Empresário e dona de joalheria são suspeitos de agressão a jornalistas no litoral de SP

OUTRO LADO: Citados em inquérito não responderam; advogado que aparece em imagens diz que foi exposto injustamente e que apartou discussão

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São Paulo

A Polícia Civil de São Paulo identificou parte dos moradores de um condomínio de luxo de Maresias, em São Sebastião, suspeitos de agredir uma equipe do jornal O Estado de S. Paulo durante a cobertura dos estragos provocados pelas chuvas no litoral norte durante o Carnaval.

Até agora, segundo a polícia, o inquérito cita cinco pessoas: três são delas apontadas como possíveis agressores e outras duas são condôminos que teriam tentado "cessar o conflito".

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Homem de camiseta preta apontado em inquérito como Carlos Eugênio Moraes, 52, investigado como um dos supostos agressores de jornalistas; ele é segurado pelo advogado Marcelo Kiyoshi Harada, 42 - Tiago Queiroz/Estadão

Na lista dos supostos agressores estão Marcelo Elmôr, 55, industrial do ramo de peças automobilísticas, Carlos Eugênio (Geo) Moraes, 52, empresário do setor de tecnologia, e Anita Adams Klein, 43, sócia de uma joalheira na rua Oscar Freire, região nobre da capital.

Entre os relacionados pela polícia como participantes do episódio, mas não como agressores, está o advogado Marcelo Kiyoshi Harada, 42. O nome da quinta pessoa não foi informado.

Procurados pela Folha desde a última quarta (1º), nenhum dos supostos agressores se manifestou até a publicação deste texto. A reportagem mandou para todos email e mensagens por celular (parte visualizada, mas não respondida), além de tentar falar por meio de ligações telefônicas.

Os moradores devem ser ouvidos nos próximos dias, segundo o delegado do caso, Alexandre Bertolini. Harada apresentou advogado e se comprometeu a comparecer para prestar esclarecimentos. A polícia investiga suposto constrangimento ilegal, vias de fato e injúria.

Os policiais puderam identificar os supostos envolvidos porque as próprias vítimas, assim como os policiais, receberam ligações e mensagens de pessoas que conhecem o grupo, incluindo outros moradores do condomínio.

Os investigadores não conseguiram imagens do circuito de segurança. A informação recebida foi a de que as câmeras não estavam funcionando em razão das chuvas.

Ficha mostra foto 3x4 e dados básicos do suspeito
O industrial Marcelo Elmôr, apontado em inquérito policial como um dos suspeitos de participarem das agressões à equipe do jornal O Estado de S. Paulo - Reprodução de inquérito policial

Conforme registro policial, a repórter Renata Cafardo e o fotógrafo Tiago Queiroz participavam da cobertura das tragédias de São Sebastião no último dia 21. Quando registravam imagens e tentavam ouvir moradores do condomínio Villa de Anoman, em Maresias, também afetados pelas enchentes, os dois profissionais foram cercados por um grupo.

Ainda conforme o boletim de ocorrência, esses condôminos já chegaram agressivos, questionando a qual veículo de comunicação pertencia a equipe. Ao ouvirem o nome do jornal, segundo o registro, passaram a xingar palavrões como "jornal de merda", "comunista" e "esquerdista".

Não adiantou, segundo o fotógrafo, a informação de que ele havia entrado no local com autorização de funcionários. O boletim narra que parte do grupo cercou a repórter que estava do lado de fora do condomínio, e outra parte, o fotógrafo que tentava deixar o condomínio.

Em dado momento, ainda segundo a versão das vítimas, as pessoas que agrediam verbalmente Cafardo se juntaram ao grupo que agredia Tiago Queiroz, com empurrões e tentando arrancar-lhe a câmera fotográfica. O profissional foi forçado a apagar todas as imagens feitas no condomínio.

O mais violento era, segundo as vítimas, Carlos Eugênio Moraes. Foi ele quem teria tentado retirar a máquina e o crachá de Queiroz e dado uma chave de braço para tentar imobilizar o repórter fotográfico. "Ele repetiu várias vezes: ‘vou quebrar sua câmera, vou quebrar sua câmera, você não está entendendo’. Achei que fosse quebrar mesmo", diz Queiroz.

