PPP da iluminação em SP teve atraso de sistema que pode auxiliar no apagão

OUTRO LADO: Concessionária diz que atraso ocorreu por motivos alheios à sua vontade, e prefeitura diz que não houve prejuízo

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São Paulo

A empresa Ilumina SP, que administra a iluminação pública da cidade de São Paulo há cinco anos, atrasou a entrega de um sistema de telegestão dos postes de luz e de um Centro de Controle e Operações previstos em contrato com a prefeitura.

As melhorias poderiam auxiliar na resposta ao temporal que deixou 2,1 milhões de imóveis sem energia em toda a região metropolitana na semana passada, pois a intenção é que servissem para identificar falhas em tempo real. A cidade voltou a sofrer com o problema na noite de quarta (15) e nesta quinta (16), após novas chuvas.

Pelo contrato, a concessionária deveria modernizar 10% dos pontos de iluminação pública no primeiro ano, isto é, até agosto de 2020. Isso incluiria, obrigatoriamente, um sistema de gestão digital capaz de monitorar, em tempo real, cada poste de luz e se comunicar com cada lâmpada.

A SMUL (Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento) concedeu à concessionária mais de dois anos extras de prazo para o início do serviço. O sistema só começou a ser implementado em outubro do ano passado.

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Lâmpadas de LED ilumina ciclovia na Vila Olímpia - Ronny Santos - 6.mai.2021/Folhapress

Em nota, a gestão Ricardo Nunes (MDB) ressaltou que o prazo final para entregar a telegestão de toda a rede, previsto para o ano que vem, não foi alterado.

Desde 2018, a iluminação pública da capital é administrada por meio de uma PPP (Parceria Público-Privada) entre a gestão municipal e o consórcio Ilumina SP, formado pelas empresas FM Rodrigues e CLD Construtora, antiga Consladel.

A prefeitura pagará um total de R$ 6,9 bilhões ao longo de 20 anos às empresas para modernizar e gerir a iluminação nas ruas e avenidas da cidade.

A telegestão é um ponto central no contrato da PPP. Segundo a descrição de um documento entregue à prefeitura, que descreve o sistema, ele inclui detecção de anomalias, desligamento e religamento automáticos, controle de fluxo luminoso e medição do consumo de energia. Uma exigência é que o centro de controle possa se comunicar com todas as lâmpadas, podendo controlar inclusive à distância a luminosidade dos postes.

A provedora do serviço de gestão detalha, na apresentação do produto, que é possível programar alertas para todo tipo de anomalia na iluminação: lâmpadas queimadas, acesas durante o dia, apagadas durante a noite, consumo de energia muito alto, variação da tensão elétrica e corte na comunicação com os equipamentos —seja por falha na lâmpada ou queda do fio de energia, por exemplo.

O atraso foi identificado num relatório da Controladoria-Geral do Município em 2021. No documento, órgão apontou que a falta do sistema de telegestão também interfere na medição do desempenho da empresa.

Isso porque uma parte do pagamento feito à concessionária leva em conta o número de lâmpadas acesas e com falhas —quanto maior o número de postes sem luz, menor o pagamento. Sem a medição em tempo real feita pelo sistema, a prefeitura tem menos mecanismos de aferir a qualidade do serviço. O órgão não realizou mais nenhuma auditoria no contrato da iluminação pública desde então.

A Ilumina SP afirmou que os atrasos ocorreram por motivos alheios à sua vontade. Em sua defesa na Controladoria, a empresa apontou, entre outros itens, uma recusa da Enel (concessionária do fornecimento de energia na cidade) em fazer a sua parte na implantação do sistema, a falta de normas sobre telegestão e a pandemia de Covid.

Em nota à Folha, a empresa disse que os atrasos ocorreram após o sistema precisar ser homologado pelo Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia) e obter autorização da Enel para sua implementação.

Procurada pela reportagem na sexta-feira (10), a Enel não respondeu até a publicação deste texto.

A concessionária afirmou, em nota, que "já implantou mais de 300 mil pontos de telegestão, e finalizará a implantação de 100% dos pontos até agosto/2024".

Os 300 mil pontos de iluminação correspondem a cerca de metade dos postes na cidade —são mais de 610 mil lâmpadas. Pelo cronograma original, o sistema já deveria estar disponível em mais de 80% dos postes de luz.

A Controladoria também apontou que a prefeitura teria pago R$ 15,8 milhões a mais à concessionária. O órgão municipal afirma que a Ilumina SP pode ter obtido vantagem financeira com o descumprimento do prazo, já que a prefeitura deveria ter descontado o valor dos pagamentos à empresa.

A prefeitura disse, por meio de nota, que houve uma redução de R$ 84,5 mil por mês no pagamento à concessionária por causa do atraso. "Importante destacar que não houve alteração do prazo máximo de entrega dos pontos de iluminação com a implantação da telegestão", ressaltou. A gestão municipal afirmou ainda que não houve prejuízo aos cofres públicos.

A Ilumina SP também contestou o cálculo da Controladoria. Ela afirma que o valor de R$ 15,8 milhões só estaria correto se a entrega do sistema fosse abolida do contrato, o que não ocorreu. A empresa ressaltou à Folha que, desde janeiro de 2022, vem sofrendo descontos de R$ 160 mil por mês, além dos R$ 84,5 mil.

Na prática, mesmo com os descontos a prefeitura acabou aumentando os pagamentos feitos à empresa, por causa dos reajustes feitos com base na inflação do período. Em meados de 2021, quando a punição foi aplicada, a Ilumina SP recebia R$ 35,5 milhões por mês dos cofres municipais. Hoje, a fatura mensal é de R$ 48,1 milhões, mesmo com o desconto aplicado nos repasses e sem o sistema implantado.

A PPP da iluminação pública sofreu uma reviravolta jurídica em maio deste ano. Cinco anos depois de a licitação ser concluída, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiu que a prefeitura deve readmitir o concorrente da Ilumina SP na disputa.

Com isso, a gestão municipal deve analisar o atual estágio de execução da PPP e avaliar se é o caso, ou não, de declarar um novo vencedor. Uma comissão foi instaurada para analisar o caso, mas ainda não há veredito.

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