Com mato alto, buracos e escorpiões, São Paulo tem recorde de reclamações

OUTRO LADO: Gestão Nunes diz que alta 'é resultado da confiança do munícipe na prestação de serviços'

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Moradora passa em frente a terreno com mato alto na zona oeste Danilo Verpa/Folhapress

São Paulo

Os escorpiões começaram a aparecer dentro da casa da manicure Elaine Carvalho, 47, há cerca de um ano. Eles vinham acompanhados de ratos e aranhas de um terreno baldio no Butantã, na zona oeste de São Paulo, que está tomado pelo mato.

Em fevereiro do ano passado, o cachorro de uma vizinha de Carvalho foi picado por um escorpião e morreu. Os moradores estão assustados com o risco que as pragas trazem para crianças, idosos e animais de estimação, mas também cansados de verem ignoradas várias reclamações à prefeitura.

"Não só no nosso bairro, mas em qualquer bairro a prefeitura deveria ter um controle para, a cada dois ou três meses, cortar o mato. Mas eles não fazem isso", conta a manicure. Ela diz que homens do serviço de capinagem só aparecem quando a vizinhança chama a imprensa para visitar o local.

O Butantã está entre os bairros com maior número de queixas relacionadas à falta de manutenção em ruas, calçadas, terrenos e parques. As reclamações sobre zeladoria e limpeza aumentaram em toda a cidade de São Paulo em 2023.

Queixas sobre buracos no asfalto, deformações em calçadas e postes, falhas na iluminação pública, veículos abandonados, árvores precisando de poda, lixo e enchentes tiveram maior volume de janeiro a outubro, segundo os dados da própria prefeitura.

A gestão Ricardo Nunes (MDB) diz que houve um "aumento expressivo no atendimento às demandas" e que o crescimento da quantidade de solicitações "é resultado da confiança do munícipe na prestação de serviços", além de mais publicidade para o SP 156. Afirma, ainda, que os números do portal incluem repetições de chamado para a mesma ocorrência.

Cratera no asfalto da rua Jaguaribe, em Santa Cecília, na região central de SP; cidade teve aumento de reclamações sobre zeladoria e limpeza ao longo de 2023 - Danilo Verpa - 19.dez.2023/Folhapress

No caso do terreno do Butantã, moradores dizem que a própria prefeitura já fez a manutenção do local, que está às margens de um córrego. Já a administração municipal afirma que o espaço é particular e que notificou o proprietário.

Após o contato da Folha, no fim de dezembro, a subprefeitura do Butantã enviou uma equipe ao local para orientar os vizinhos sobre controle de pragas.

Em toda a cidade, foram mais de 10 mil reclamações em nove categorias relacionadas a zeladoria e limpeza pública, segundo relatórios da Ouvidoria-Geral do Município. É o volume mais alto desde 2017, quando o órgão passou a utilizar o mesmo padrão para catalogar algumas demandas utilizadas no levantamento desta reportagem —passou a separar queixas relacionadas a buracos no asfalto daquelas relacionadas a reparos em calçadas, por exemplo.

O volume de reclamações é 56% mais alto em relação ao ano de 2019, anterior à pandemia, quando o então prefeito Bruno Covas (PSDB) estava no mesmo momento do mandato de Nunes–terceiro ano de gestão, véspera da disputa pela reeleição.

Entre as 32 subprefeituras da cidade, o Campo Limpo, na zona sul, foi a campeã de demandas relacionadas à falta de zeladoria, segundo o portal SP 156, canal oficial da prefeitura para diversos serviços. O problema com asfalto e pavimentação em geral é motivo do maior número de demandas à prefeitura.

Os números do portal SP 156 e da Ouvidoria-Geral do Município são diferentes pois atendem necessidades diferentes. No SP 156, por meio do aplicativo ou atendimento telefônico, os cidadãos podem pedir algum serviço, como reparos no asfalto.

Já a Ouvidoria compila as reclamações, elogios, denúncias, sugestões e pedidos de providência em relação a algum pedido —ou seja, é acionada quando um cidadão avisa que algum serviço não foi feito. Dessa forma, os registros no portal 156 são muito mais numerosos.