Tentando dar fim à agressão ao colega, que ainda estava cercado pelos moradores, Renata Cafardo empunhou o celular e avisou ao grupo que estava gravando a violência. Foi nesse momento, ainda segundo a versão dos jornalistas, que Marcelo Elmôr partiu para cima da repórter.

Ficha mostra foto 3x4 e dados básicos da suspeita
A empresária Anita Adams Klein, apontada em inquérito policial com uma das pessoas suspeitas de participarem das agressões à equipe do jornal O Estado de S. Paulo - Reprodução de inquérito policial

Queiroz passou a fotografar os moradores quando isso aconteceu.

A Folha encaminhou aos jornalistas imagens de Elmôr, que estão em poder da polícia, e ambos confirmaram ser ele o homem que teria agredido Cafardo.

"Reconheço Marcelo Elmôr como o homem que me xingou, depois tentou tirar a força o celular da minha mão. Ao não conseguir, me empurrou para uma área alagada", disse a repórter, em resposta à Folha.

Ainda segundo ela, o empresário só não continuou com as agressões porque foi impedido por um ciclista que passava pelo local. "Como declarei à polícia, depois disso [do ataque de Elmôr], ouvi gritos de alguém dizendo: ‘você vai bater na menina?’. Um ciclista não identificado que passava o segurou, como mostram as fotos publicadas no Estadão", relata a repórter.

Outro que aparece nas imagens segurando um dos agressores é o advogado Harada. Segundo o repórter fotográfico, ele não teve apenas participação de "cessar o conflito", como declara.

"[Harada] parece que está apartando, mas até aquele momento [em que Cafardo diz estar gravando] ele estava inflamando o colega dele. Também estava me coagindo a apagar as fotos, entendeu? Na foto, parece até um popular que está me ajudando", afirma.

"É uma agressão sem tamanho para um repórter fotográfico ser obrigado a apagar suas próprias imagens", finaliza Queiroz.

Advogado diz ter sido surpreendido com investigação

A reportagem tentou falar com todos os citados, mas só conseguiu contato com Harada. O advogado disse à Folha que está muito triste com o ocorrido e que foi exposto injustamente. "Não tive nada a ver com a discussão. Apenas apartei a discussão", afirma.

O advogado dele, Érico Della Gatta, diz que seu cliente deveria ser considerado até como herói porque, geralmente, as pessoas não querem se envolver para tentar defender quem precisa, como ele fez.

Gatta diz que, ao tomar conhecimento do inquérito aberto pela Polícia Civil para apurar as agressões contra a equipe de O Estado de S. Paulo, ele orientou Harada a registrar um boletim de ocorrência.

No documento, agora anexado ao inquérito, Harada narra que estava reunido com outros condôminos para discutir medidas de urgência para resolver os alagamentos. Diz que viu uma "brusca invasão de um desconhecido" que "teria se aproveitado do portão aberto".

"[Ele] entrou correndo, deixando todos nervosos, imaginando ser um criminoso. Questionado, disse que estava tirando fotos. Um condômino pediu que as deletasse pois ele não tinha autorização para entrar e [que] saísse da área particular", relatou o morador, conforme trecho do documento.

Diz ainda que, do lado de fora, observou que uma mulher, que também havia "indevidamente ingressado ao local" —que seria Renata Cafardo. "Pediram que ela saísse e houve 2 pequenas discussões, uma de um condômino com a repórter, e outra de um condômino com o fotógrafo", diz trecho do documento.

"Eu e mais 4 condôminos, todos fora das 2 situações, notamos um desentendimento mais caloroso com o fotógrafo, e de imediato retirei o condômino da discussão. Após, ele tirou mais fotos, onde é nítido que eu só estava apartando a confusão, sem dirigir ofensa a ninguém, como todos viram. Para minha surpresa, fui comunicado sobre o IP [inquérito] e 3 crimes, em decorrência de falsas acusações contra mim", diz.

A jornalista e o fotógrafo afirmam que apenas Queiroz entrou no condomínio, embora ambos tivessem recebido autorização de funcionários, e que Cafardo ficou na calçada. O fotógrafo nega que tenha entrado bruscamente e acrescenta que tinha crachá de identificação.

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