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Sensação de insegurança cresce, e moradores de SP usam Whatsapp para tentar se proteger

Em grupos, vizinhos de bairros do centro e das zonas leste e oeste compartilham vídeos de roubos e informações

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São Paulo

A sensação de insegurança tem dominado conversas entre moradores da capital paulista. Seja em grupos de Whatsapp ou em páginas de redes sociais que reúnem informações sobre bairros, multiplicam-se os vídeos de câmeras mostrando episódios de violência, ampliando o medo de ser a próxima vítima.

O temor cresceu desde o ano passado, conforme foram sendo flexibilizadas as regras de quarentena. A capital teve aumento de 10% nos roubos em geral, em janeiro, (de 10.739 para 11.846) em 2022 ante o mesmo período de 2021. Nos furtos em geral, a alta foi de 23,4% (de 13.148 para 16.231); nos furtos de veículo, de 21% (de 2.323 para 2.817). Já os roubos de veículos tiveram queda de 10% (de 1.216 para 1.093). A cidade ainda registrou queda nos homicídios (de 66 para 56).

Suspeito é abordado pela PM após supostamente tentar roubar um celular de dentro de um carro em Capão Redondo
Suspeito é abordado pela PM após supostamente tentar roubar um celular de dentro de um carro em Capão Redondo, zona sul paulistana - Mathilde Misisoneiro - 16.fev.22/Folhapress

O investimento em segurança particular, incluindo câmeras de monitoramento, aliado ao abandono da região central, principalmente após o início da pandemia, amplia a impressão da escalada de violência, explica Dennis Pacheco, pesquisador do FSBP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública).

A sensação de insegurança ainda é agravada, segundo ele, pelo compartilhamento de imagens e relatos de crimes. Isso reforça a ideia do morador de que, a qualquer momento, ele será o próximo alvo dos ladrões.

Carlos Alexandre de Oliveira, diretor de relações de governo da Associação Viva Leopoldina, na zona oeste, mudou a rotina após ver vídeos e tomar conhecimento de roubos e sequestros-relâmpagos cometidos por criminosos em motos que se passam por entregadores de aplicativos.

"Só saio de casa durante o dia e para locais essenciais, como farmácia e mercado, com estacionamento iluminado. Vou sem relógio e evito usar o celular em lugares abertos", afirma Oliveira.​

Dados do 91º DP (Ceagesp), responsável pela Vila Leopoldina, mostram que em janeiro foram registrados 35 roubos, contra 36 em 2021 e 65 em 2020, antes do início da pandemia.

Segundo Rafael Alcadipani, professor da FGV (Fundação Getulio Vargas) e membro do FBSP, há uma grande subnotificação desse tipo de crime em razão da burocracia para o registro das ocorrências na polícia. "O sistema é muito burocrático, e a Polícia Civil conta com problemas estruturais e de efetivo. Falta eficiência do Estado".

A sensação de insegurança também muda hábitos de quem mora na região central da cidade. Affonso Celso, síndico do Copan, diz usar o celular somente em "ambientes controlados", com receito de ser vítima dos criminosos que costumam circular de bicicleta pelo bairro para roubar os aparelhos.

A Folha revelou em fevereiro que a região da República lidera o ranking de roubos de celular na cidade.

Os moradores do edifício compartilham vídeos de roubos e informações de possíveis suspeitos dos crimes em um grupo de mensagens, segundo o síndico.

De tanto acompanhar episódios de violência por meio do grupo e presenciar alguns casos, a publicitária Pollyana Mattos, 38, que morou por dez anos no Copan, mudou-se para Atibaia (64 km da capital).

"Me mudei com dor no coração, pois amo o centro de São Paulo. Mas, neste momento, não dá para morar lá nem na cidade como um todo, por causa da insegurança", desabafou. "A gota d'água foi quando vi, há uns sete meses, um rapaz sendo esfaqueado por um grupo de bicicleta. Quando isso aconteceu, decidi voltar para o interior", completou.