No Campo Limpo, em dez meses, foram mais de 17 mil pedidos no SP 156 relacionados a melhorias no pavimento, em calçadas, na sinalização, na manutenção de pontes e viadutos, na drenagem de água da chuva e na capinação de terrenos baldios. Isso equivale a quase 60 solicitações por dia.

Lixo acumulado na avenida Comendador Sant'Anna - Danilo Verpa/Folhapress

O lider comunitário Claudio Freitas, 51, diz que a região está abandonada. "Recebo muita reclamação dos moradores, infelizmente, e quando ando pelo bairro, misericórdia. É buraco em cima de buraco, mato com mais de dois metros de altura, tem até mini-lixão", ele conta. "A subprefeitura nada faz e nada fez, infelizmente."

Em um ano, o número de reclamações relacionadas a buracos em ruas e avenidas, segundo relatórios da Ouvidoria, dobrou em toda a cidade. Isso ocorre ao mesmo tempo em que a prefeitura executa um programa de recapeamento que custa mais de R$ 1 bilhão aos cofres municipais.

Uma vistoria feita por auditores TCM (Tribunal de Contas do Município) mostrou, em setembro, que há falhas no serviço da operação Tapa-Buraco, com alto grau de degradação do asfalto aplicado e falta de preparação dos locais para os reparos.

Um exemplo ocorreu no mês passado no centro da cidade. Uma cratera com mais de um metro de diâmetro se abriu na rua Jaguaribe na mesma semana em que o local havia sido recapeado. A prefeitura afirma que o solapamento do asfalto ocorreu por causa de uma obra da Sabesp.

Entre 11 categorias diferentes relacionadas a zeladoria e limpeza, a reclamação que mais cresceu na cidade em quatro anos é relacionada à iluminação pública. De janeiro a outubro de 2019, houve um total de 79 queixas registradas pelo órgão por luzes piscando nos postes, apagadas ou com iluminação fraca. No mesmo período de 2023, foram 698, um crescimento de 783%.

Durante todo esse período, a iluminação pública da capital foi administrada por meio de uma PPP (Parceria Público-Privada). A Folha mostrou, em novembro, que houve um atraso na entrega de um sistema de gestão digital capaz de monitorar, em tempo real, cada poste de luz e se comunicar com cada lâmpada.

A piora nas reclamações também ocorre após a Prefeitura de São Paulo alcançar um recorde de dinheiro guardado. Segundo o último balanço divulgado pela administração municipal, em novembro, havia R$ 31,7 bilhões em caixa –valor que só é superado pelo que havia no ano anterior, com R$ 2 bilhões a mais.

Prefeitura diz que aumentou atendimento a queixas

Questionada, a prefeitura disse que aumentou o atendimento a reclamações dos cidadãos enviadas através do SP 156 e outros canais. Nos últimos três meses, segundo a administração, "o atendimento da Operação Tapa-Buraco foi maior que o número de solicitações via SP 156".

A gestão municipal diz que o portal teve 34 mil solicitações abertas por buracos no asfalto e mais de 47 mil finalizadas, o que significa atender reclamações que estavam ativas em meses anteriores. A prefeitura diz que neste ano foram tapados mais de 215 mil buracos, "o que representa um aumento de 61% em relação ao ano inteiro de 2022".

"Em 2017, São Paulo chegou a ter, em estoque, mais de 68 mil pedidos de tapa-buraco. Hoje a cidade tem cerca de 10 mil solicitações", afirma.

A prefeitura também afirma que aumentou o número de serviços relacionados a poda de árvore e manutenção de guias e sarjetas, e que e que reduziu o tempo médio de atendimento para serviços de varrição nos últimos sete anos, de 400 para 2 dias de espera.

Sobre a iluminação pública, a administração municipal diz que "o portal 156 não recebe reclamações do serviço de Iluminação Pública, mas sim informa sobre os procedimentos de solicitação de manutenção".

A gestão Nunes informou, ainda, que neste ano fez o corte de 137 milhões de metros quadrados de áreas com grama ou mato alto, limpou 2 milhões de metros de córregos em toda a cidade (recolhendo 206 mil toneladas de sujeira), além de mais de 124 mil bocas de lobo e 23 mil poçõs de visita (bueiros) e concluiu obras em 61 pontes e viadutos, com outras 47 em andamento.

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