Descrição de chapéu violência

Derrite privilegia ex-integrantes da Rota em formação da nova cúpula da PM de SP

Para especialistas, a mudança pode ser indicativo de endurecimento na política de enfrentamento no estado

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São Paulo

A nova configuração da Polícia Militar de São Paulo, resultado da troca de 34 coronéis promovida pelo secretário Guilherme Derrite (Segurança), aponta para um possível recrudescimento na política de segurança do estado.

Com as mudanças, os cargos mais importantes da instituição agora são ocupados exclusivamente por coronéis com experiência na Rota.

Para especialistas ouvidos pela Folha, os movimentos do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) indicam uma opção pela força bruta em detrimento da inteligência policial. A gestão afirma que as alterações fazem parte da rotina da PM.

A Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar) é uma tropa de elite da PM paulista que ganhou fama pelo alto índice de letalidade em supostos confrontos com suspeito.

Guilherme Derrite trocou 34 coronéis de uma só vez e abriu crise na PM - Danilo Verpa -23.jan.2023/Folhapress

Na nova PM de Derrite, até mesmo o comandante da Corregedoria tem passado rotariano (como seus membros são conhecidos). Para a função, foi nomeado o coronel Fabio Sérgio do Amaral que estava na Academia Militar do Barro Branco desde o ano passado, em outra troca de coronéis feita por Derrite.

Na lista de ex-Rota, além do próprio comandante-geral da PM, Cássio Araújo de Freitas, que foi mantido no cargo, vêm os coronéis José Augusto Coutinho (nomeado para o subcomando-geral); Valmor Saraiva Racorti (para o Choque); e Gentil Epaminondas de Carvalho Júnior (para a Coordenadoria Operacional).

Carvalho, como é chamado na PM, assume todo o planejamento e emprego de tropa no estado. Torna-se responsável pela organização de policiamentos de eventos como Carnaval, F-1, Operação Verão e visitas de autoridades. Pela importância da função, é considerado o número três da corporação.

A lista de ex-Rota se completa com o coronel Pedro Luís de Souza Lopes. Ele deixa a Assessoria Militar da Secretaria de Segurança, ligada diretamente a Derrite, para comandar o Centro de Inteligência da Polícia Militar. O órgão realiza acompanhamento da conjuntura da criminalidade no estado e do crime organizado.

Lopes, segundo coronéis ouvidos pela Folha, é um dos oficiais envolvidos em escândalo de escutas clandestinas na sede da Corregedoria da Polícia Civil de São Paulo, em 2017. Na época, ele era um dos capitães que trabalhavam na Assessoria Militar do Ministério Público.

Conforme publicações da época, o oficial teria tomado conhecimento que uma sala da Divisão de Operações Policiais da Corregedoria estava grampeada ilegalmente, mas só repassou a informação a superiores dois meses depois. O episódio levou a queda dos capitães da assessoria da Promotoria.

Sobre a investigação envolvendo Lopes, a Secretaria da Segurança diz que o caso foi investigado e arquivado. O oficial não quis comentar o assunto.

"Em relação ao caso citado, ocorrido em julho de 2017, o comando-geral da Polícia Militar adotou as medidas administrativas cabíveis. Todas as circunstâncias relativas aos fatos foram rigorosamente apuradas, sendo o caso arquivado após a conclusão das investigações", diz.

Mudanças geram revolta entre coronéis

A movimentação de 34 coronéis da PM paulista provocou uma crise na cúpula da segurança pública. Oficiais ouvidos pela reportagem afirmaram que tiveram conhecimento das mudanças pelo Diário Oficial, em uma atitude considerada totalmente desrespeitosa com policiais que dedicaram anos na corporação.

Os coronéis disseram ter ficado revoltados com a ação e declararam guerra a Derrite.

Para o coronel da reserva Elias Miler da Silva, diretor legislativo da Federação Nacional das Entidades de Oficiais Militares Estaduais, o episódio envolvendo o alto comando da PM paulista é um caso extremamente grave e prejudica, ao final, o trabalho de segurança oferecido à população.

"Muitos ficaram sabendo pelo Diário Oficial. Você não faz isso com a direção de qualquer órgão, qualquer empresa, pública ou privada. Isso é grave, muito mais numa instituição militar, muito mais. À medida que eu não protejo o alto comando, eu fragilizo toda a instituição. Não é porque é coronel, é porque você desrespeita a direção da instituição", afirmou ele.

O principal alvo do secretário na mudança era o número dois da corporação, o coronel José Alexander de Albuquerque Freixo. Considerado um dos mais respeitados coronéis paulistas, era visto como o principal defensor da PM contra as interferências políticas na instituição e crítico de ações violentas.

Freixo também era considerado um dos defensores do programa de câmeras corporais, dentro de uma política de redução da letalidade da polícia construída ao longo de anos pela PM.

Para o diretor-presidente do Fórum de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, a predileção de Derrite por coronéis oriundos da Rota indica uma política que opta pela força bruta em detrimento do uso da inteligência, desvalorizando, até, a importância dessa tropa "que é muito mais do que força".

"A Rota tem gente muito qualificada, mas que é treinada para ir para cima do problema e enfrentá-lo. A tecnologia pode selecionar melhor onde a Rota poderia atuar e como. Parece que a opção do secretário por enfrentar tudo e todos desconsidera evidências e responde apenas à lógica eleitoral", disse.

O Ouvidor da Polícia, Cláudio Aparecido da Silva, diz ver com preocupação as mudanças na PM, principalmente em "meio a um dos momentos mais agudos na condução da segurança pública em nosso estado", quando a letalidade policial cresce e, especialmente na Baixada Santista, "deixando um alarmante saldo de mais de meia centena de mortos em menos de dois meses".

"Saem os legalistas, entram em seus postos coronéis da Rota. A chave interpretativa para a troca pode estar nas palavras do número dois da corporação, exonerado neste ato, que declara que 'sai com a consciência e as mãos limpas'. Espera-se que os entrantes façam eco a essa ideia de honradez e compromisso com o estado e a nação, e não uma ação entre amigos", disse o ouvidor.

Quanto a mudança dos coronéis, a Secretaria da Segurança diz que a atual gestão "reconhece e valoriza o trabalho dos policiais paulistas" e fala que movimentações de policiais fazem parte de uma rotina.

"Desde o início do ano, uma série de promoções por mérito e movimentações de rotina foi efetivada junto às polícias Civil, Militar e Técnico-Científica do estado. Tais medidas são planejadas e executadas a partir de critérios estritamente técnicos com o objetivo de aprimorar constantemente a atuação policial e reforçar a segurança de toda população", diz a nota.

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