Grande São Paulo tem previsão de chuva abaixo da média até o fim do verão

Reservatórios da região receberam 25% menos chuva em 2021 do que em 2013, ano da crise hidríca

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São Paulo

Os reservatórios que abastecem a região metropolitana de São Paulo receberam neste ano, entre janeiro e outubro, em média, 25% menos chuva do que no mesmo período em 2013, ano que antecedeu a crise hídrica.

A precipitação acumulada e somada dos sete sistemas de abastecimento –Alto Tietê, Guarapiranga, Cotia, Rio Grande, Rio Claro, São Lourenço e Cantareira– foi de 5,4 mil milímetros entre janeiro e a primeira semana de outubro de 2021.

No mesmo período de 2013, a chuva acumulada foi de 7,2 mil, segundo dados da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) compilados pela Climatempo a pedido da Folha.

Vista área da represa Jaguari, em Piracaia, no interior de São Paulo, que faz parte do Sistema Cantareira
Sistemas de abastecimento de água na Grande São Paulo, como o Cantareira, sofrem com a falta de chuvas - Bruno Santos - 6.out.21/Folhapress

Na comparação com sete anos atrás, a região tem mais um reservatório, o de São Lourenço, que começou a operar em 2018. No mesmo ano, os reservatórios da Grande São Paulo tiveram ainda mais um reforço com a interligação do Cantareira com as represas Jaguari e Atibainha.

Mesmo assim, os sistemas que abastecem a região estão 21% menos cheios do que no mesmo período em 2013, segundo o Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais).

O risco de desabastecimento é agravado pela crise climática com tendência de seca extrema devido às chuvas abaixo da média que vêm sendo registradas desde o último verão. A previsão dos especialistas é que o problema irá se prolongar até a estação chuvosa de 2022.

Um novo indício da crise hídrica ocorreu nesta quarta-feira (13), quando a ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico) assinou termo para permitir a captação de água da bacia do rio Paraíba do Sul pelo sistema Cantareira.

A estratégia de reforço foi deflagrada a pedido da Sabesp e é prevista quando o reservatório atinge menos de 30% de sua capacidade —na quarta, o sistema Cantareira atingiu 28,6% de seu volume, abaixo dos 38,6% registrados no mesmo dia em 2020. O termo foi assinado por representantes dos governos de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, onde está localizada a bacia do rio Paraíba do Sul.

Na prática, a Sabesp está autorizada até 31 de dezembro a captar água da represa da usina hidrelétrica Jaguari, abastecida por um afluente do rio Paraíba do Sul, para o reservatório Atibainha, que integra o sistema Cantareira.

De acordo com a chefe do Serviço de Pesquisa Aplicada do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia), a meteorologista Danielle Ferreira, a previsão para os próximos meses é de chuva abaixo da média, entre 5 e 10 milímetros menor do que o normal para o período. "As chuvas vão ocorrer, mas não o suficiente para compensar os meses de estiagem e o último verão mais seco do que o esperado", diz.

A mesma previsão é feita pela meteorologista da Climatempo Ana Clara Marques, que prevê entre 20% e 30% menos chuvas na Grande São Paulo entre outubro e março do ano que vem. "A preocupação maior é com o próximo período seco, a partir de junho de 2022, quando os reservatórios podem ficar abaixo do volume esperado", diz.

Segundo ela, para reverter o cenário de seca e os percentuais de armazenamento dos reservatórios voltarem a aumentar, é necessário ao menos um mês de chuvas intensas para encharcar o solo e a água voltar a encher as represas.

Isso, normalmente, acontece no fim de novembro, quando começa o período chuvoso no Sudeste, mas em 2022, a previsão é que esse ciclo não se complete.

Segundo o levantamento da Climatempo, a precipitação em todos os reservatórios da Grande São Paulo está abaixo da média anual. A pior situação é dos sistemas Cotia e Cantareiras que atingiram 52% e 57% da média, respectivamente. Em 2013, no mesmo período, os dois reservatórios tinham 92% e 72% da média anual.

