um local que deveria ao menos ser conhecido por quem gostava, e espera voltar a gostar, da vida noturna de São Paulo. É verdade que os donos planejavam sair do endereço devido às restrições de horário impostas pela galeria, mas o plano era continuar em outro ponto da cidade como a Barra Funda ou a Liberdade. Não deu tempo.

Ilustração da fachada do Mandíbula, com mesas e banquetas em frente à vitrine do bar
Mandíbula - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Suplicy Cafés
Não que você não vá mais tomar um café no Suplicy. A rede tem ainda 24 lojas abertas. Você não vai é poder sentar na unidade da alameda Lorena, nos Jardins, que funcionava havia 17 anos. Assim como os donos de outros estabelecimentos, a expectativa do proprietário Marco Suplicy é que, no futuro, seu café volte a funcionar no bairro. Em um dos pontos mais interessantes desse pedaço da cidade, era um café com personalidade, que não exagerava nos valores e dava ao local um charme que apenas as boas cafeterias têm. Era o caso do Suplicy da Lorena.

Ilustração da fachada do Suplicy
Suplicy Café - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Octavio Café
Aberto em 2007 pelo ex-governador de São Paulo Orestes Quércia em um terreno de 1.600 m², na avenida Faria Lima, o Octavio Café já foi considerada a maior cafeteria da América Latina. Da rede de cinco lojas, apenas duas sobraram, ambas no aeroporto de Viracopos, em Campinas. Com 12 métodos diferentes de preparo de grãos de café, o Octavio era bastante frequentado por empresários e profissionais do mercado financeiro. Não foi o suficiente para manter viável a operação no prédio de arquitetura imponente durante a pandemia.

Ilustração da fachada do Octávio Café
Octavio Café - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Blú Bistrô
O charme desse restaurante em Perdizes, zona oeste, estava em realmente se parecer com o significado da palavra bistrô, pequeno e despretensioso. Na entrada, croquete de pato, e no prato principal, o dueto Blú, medalhão de filé mignon ao poivre e risoto de parmesão.. Essas eram as melhores escolhas. Os bons cardápio e carta de vinhos, porém, não eram tudo. No pequeno sobrado na João Ramalho, a duas quadras da PUC, o trio de jazz que tocava no mezanino tornava o local perfeito para jantares a dois. Após 15 anos aberto, sobrou apenas um tapume na frente do Blú.

Ilustração da fachada do Blú Bistrô
Blú Bistrô - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Itamaraty
Até uma campanha na internet tentou salvar um dos mais tradicionais restaurantes do centro. Frequentada por advogados, juízes e professores, a casa estava havia 80 anos em frente à Faculdade de Direito da USP, na rua José Bonifácio. A campanha do Despendura —brincadeira com a tradição de advogados não pagarem contas em restaurantes em 11 de agosto, data em que é comemorada a profissão, o Dia do Pendura— foi a última tentativa de reviver o Itamaraty. Presidentes e ministros do STF, além de ex-estudantes e paulistanos em geral, têm muito a lamentar.

Ilustração da fachada do Itamaraty
Itamaraty - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Petirosso
Aberto em 2007, pelo chef italiano Marco Renzetti, a Osteria del Pettirosso, na alameda Lorena, nos Jardins, zona oeste, era um pedaço de Roma, terra de Renzetti, em São Paulo. Era também daqueles lugares que valia cada visita. Mesmo se você fosse aquele tipo de cliente que pede sempre o mesmo prato, o menu te faria pensar duas, três, quatro vezes. Ainda assim, era difícil declinar o fettuccine imperiali, a versão do chef para o tradicional fettuccine all’alfredo, que ainda era finalizado na mesa do cliente. No início de julho, Renzetti lançou o Petti per Te, via delivery.

Ilustração da fachada do Petirosso
Petirosso - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Hipódromo
Localizado no Baixo Gávea, reduto boêmio do Rio, o bar Hipódromo fechou depois de 75 anos de funcionamento. O bar suspendeu seu funcionamento em março devido à pandemia de Covid-19. Em julho tentou reabrir no sistema de delivery, mas o bar, que recebeu gerações, não resistiu e anunciou seu fechamento no dia 21 de julho.

Ilustração da fachada do Hipódromo
Hipódromo - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Sentaí
Vizinho à Central do Brasil, no Rio de Janeiro, o restaurante fechou em novembro após 70 anos de funcionamento por causa dos efeitos da pandemia de Covid-19. De fachada e decoração simples, a casa conquistou prestígio com os pratos com lagosta, além da famosa coxinha de camarão. Bacalhau e pratos recheados de frutos do mar também eram famosos. O local já sofria com o abandono das redondezas e por isso tinha horário de funcionamento restrito. Mesmo o título de “rei da lagosta” não garantiu a sobrevivência do restaurante nesta crise.

