MEC faz conferência sobre alfabetização, mas não detalha verba para política

Conferência Nacional não tem participação de órgão de secretarias municipais de Educação, que concentram alunos

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Brasília

Mais de seis meses após a publicação de um decreto que instituiu uma nova política de alfabetização, o governo Jair Bolsonaro (PSL) iniciou nesta terça-feira (22) uma conferência com palestras e debates sobre o tema. Não há até agora, no entanto, definição sobre como será a implementação nas redes de ensino e qual será o orçamento.

O evento ocorre até sexta-feira (25) com mais de 50 palestrantes, nacionais e internacionais. Não há a previsão de participação, por exemplo, da Undime, a organização que reúne os secretários municipais de Educação. 

As redes municipais concentram 69% dos alunos de educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental, foco da nova política. A alfabetização foi alçada a prioridade pelo governo Bolsonaro, mas até agora as redes de ensino não sabem o que será feito pelo governo federal. 

A avaliação do presidente da Undime, Luiz Miguel Garcia, é que falta diálogo e não haverá viabilidade para implementação no próximo ano. 

"Há um holofote na questão da alfabetização, pode ser interessante, mas sinto falta desse diálogo na construção da nova política. A Undime foi ouvida uma única vez e estamos no processo de conhecer quais são as propostas e como isso se concretiza", diz ele, que não chegou a ser citado na abertura do evento. 

"Nosso temor é exatamente sobre como uma política gerada com tão pouca consulta a essas bases que executam e efetivam podem ter condições materiais de execução." 

O sucesso da política esbarra, segundo especialistas, no perfil dos cursos de formação dos professores, considerado deficiente, e no desafio de chegar às escolas, ligadas às redes municipais e estaduais. 

Apesar de não definir um cronograma, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, disse que a política chegará às salas de aula em 2020. O orçamento não foi definido mas, segundo ele, será o suficiente para bater as metas —o ministro não especificou quais metas se referia. 

"Quanto custa botar todas as crianças na pré-escola e creche? R$ 3 bilhões por ano, é o preço de uma federal", diz ele, que recorrentemente tem criticado as universidades ligadas ao MEC. "Eficiência e gestão técnica é mais importante do que quanto dinheiro a gente vai jogar do pagador de imposto na privada e dar descarga".

Weintraub afirmou ter confiança em conseguir convencer Bolsonaro e a área econômica a liberar recursos quando o programa estiver pronto.

A PNA (Política Nacional de Alfabetização) do governo Bolsonaro prioriza o chamado método fônico (que concentra a atenção na relação entre sons e letras). O foco do evento é aprofundar os conhecimentos em torno de evidências sobre essa abordagem no Brasil e em outros países.

Defensores do método fônico defendem que há evidências científicas robustas sobre sua eficiência. Afirmam ainda que haveria preconceito ideológico com relação ao método.

Especialistas e secretários da área defendem que o MEC não deve impor uma pedagogia e condicionar sua adoção à assistência técnica e financeira. Além disso, há discussões sobre a necessidade de conciliar diferentes metodologias e respeitar a autonomia das redes.

O secretário de Alfabetização do MEC, Carlos Nadalim, afirmou que a realização do evento já é parte da implementação, assim como a adesão do Brasil a uma avaliação internacional de alfabetização chamada Pirls e o lançamento, em agosto, de um caderno que explica e apresenta a política. 

Está previsto para abril de 2020, após o início das aulas, um novo relatório, escrito a partir dos encontros desta semana. O texto trará recomendações relacionadas a currículos, formação de professores e experiências exitosas nacionais e estrangeiras.

"O relatório vai guiar as ações e programas do MEC que serão lançados, mas a adesão é voluntária, não vamos impor nada às redes", disse Nadalim, que chegou ao governo a partir da indicação do escritor Olavo de Carvalho, considerado o guru intelectual do bolsonarismo.

"A diferença é que essa politica pela primeira no Ministério da Educação abre espaço para cientistas, para as evidências científicas".

De acordo com membros do governo e especialistas envolvidos nas discussões, a realização dos debates com especialistas é um caminho natural para consolidar o desenho da política e aprofundar os fundamentos. 

O MEC batizou o evento como Conferência Nacional de Alfabetização Baseada em Evidências.

Conferências nacionais têm o caráter de ser uma instância periódica de debates com participação da sociedade civil —em geral, são precedidas de encontros regionais. Não há previsão, no entanto, de outros debates sobre o tema.

A programação da conferência prevê palestras sobre como as crianças adquirem habilidades de leitura, rotinas de aprendizagem para criar aulas mais inclusivas e políticas de avaliação, ente outros assunto. Há palestrantes dos Estados Unidos, Alemanha, Portugal, Chile e de universidades brasileiras.

Entre os convidados, estão Linnea Ehri, da Universidade da Cidade de Nova York, e Annemarie Fritz-Stratmann, da Universidade Duisburg-Essen, da Alemanha. Os únicos representantes de redes de ensino na programação são dois secretários municipais, de Sobral (CE) e Teresina (PI).

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