Entre as explicações para a perspectiva de um segundo verão consecutivo com chuvas escassas está a atuação do fenômeno La Niña que impede a chegada da umidade vinda da Amazônia. Outro agravante é o resfriamento do oceano Pacífico. "Esse resfriamento faz com que o sistema que leva chuvas ao Sudeste não seja tão atuante", diz Ferreira.

Segundo Pedro Cortês, professor de pós-graduação em ciência ambiental do Instituto de Energia e Ambiente da USP, a falta de chuvas que vêm da Amazônia prejudica especialmente os sistemas Cantareira e Alto Tietê, que dependem dessa dinâmica de precipitação. "Eu não vejo uma recuperação boa para esses reservatórios porque as chuvas não serão suficientes", diz.

De acordo com cálculos do Inmet, entre outubro e dezembro, irá chover o acumulado de até 470 milímetros na capital paulista, abaixo da média histórica de 488 milímetros para o período.

Para o secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente do governo estadual, Marcos Penido, essas previsões são imaturas. "Trabalhamos junto com a ANA a previsão [de chuvas] mais refinada que é de até 60 dias, e para os próximos dois meses não vai ter oferta menor do que a demanda", disse.

Há cerca de 45 dias, foi criada uma força-tarefa no governo estadual, comandada pelo vice-governador Rodrigo Garcia (PSDB), para analisar o impacto da seca extrema que se instalou no estado.

O monitoramento das chuvas e situação dos reservatórios passou a ser diário e feito em conjunto com representantes da Sabesp, da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), do Daee (Departamento de Águas e Energia Elétrica) e das secretarias de Infraestrutura e Meio Ambiente e de Agricultura e Abastecimento,.

De acordo com Penido, a preocupação com a falta de chuvas fez o governo elaborar e lançar em duas semanas um programa de abastecimento de água para 260 cidades paulistas que não são atendidas pela Sabesp. "O programa foi incentivado pela estiagem deste ano percebida a partir de janeiro, quando a chuva começou a ser menor", diz.

Ao anunciar o programa, que prevê a perfuração de poços em 120 municípios e obras de desassoreamento em rios, no dia 7 de outubro, o secretário discursou e reconheceu o cenário de crise hídrica no estado, embora tenha afirmado depois que sua declaração foi em relação apenas às cidades que não integram o sistema de abastecimento da Sabesp.

"Crise hídrica é um jargão para falar que estamos vivendo uma estiagem severa", disse sobre seu discurso. "Nenhum município ligado ao sistema Cantareira, Alto Tietê e Rio Grande, que abastecem a região metropolitana de São Paulo, enfrenta problema de abastecimento", continuou o secretário.

​O presidente da Sabesp, Benedito Braga, também tem negado reiteradamente que há previsão de crise de abastecimento na região metropolitana. Segundo ele, não há perspectiva de falta de água até o final da primavera e início do verão. "Se tivermos um verão seco, vamos ter que adotar soluções mais restritivas", disse em entrevista à Folha no dia 1º de outubro.

Em nota, a Sabesp informou que "a projeção aponta níveis satisfatórios dos reservatórios com as perspectivas de chuvas do final da primavera e início do verão, quando a situação será reavaliada". Segundo a empresa, não há risco de desabastecimento neste momento na região metropolitana.

"Comparando-se os índices pluviométricos atuais e os da crise hídrica de 2014, particularmente no Sistema Cantareira, é possível verificar que o cenário atual é diferente. A escassez de chuvas neste sistema em 2014 foi mais aguda. A previsão do tempo lida com questões complexas, o que dificulta prognósticos a médio e longo prazo", afirmou a empresa.

O governo de Minas Gerais anunciou no dia 5 de outubro medidas de enfrentamento à crise hídrica prevista devido "ao baixo índice de precipitação no último período chuvoso (de outubro de 2020 a março de 2021), considerada abaixo da média histórica em quase todo o estado, e que exige medidas para minimizar os impactos da seca".

Na ocasião, o governo mineiro publicou duas portarias em que reconheceu a escassez hídrica nas regiões metropolitana e central de Belo Horizonte.

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