Ilustração da fachada do Sentaí
Sentaí - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Espírito Santa
Localizado em um casarão do século 19 em Santa Teresa, no Rio de Janeiro, o Espirito Santa fechou suas portas em maio, após 15 anos de funcionamento. O cardápio, sob o comando da chef manauara Natacha Fink, oferecia pratos com ingredientes do Norte, como peixes amazônicos. “Foram 15 anos enfrentando batalhas. A maior delas para valorizar o bairro de Santa Teresa (...). Resistimos até onde foi possível, mas chegamos ao nosso limite”. Foi assim que os proprietários se despediram de seus clientes em uma mensagem divulgada nas redes sociais.

Ilustração da fachada do Espírito Santa
Espírito Santa - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Casa Villarino
Um dos berços da Bossa Nova, a Casa Villarino foi fundada por espanhóis em 1953 no Rio de Janeiro e vendia “pratos, lanches, bebidas e comestíveis finos”, segundo seu site. Foi lá que Tom Jobim (1927-1994) e Vinicius de Moraes (1913-1980) se conheceram em 1956, por meio de Lúcio Rangel. Em uma de suas mesas, musicaram a peça "Orfeu da Conceição". Localizada no centro do Rio, a casa interrompeu o funcionamento durante a pandemia de Covid-19. Tentou reabrir as portas em julho, mas não resistiu e acabou encerrando as atividades em novembro.

Ilustração da fachada da Casa Villarino
Casa Villarino - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Carandaí
Instalado há dez anos em um imóvel tombado e centenário no Jardim Botânico, no Rio de Janeiro, o empório, aberto há dez anos, era conhecido por valorizar pequenos produtores artesanais brasileiros, que faziam queijos, frios, pães, vinhos e cervejas que poderiam ser consumidos em mesinhas no fundo da loja. Encerrou suas atividades em setembro com a crise causada pela pandemia de Covid. “Algumas histórias precisam de um ponto final, assim outras podem ser escritas. A gente ama o que faz e quer continuar fazendo. Agora é olhar pra frente”, escreveram em rede social.

Ilustração da fachada do Carandaí
Carandaí - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Trapiche Gamboa
Instalado em um sobrado do século de 19 do Rio de Janeiro, o Trapiche Gamboa foi inaugurado como casa de shows em 2004, antes do projeto Porto Maravilha, para revitalizar a região. Fica entre três ícones da região: a Pedra do Sal, a Ladeira do Valongo e o Largo da Prainha. O casarão, com pé direito de 13 metros e capacidade para 250 pessoas, era palco de rodas de samba, reunindo gerações de músicos famosos. Também tocava jongo, chorinho e outros gêneros musicais. Não resistiu à pandemia de Covid-19 e encerrou as atividades em março, mas ainda sonha com a reabertura.

Ilustração da fachada do Trapiche Gamboa
Trapiche Gamboa - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Mosteiro
Fundado em 1964 no centro do Rio de Janeiro, perto da praça Mauá, o restaurante português não resistiu à pandemia de Covid-19 e à morte do fundador, José Temporão, em abril, aos 97 anos. Com uma fachada de granito sob toldo branco, tinha “culinária clássica, menu diversificado e muito conforto” e atendia “os clientes mais exigentes”, segundo seu site. O restaurante chegou a receber políticos do naipe de Ulisses Guimarães. Seus proprietários, entre eles o ex-ministro José Gomes Temporão, anunciaram o fechamento da casa em junho.

Ilustração da fachada do restaurante Mosteiro
Mosteiro - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress

Navegador
Localizado no Clube Naval, no centro do Rio de Janeiro, o restaurante Navegador, aberto em 1975, já reuniu clientes ilustres, como o ministro da Economia, Paulo Guedes. Em junho, a chef Teresa Corção gravou um vídeo destinado ao ministro no qual avisava que o restaurante do qual ele gostava fecharia. Ela listou também os problemas que levaram ao fechamento, como a dificuldade de acesso ao crédito. Após mais de quatro décadas de funcionamento, a casa, que apoiava produtores locais e a gastronomia brasileira, não resistiu e precisou fechar as portas após leiloar móveis e utensílios.

Ilustração da fachada do Clube Naval, onde ficava o Navegador
Navegador - Ilustração Veridiana Scarpelli/Folhapress
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.