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Enfermeira que deixou chefia para ir à linha de frente na pandemia é premiada na Alemanha

Mônica Batista Teixeira recebeu o prêmio Heroínas da Saúde pelo trabalho contra a Covid no Amazonas

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São Paulo

Em meados de janeiro de 2021, o estado do Amazonas atravessava o seu pior momento na pandemia da Covid-19, em que pacientes morreriam até por falta de oxigênio. Foi nesse cenário que Mônica Batista Teixeira, gerente da rede de doenças crônicas do estado, precisou deixar o trabalho de apoio técnico na equipe de gestão de lado e voltar às origens como enfermeira, com o objetivo de salvar vidas.

O trabalho de Mônica foi reconhecido internacionalmente. Ela foi uma das vencedoras do prêmio Heroínas da Saúde, promovido pela organização internacional WGH (Women in Global Health). A premiação ocorreu em outubro, durante a Cúpula Mundial da Saúde, em Berlim.

"A oncologia me preparou, me fez mais forte, mas posso afirmar categoricamente que nenhum profissional de saúde estava pronto ou imaginava viver o que a gente viveu na pandemia. Foi tudo muito difícil, parecia que estava no meio de um tiroteio", diz a servidora.

A brasileira de 42 anos foi premiada ao lado de outras 16 profissionais de saúde de outros países que atuaram em diversas áreas da medicina. A cerimônia contou com a participação do diretor-geral da OMS (Organização Mundial da Saúde), Tedros Adhanom Ghebreyesus, e outras autoridades. Desde sua criação, em 2017, a WGH premiou 53 mulheres profissionais de saúde.

Imagem colorida mostra duas mulheres brancas, da cintura para cima; à esquerda está Mônica, de vestido verde, segurando um certificado; ela é uma mulher branca, usa um vestido verde e tem cabelo na altura dos ombros. Ela está com a cabeça encostada em Fernanda Maria, ex-presidente da Assembleia Geral da ONU; ela é uma mulher branca, de cabelo ruivo na altura dos ombros, usa óculos e um vestido florido com tom roxo.
Mônica Batista Teixeira (esq.) recebeu o certificado de Fernanda Maria Espinosa, ex-presidente da Assembleia Geral das Nações Unidas, durante a entrega do prêmio Heroínas da Saúde, em Berlim - Steffen Kugler/WGH

"Ouvi relatos incríveis de outras mulheres, saí de lá engrandecida. São mulheres com histórias muito parecidas com a minha. Que são chefes de família, que não hesitam sair de casa, correndo risco para salvar outras famílias. É mágico."

O trabalho da servidora foi descoberto pela WGH por meio de entrevistas em universidades da região Norte, a mais atingida pela pandemia. "Um amigo da Uninorte falou que a representante da ONG estava procurando histórias. Ele deu o meu nome e o de outras três colegas de trabalho. Pediram relatos nossos e tive a honra de ter sido escolhida."

Mônica entrou no serviço público em 2006. Desde então, especializou-se na enfermagem em obstetrícia, saúde da mulher e oncologia. Estava trabalhando na área de gestão da Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas, quando foi convocada, junto com outros profissionais, para auxiliar nos trabalhos de combate à Covid.

"Sabíamos que em algum momento iríamos para a linha de frente, mas imaginávamos que seria para o hospital. Mas fomos informados que nosso sistema de saúde havia entrado em colapso. Então não tinha outra saída, a missão que a gente tinha era levar pacientes para outros estados", diz a servidora, que passou a trabalhar na parte operacional de preparo dos aviões que fariam o transporte dos pacientes.

Enquanto Mônica e a equipe preparavam o avião, um outro grupo formado de médicos e do serviço social fazia a triagem de pacientes que seriam transferidos.

"A princípio nós levaríamos 70 pacientes para outros estados, mas a missão durou três meses e nós acabamos levando quase 900. Foram cerca de 40 voos e conseguimos salvar quase 90% das pessoas que não teriam a menor chance se tivessem ficado em nosso estado", diz Mônica, que chegou a viajar em alguns voos.

"No primeiro voo eu estava lá, mas na maior parte do tempo meu trabalho foi preparar o avião. Quando falavam que tinham pacientes, íamos às unidades de saúde buscar os equipamentos, montávamos tudo com o material necessário caso fosse preciso entubar o paciente ou reanimá-lo."

A pior parte, segundo a servidora, era quando perdia algum colega de trabalho para a Covid. "Não podia velar um amigo, socorrer a esposa dele. Não tinha tempo para chorar."

Antes da chegada da Covid, a servidora já havia enfrentado outro momento complicado. Em 2016, ela perdeu o marido, Max Teixeira Júnior, vítima de um infarto, aos 45 anos. Desde então, passou a cuidar sozinha da filha, hoje com oito anos.

Na véspera de entrar na linha de frente do combate à Covid, ela viu um tio de 75 anos, irmão de seu pai, morrer por falta de oxigênio. "Ele morreu porque não tinha um aparelho de respirador dentro do hospital. Talvez se tivesse ele poderia ter sobrevivido. E foi dentro da rede privada, imagine como estava a rede pública naquele momento."

Segundo Mônica, o fato de ser viúva e ter perdido o tio para o coronavírus aumentaram a preocupação da família. "Quando eu soube da missão e liguei para o meu pai, ouvi o grito dele dizendo que eu não poderia fazer aquilo, que a minha filha já havia perdido o pai dela", diz a servidora.

"Não tinha como me esquivar, estudei para isso. Sou apaixonada pela minha profissão. Todo enfermeiro do estado ou estava em linha de frente ou estava acamado no hospital."

Durante o trabalho, ficou longe da família por cerca de três meses, com medo de transmitir a Covid. O contato era apenas visual, de longe, da varanda da casa dos pais. Mas ela diz que o esforço foi recompensado.

"Falo que tenho um trato com Deus: toda vez que vou trabalhar, digo ‘meu Deus, cuida dos meus que vou cuidar dos seus’. E a gente sempre cumpriu bem o nosso trato."

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