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Ensino médio deve visar, mais que vestibular, o gosto pelo saber, diz pesquisadora

Silvia Colello afirma que formação de adolescentes não pode ser guiada apenas pela preparação para os exames

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Lisandra Matias
São Paulo

Mais do que preparar o estudante para o desafio do vestibular, escolas de ensino médio têm a missão de oferecer a ele formação humanística, para que possa se posicionar de modo ativo, ético e crítico no mundo.

Assim pensa a pedagoga Silvia Gasparian Colello, professora e pesquisadora da Faculdade de Educação da USP. Para ela, tão importante quanto ensinar é viabilizar o gosto pelo conhecimento, o prazer de aprender.

A pedagoga Silvia Gasparian Colello em São Paulo
A pedagoga Silvia Gasparian Colello em São Paulo - Bruno Santos/Folhapress

 

Qual o papel que o vestibular deve ter no ensino médio? A preparação para o vestibular é relevante, mas não pode ser a norteadora da formação dos adolescentes. A escola deve oferecer uma formação humanística e abrir a possibilidade para que o aluno seja produtor de conhecimento. Significa criar situações, como pesquisas e projetos, para que o conhecimento seja produto do trabalho intelectual e afetivo do estudante.

O que caracteriza esse aspecto humano e afetivo? O jovem tem que viver bem a etapa escolar em todos os seus aspectos —a aquisição de conhecimento, a organização do estudo, os relacionamentos interpessoais, os namoricos. Tudo isso responde ao aspecto da formação do humano, da constituição do sujeito que é social, aprendiz, pesquisador, afetivo e ético. Viver isso com intensidade é importante não só para a vida universitária e profissional, mas também para a constituição de si.

Qual o risco de um ensino focado demais no vestibular? Esse tipo de ensino se baseia na lógica do certo e do errado, como se o conhecimento fosse um pacote pronto. Mas sabemos que nenhuma ciência está acabada e que o conhecimento avança justamente pelas mentes brilhantes que têm uma postura inquisitiva frente ao mundo. Infelizmente, muitas vezes, as escolas abafam isso e impõem a cultura do silenciamento, do “cala a boca” e do ensino pré-formatado. 

Mas isso também não ocorre devido à pressão dos pais, que desejam que seus filhos passem a todo custo? Sim, é o caso de escolas que se comportam como empresas e querem atender a demanda mais imediata do cliente. Confundir escola com empresa é descaracterizar a natureza do seu objetivo, que é a formação humanística.

Tenho visto jovens que entram na universidade, muitas vezes até bem colocados, mas que ingressam com falhas. Eles não sabem fazer pesquisa (estudaram com um método apostilado em que o conhecimento vinha pronto), têm dificuldades para trabalhar em grupo, dividir tarefas e de apresentar e defender suas ideias.

Muitas instituições preparam para o vestibular, mas não para a vida universitária, é isso? Sim, parece contradição. O ensino focado no vestibular tende a ser conteudista, feito na perspectiva do professor que detém o conhecimento e do aluno que não sabe. Mas, na universidade e na vida profissional, não vigora o saber doado, mas o construído, em que o estudante é o protagonista da sua formação.

Uma preocupação comum entre pais de adolescentes é o desinteresse dos filhos pelos conteúdos e até mesmo pelo colégio. Como reconquistá-los? Na adolescência, são muitos os fatores que atraem para uma vida extraescolar: a banda, a balada, a sexualidade, questões políticas etc. A escola tem, então, o desafio de recuperar seu sentido. Pode fazer isso abrindo espaço para que estudantes levem suas inquietações. Se esse jovem que está sendo atraído para o mundo chega à escola e a primeira coisa que ouve é sobre a proibição do celular ou da conversa entre alunos, a instituição está indo contra um aspecto muito importante para ele, mas que deveria ser compatível com a vida escolar.

Como ressignificar o vestibular para além das cobranças de sucesso? O vestibular pode funcionar como rito de passagem, momento para o estudante se perguntar o que quer da vida. Não só que curso vai seguir, mas quem quer ser e de que jeito quer viver. As escolas devem fornecer informações e ferramentas para ajudar nessa reflexão.

Qual o modelo ideal para concluir a educação básica? O papel da educação em geral, e do ensino médio em particular, é a formação do homem para a humanização e para o combate à barbárie.

 

Silvia Gasparian Colello, 59
Formada em pedagogia com mestrado, doutorado e livre-docência pela Faculdade de Educação da USP, é professora e orientadora na pós da universidade, onde desenvolve pesquisas na área de ensino

A pedagoga Silvia Gasparian Colello na janela da sua casa em São Paulo
A pedagoga Silvia Gasparian Colello na janela da sua casa em São Paulo - Bruno Santos/ Folhapress
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