O pastor Silas Malafaia tinha 7 anos de idade quando o reverendo Martin Luther King Jr. ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 1964. No ano anterior, Luther King havia reunido 250 mil pessoas no Memorial Lincoln, na Marcha por Empregos e Liberdade em Washington. Quantas pessoas Silas Malafaia reunirá na avenida Paulista saberemos neste sábado, 7 de setembro.
Embora seja absurda qualquer comparação entre o lendário pregador batista, de voz aveludada e cheia de poesia, e o assembleiano carioca, de voz aguda e palavrório coloquial, é fato que Malafaia, assim como fazia seu irmão do Norte, leva pessoas às ruas por uma causa que cruza fé e política.
Gostemos ou não de Malafaia, sejamos justos: ele é o único líder religioso que fez isso na história recente do Brasil. Friso: um líder religioso convocando, com seu CPF, pessoas para irem protestar na avenida Paulista é obra de um pentecostal carioca chamado Silas Malafaia.
Mas o que ele quer com a manifestação de sábado? Seus objetivos declarados são o impeachment e a prisão de Alexandre de Moraes, não necessariamente nessa ordem. A revelação, por esta Folha, sobre os procedimentos utilizados pelo ministro, como relator do inquérito das fake news e presidente do TSE, deu fôlego para a convocação da manifestação.
Os experimentos de Malafaia entre púlpito e palanque começaram com o apoio a Leonel Brizola em 1989, passaram pelos apoios a Lula em 2002 e Marina Silva em 2010, a qual ele renega para declarar apoio a José Serra. Desde então, a simbiose entre o púlpito e o palanque foi se aperfeiçoando em sua trajetória. Hoje, pregação e lacração política nas redes sociais se confundem na boca dele. Claro, tudo lastreado por eternos interesses terrenos.
Quando o pastor pisar no palco do carro de som na manifestação do dia 7 de setembro, já terá seu lugar assegurado na história política do Brasil. Não importa o resultado prático do evento. E digo que não importa porque o único que deverá ganhar com a união da direita no evento é o candidato Pablo Marçal.
Martin Luther King, em um de seus últimos sermões, diante das ameaças de morte que vinha sofrendo, disse: "Não importa o que me aconteça, eu estive no alto da montanha". Do alto do carro de som, Malafaia pode posar de mártir, gritando que podem prendê-lo, como tem dito inúmeras vezes.
Contudo, não é a prisão que tirará Malafaia de cena. É Marçal ou algum sucedâneo genérico dessa combinação turbinada entre religião, política e redes sociais que tomará o lugar tanto dele quanto de Bolsonaro.
O pregador batista tinha um sonho, o combate ao racismo institucional nos EUA. Já Malafaia tem uma ideia fixa: prender Alexandre de Moraes. A fixação com a deposição de Moraes esconde a ambição inconfessável do pastor: tornar-se um aiatolá evangélico, ou seja, aquele que governa os que governam.
Mas a avenida Paulista não vive só de Silas Malafaia e Jair Bolsonaro. Felizmente, o mundo evangélico é plural e, no dia 24 de agosto, cerca de 20 mil evangélicos convocados pela Igreja Adventista do Sétimo Dia protestaram na avenida contra o abuso sexual infantil.
Malafaia não estava lá. Ele bem que poderia ter usado seu poder para dar uma força aos adventistas. No entanto, a direita bolsonarista só fala em pedofilia para acusar a esquerda. É só retórica. Aliás, o Projeto de Lei 1904/24, conhecido como PL do Estuprador, é de autoria de Sóstenes Cavalcante, preposto de Malafaia.
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