No bairro vizinho, Santa Cecília, moradores resolveram se mobilizar e colocar faixas na rua Helvétia contra a retirada de uma base móvel da Polícia Militar que ficava na via que dá acesso à cracolândia. Desde a retirada da base, em 28 de dezembro, arrombamentos de comércio e assaltos são constantes, de acordo com relato de moradores, que testemunham a violência de suas janelas —muitas vezes gravando vídeos.

"Por que a base foi retirada do local, sem nenhum aviso prévio? Desde que ela foi instalada na região, dava para caminhar com mais tranquilidade", diz Iezio Silva, presidente da associação de moradores do bairro.

A divulgação de imagens e informações a respeito de crimes também tem mudado a rotina de bairros de alto padrão. No Morumbi, zona oeste, pais de alunos andam sempre alertas após relatos de roubos no entorno das escolas.

No mais grave deles, o autônomo Valdemir de Jesus Mota, 46, morreu 14 dias depois de ser ferido a tiros em frente à Escola Mais, no Morumbi, por criminosos que tentaram roubá-lo quando ele deixava o filho.

Policiais socorrem autônomo de 46 anos baleado na frente da escola onde havia acabado de deixar o filho, no Morumbi, zona oeste de São Paulo - Reprodução - 17 fev.22/Redes Sociais

O 89º DP (Portal do Morumbi) investiga o caso, ocorrido em fevereiro, mas ainda não identificou a dupla envolvida no crime. A Folha esteve no local no dia 7 e constatou que, agora, há uma empresa de segurança particular atuando no entorno da escola.

O cobrador Lucimário Nogueira, 33, disse sentir-se inseguro nos pontos e dentro dos ônibus, onde afirma serem constantes os arrastões. "Entram dois ladrões junto com os passageiros. Quando as portas se fecham, eles anunciam o roubo e fazem a limpa em todo mundo. É pobre roubando pobre", disse.

Na Mooca, zona leste de São Paulo, o compartilhamento de informações entre moradores assumiu ares profissionais. Além de vídeos, vizinhos trocam mensagens sobre atitudes suspeitas. Chamado de Vigia Mooca, o sistema criado em 2018 conta com cerca de 5.000 pessoas, divididas em 80 grupos que monitoram e recebem informações gratuitamente.

Há ainda 50 câmeras espalhadas pelo bairro. A entrada nos grupos é gratuita, mas, para ter acesso às imagens, é cobrada uma mensalidade de R$ 50. "O sistema deixa as pessoas mais seguras. Qualquer problema identificado é avisado nos grupos, que alertam sobre possíveis riscos", explicou o idealizador do projeto, o publicitário Daniel Rodrigues Santiago, 38.

Polícia afirma que ampliou ações preventivas

A Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirma que amplificou as ações preventivas e ostensivas de policiamento, "em diferentes regiões da capital". Entre elas, destaca a operação Hércules, que visa coibir roubos, principalmente os realizados com o uso de motos.

Desde o último dia 9, a SSP afirma que policiais atuam em Moema e no Brooklin, ambos na zona sul. Desde então, oito suspeitos foram presos. A pasta acrescentou que é preciso considerar a "atipicidade" de 2020, quando foi decretada a pandemia da Covid-19, para considerar as estatísticas criminais na cidade.

Nenhuma atualização sobre os casos mencionados nesta reportagem foi encaminhada.

Sobre os sequestros-relâmpagos na Vila Leopoldina, Bortoni, presidente do Conseg (Conselho de Segurança) local, afirmou que o bairro sofreu no mês passado "com denúncias infundadas de sequestro-relâmpago", e que tais suspeitas foram desmentidas tanto pela PM como pela Polícia Civil.

Sobre a retirada da base da rua Helvétia, a PM afirmou que a medida foi tomada após um estudo indicar que o policiamento preventivo, com uso viaturas, é mais eficiente na região.

O Ifood, cujo material —como baú e colete— é usado por alguns motociclistas que aparecem em vídeos cometendo crimes, informou, por meio de nota, que verifica os documentos e antecedentes criminais dos entregadores no ato do cadastro, o que inclui o reconhecimento facial.

A empresa afirmou que está à disposição das autoridades e, caso seja confirmado que algum dos seus colaboradores esteja envolvido em alguma ocorrência, "as providências cabíveis serão tomadas imediatamente."

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