Homem morto com a família no RJ disse a traficante que era PM e pediu para ser chamado de 'demolidor'

Após analisar conversas no WhatsApp, polícia afirma que Filipe Rodrigues tentou enganar líder do Comando Vermelho

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Rio de Janeiro

Mensagens trocadas no WhatsApp por Filipe Rodrigues, morto com a mulher e o filho de 7 meses, no Rio de Janeiro, ajudaram a polícia a identificar os criminosos envolvidos no crime. Segundo a polícia, a vítima disse ser um policial militar do 7º BPM (São Gonçalo) e exigiu dinheiro de traficantes para entregar um suposto informante. E pediu a um chefe do Comando Vermelho para ser chamado de "demolidor".

As mensagens fazem parte da investigação da DHNSGI (Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí) que afirma que Filipe estaria conversando com o traficante Lucas Lopes da Silva, 31, o Naíba. Apontado como chefe do tráfico do morro do Castro, Naíba é considerado foragido.

Trechos de conversa entre Filipe Rodrigues e chefe do tráfico identificado como Naíba, segundo a polícia - Divulgação

Nesta quarta (3), a polícia prendeu um suspeito de envolvimento no ataque que matou a família a tiros no dia 17 de março, em Niterói, na região metropolitana. Segundo a investigação, após Filipe entregar o suposto informante e ter recebido parte do valor combinado, os traficantes teriam descoberto que ele não era quem dizia ser. A vítima trabalhava como gesseiro e motorista de aplicativo e nunca integrou os quadros da Polícia Militar.

De acordo com as conversas, em um primeiro contato, Naíba manda mensagem e diz: "Amigo passo [passou] que você tá com a visão do X [informante]. Nós tá interessado" (sic).

Filipe, então, pergunta qual o valor que eles estão dispostos a pagar. Naíba quer saber como deve chamá-lo, ao que Filipe diz ser do "batalhão" e se identifica como "demolidor". Em outra mensagem, afirma ser soldado da PM.

Na continuação do diálogo, Naíba aponta que pode pagar até R$ 50 mil pela informação. Filipe aceita e pede também uma "peça" (arma). E diz que o valor recebido seria dividido com outros seis PMs.

Após esse contato, as mensagens mostram que Filipe teria feito uma armadilha para o suposto informante, que na sua versão estaria dando prejuízos à quadrilha. Ele fala a Naíba sobre ocorrências com apreensões do tráfico que teriam sido realizadas após informações dadas por essa pessoa à polícia.

O traficante, então, concorda em fazer o pagamento, em parcelas, para ter o nome e a localização do suposto informante. Teria sido Wesley Pires da Silva Sodré, 34, quem teria levado essa pessoa citada por Filipe até os traficantes. Sodré foi preso nesta quarta-feira e ainda não tem advogado.

Homem e mulher seguram bebê que usa chupete e roupa xadrez com tons beges
Casal e bebê foram mortos a tiros no Rio de Janeiro - Arquivo pessoal

O inquérito também mostra como teria ocorrido o rapto do suposto informante pelos traficantes. Ele está desaparecido e, segundo a polícia, possivelmente está morto —o nome dele não foi divulgado.

As mensagens no WhatsApp mostram que Filipe compartilhou a localização em tempo real do homem que seria entregue ao tráfico. A vítima teria subido na garupa de Sodré para uma corrida de mototáxi.

Após a vítima ser raptada, Filipe envia uma série de mensagens exigindo o restante do dinheiro. Naíba responde somente no dia seguinte. Para a polícia, ele já teria descoberto que não falava com um policial. Isso porque há uma mensagem em que ele pergunta se Filipe realmente seria policial e envia um emoji de desconfiança.

Naíba diz para Filipe dormir e afirma que vai pagar a quantia restante. Filipe indaga como teria sido com o X (referência a X-9, informante), e o líder do tráfico é sucinto: "trabalhoso".

"Não temos certeza se ele era ou não informante, não temos como confirmar. O Filipe usou, como parte do convencimento, prints de conversas que seriam desse tal informante, da pessoa que foi entregue. Mas não é possível dizer se de fato ele era informante", afirmou o delegado Willians Batista, responsável pela investigação.

O sequestro da vítima apontada como informante ocorreu numa sexta (15 de março), por volta das 22h. Já no final da noite de domingo (17), Naíba diz que pagará o restante da primeira parcela e marca um encontro em local próximo ao morro do Castro.

Filipe então vai ao local com sua esposa, Rayssa dos Santos Ferreira, 23, e o filho do casal, Miguel Filipe dos Santos Rodrigues. No endereço, dois homens em um moto passam ao lado do carro e efetuam ao menos 20 disparos.

Rayssa e Filipe morreram na hora. O bebê chegou a ser protegido pela mãe, mas morreu no hospital. Ainda não se sabe quem fez os disparos.

A Folha tentou contato com familiares da família morta. Uma prima de Filipe disse não querer comentar o caso, e o padrasto de Rayssa não se manifestou.

QUEM É NAÍBA

Apontado como chefe do tráfico do morro do Castro pela polícia, Lucas Lopes da Silva, o Naíba, possui nove anotações criminais no sistema da Polícia Civil do Rio de Janeiro.

Ele foi preso pela primeira vez em 2012 por tráfico drogas e acabou absolvido em 2016. No mesmo ano, a Justiça autorizou a quebra do sigilo de seu telefone para uma investigação sobre o tráfico em Niterói.

Em 2017, foi preso em Vassouras (RJ), suspeito de tráfico e receptação, sendo condenado a quatro anos de prisão em regime fechado.

Após três anos preso, ganhou a liberdade em março de 2020, mas dois mandados de prisão foram expedidos em agosto e setembro deste mesmo ano por tráfico e receptação.

Naíba voltou a ser detido em julho de 2023, após uma denúncia anônima. Segundo a PM, agentes do 7º BPM (São Gonçalo) foram checar uma denúncia de homens armados em um beco e, após troca de tiros no local, encontraram Naíba e o prenderam com os mandados de prisão de 2020. Na ocasião, Naíba passou um mês e 15 dias na prisão antes de ganhar a liberdade.

À Justiça ele disse que tem o ensino fundamental completo, cinco filhos pequenos e, como profissão, ser entregador. A defesa nega que ele esteja envolvido nos crimes citados nos processos.

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