Descrição de chapéu Quilombos do Brasil violência

Após morte de Mãe Bernadete, Incra notifica ocupantes de quilombo na Bahia

Titulação das terras pelo órgão era uma das reivindicações da ativista assassinada; filho diz que não houve consulta e questiona critérios

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Salvador

O Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) publicou nesta quarta-feira (24) no Diário Oficial da União edital com a notificação dos 44 proprietários ou ocupantes identificados dentro do Quilombo Pitanga dos Palmares, onde morava a líder Maria Bernadete Pacífico, assassinada na quinta-feira (17) no terreiro que comandava na Bahia.

Jurandir Wellington Pacífico, 42, filho de Mãe Bernadete, diz que a medida foi feita sem consultar a comunidade e questionou os critérios do órgão. "O Incra notificou pessoas que eles não sabem se são quilombolas ou não. O Incra tomou uma decisão aleatória", diz.

A notificação foi feita somente após a morte da ativista, no entanto, o problema da titulação das terras e tentativa de ocupação indevida do quilombo por empreendimentos é antigo. A questão era uma das pautas mais fortes levantadas por Mãe Bernadete e pelo Quilombo Pitanga do Palmares.

Três mulheres choram ao lado de caixão de Mãe Bernadete
Corpo de Mãe Bernadete é velado Capela de São Gonçalo, na comunidade de Pitanga dos Palmares, na Bahia - Rafaela Araújo - 18.ago.2023/Folhapress

"Eu tenho uma lista com esses ocupantes. Quem mora no lugar é que sabe. Agora, estou em um momento delicado, mas vou ter que ligar para eles [o Incra] para ver qual foi o critério usado. Foi uma decisão arbitrária", afirma Jurandir à Folha.

O líder disse ainda que o órgão não consultou a ele ou a sua família acerca da decisão e que entrará em contato com o governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT), bem como com a presidência do Incra.

No documento, o Incra declara que a notificação via edital foi feita "uma vez que restaram infrutíferas as tentativas de identificação e notificação de todos os ocupantes, proprietários ou não constantes do perímetro do território quilombola de Pitanga de Palmares, localizado nos municípios de Simões Filho e Candeias, estado da Bahia, objeto do processo administrativo".

O edital diz ainda que "faz saber a todos quanto o presente edital virem ou dele conhecimento tiverem, que notifica qualquer interessado, proprietário ou não, dos imóveis situados no referido perímetro", seguido de uma lista de nomes de ocupantes.

O Quilombo Pitanga dos Palmares foi reconhecido pela Fundação Cultural Palmares em 2005, mas o processo de titularização pelo Incra ainda está em tramitação desde 2017, conforme o documento de "Acompanhamento dos processos de regularização quilombola", disponibilizado no portal do instituto.

Com relação ao motivo da retomada do processo apenas após a morte de Mãe Bernadete, o instituto respondeu que a etapa não havia sido concluída anteriormente em virtude de fatores como a dificuldade de atuação dos servidores em campo —não apenas por questões associadas à pandemia, como restrições orçamentárias impostas à política de regularização dessas áreas.

Ainda segundo o órgão, o Incra iniciou a fase de notificação de proprietários e posseiros identificados no território ainda em 2017, quando os editais com o resumo do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) da comunidade Pitanga de Palmares —fase inicial do processo de regularização das terras— foram publicados no Diário Oficial da União.

Com a retomada do processo neste ano, frente às dificuldades de se proceder à notificação pessoal no território, a autarquia decidiu pela publicação da notificação em edital, abrindo o prazo de 90 dias para contestações. Ao fim, o processo será encaminhado para a publicação da Portaria de Reconhecimento do Incra.

Em seguida, os imóveis rurais inseridos no território são declarados de interesse social. Com isso, há abertura dos processos de desapropriação dos imóveis identificados, com a finalidade de titular coletivamente as famílias remanescentes de quilombo do Pitanga de Palmares.

Ainda na resposta, o órgão informou que serão abertos processos de arrecadação de terras públicas e processos de desapropriação de propriedades privadas.

O projeto Quilombos do Brasil é uma parceria com a Fundação Ford

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