Descrição de chapéu Obituário Adilson Sanchez (1963 - 2024)

Mortes: Apaixonado pela escrita, era advogado sério e ser humano brincalhão

Adilson Sanchez foi ainda autor e professor referência no direito trabalhista e previdenciário e vivia com intensidade

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São Paulo

Nem o semblante firme e confiante, acompanhado da formalidade de ternos e gravatas, era capaz de esconder o enorme coração de Adilson Sanchez, um homem que, mesmo num passado mais machista e insensível, sabia que chorar era um ato poderoso, que não deveria ser evitado.

Também não tinha medo de dar vazão a seu lado brincalhão, fazendo piadas e gracinhas por vezes embaraçosas, mas que agora se transformam num importante legado. Mesmo em sala de aula ou no escritório de direito trabalhista e previdenciário, encontrava momentos para descompressão em meio ao estresse diário.

Na fila do vestibular, indeciso entre o jornalismo e o direito, optou pelas leis, que já estavam na família e que absorveria de forma a se tornar uma enciclopédia de normas e tratados. Passaria, no entanto, o amor pelo jornalismo ao filho, estimulando-o a ler os cadernos para crianças desta Folha e do Estadão nas manhãs de fim de semana.

Adilson Sanchez (1963 - 2024)
Adilson Sanchez (1963 - 2024) - Arquivo pessoal

Assim, tornou-se referência em sua área de atuação e publicou mais de uma dezena de livros, frutos de sua paixão pela escrita. Entre eles, "600 Perguntas e Respostas de Direito Previdenciário", "A Contribuição Social Ambiental – Direito Ambiental do Trabalho" e "Na Boleia da Tribuna", uma coleção de memórias.

Era vaidoso na profissão. Sua coleção de gravatas ocupava vários cabides do guarda-roupa, e as peças se transformavam em estandartes das mais diversas cores e ilustrações —de simples retas paralelas a chocolates M&M’s. Sua regra, ao ministrar algum curso, era nunca repetir a mesma gravata nas aulas.

Tudo o que se propunha a fazer, fazia com extremo perfeccionismo, dedicação e amor. As aulas de graduação e especialização que ministrava à noite, após longas horas em seu escritório, eram movidas pelo desejo de passar conhecimento adiante e de formar advogados cientes do poder transformador que teriam em mãos.

Em casa —ou na rua, sem perceber—, ouvia e cantava alto, levado pela música, artistas como Elis Regina e Roberto Carlos. Mas em seus vários aparelhos iPod e MP3, que não aposentou mesmo quando o streaming defasou tais tecnologias, guardava uma biblioteca muito eclética.

Passava horas montando playlists inspiradas em sentimentos e memórias, como as do Colégio São Miguel Arcanjo e do Clube Atlético Juventus, na zona leste de São Paulo, ou as da infância, assistindo a "Star Trek" e "National Kid" embaixo da mesinha da sala, depois da escola. Pelo radinho, viajava com frequência à Inglaterra, lar de amigos que acabaram por virar família.

Em seu fone soavam acordes de MPB, soul, pop, rock, disco e, em especial, música romântica italiana. O gênero evocava suas raízes familiares e ajudava a entender seu lado excessivamente —mas não de forma negativa— dramático e passional.

Amava quem mal conhecia com intensidade, e mais ainda amigos e família. Para os membros dos dois grupos, era um arquivista, já que dedicava muito tempo e energia a organizar fotos, filmagens, documentos, recortes de jornal e qualquer item importante para a sua trajetória.

Poderiam chamar-lhe de acumulador, mas esse lado ilustrava apenas a nostalgia e a vontade de honrar um passado que, por mais que quisesse, não voltaria. Por isso, fazia questão de criar novas memórias tão fortes quanto, salientando para aqueles com quem convivia a importância de terem bons momentos juntos.

Chorava por tristeza, alegria, amor, orgulho, saudade e às vezes sem nem entender muito bem o porquê, mas tinha nas lágrimas uma de suas formas de expressão mais poderosas e verdadeiras.

Morreu repentinamente no dia 10 de junho, aos 60 anos, após sofrer uma parada cardiorrespiratória em casa, em Praia Grande, no litoral paulista. Deixa agora muitos rostos cobertos por essas lágrimas, de colegas de trabalho, ex-alunos, amigos, familiares e dos dois filhos, Leo, "um cara bacana", e Gika, a "bonequinha do papai".


coluna.obituario@grupofolha.com.br

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