Descrição de chapéu Coronavírus

Médico citado em liminar contra aulas diz que só defendeu a vacinação de professores

Paulo Saldiva, da USP, redigiu documento a pedido de sindicato, mas afirma que foi um erro e se diz aliviado com a queda da liminar

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São Paulo

O médico que teve um parecer citado pela liminar que havia proibido a volta às aulas presenciais em São Paulo afirmou à Folha que sua intenção era apenas defender que os professores fossem considerados prioritários na vacinação.

Paulo Saldiva, professor de patologia da Universidade de São Paulo, redigiu um documento a pedido da Apeoesp, o principal sindicato de professores de São Paulo, que, com outras cinco entidades, entrou com a ação judicial contra a abertura das escolas.

O pedido havia sido acatado pela juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti, da 9ª Vara da Fazenda Pública, que concedeu na quinta-feira (28) uma liminar vetando as aulas presenciais. Após recurso do governo do estado, a liminar foi cassada nesta sexta-feira (29) pelo presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Geraldo Pinheiro Franco.

“Foi um erro meu ter feito esse parecer, eu não tive dimensão das consequências que isso teria. Estou sendo massacrado nas redes sociais e nem consegui dormir. Tudo o que escrevi está correto, mas o documento acabou entrando como trunfo em um contexto muito maior e, de certa forma, fico aliviado que a liminar tenha caído.”

Segundo Saldiva, a Apeoesp lhe ofereceu pagamento pelo parecer, o que ele recusou: “Seria conflito de interesse, eu sou professor da USP, nunca cobraria por algo relacionado a uma questão pública”, disse.

No parecer, ele informa ter sido consultado pela Apeoesp sobre a segurança do retorno às aulas presenciais nas escolas paulistas sem que houvesse previamente acesso dos profissionais de educação à vacina. “Se o vocábulo ‘segurança’ significar ‘presença de condições que assegurem a garantia ao direito à saúde e ao direto à vida’, a resposta é não.”

Ele defende que os professores sejam considerados prioritários no cronograma da vacinação, mas não opina sobre a reabertura das escolas. “Nem poderia fazer isso. Essa é uma resposta que envolve outras questões além da contaminação, e eu não tenho todas as variáveis”, afirmou.

Pessoalmente, no entanto, ele afirmou à Folha que concorda com a urgência da reabertura e endossa a posição da Sociedade Brasileira de Pediatria favorável às aulas presenciais. “Olhando para as crianças, sabemos que elas precisam voltar o mais rápido possível. Se olharmos para o professor, não podemos negar que haverá risco, e por isso eles devem ser colocados como prioridade na vacinação.”

Segundo o médico, que estuda a transmissão de doenças pelo ar, é possível considerar que haja escolas que ofereçam menor risco de transmissão, como aquelas capazes de manter o distanciamento e de garantir circulação de ar nos ambientes.

“Idealmente, deveria haver inspeção para determinar quais escolas podem abrir e quais não podem, mas, assim, também ampliaríamos o fosso da desigualdade, porque certamente as mais pobres teriam de seguir fechadas. Portanto, abram-se as escolas, mas inicie-se a vacinação dos professores. Isso me parece justo.”

Na quinta-feira, circulou entre educadores um áudio da deputada estadual Professora Bebel, do PT, presidente da Apeoesp, afirmando ter feito uma “engenharia para conseguir a liminar”. A Folha teve acesso ao áudio, com a seguinte íntegra: “Pessoal, uma notícia boa, finalmente. Nós ganhamos a liminar para a suspensão das aulas nas três esferas, municipal, estadual e a rede privada. Então foi uma grande vitória, repassem. Amanhã ninguém tem que ir, vale a liminar. É isso. Por ora nós tempos ela. Depois, como conseguimos, a gente vai contar na reunião, mas foi uma engenharia”.

O secretário de educação de São Paulo, Rossieli Soares, afirmou à Folha que o áudio “causou estranheza”. “O que ela quer dizer com engenharia? Que tipo de preparação pode ter sido usada para ela falar nesse tom? Foi algo não republicano? Ela, como deputada e presidente do sindicato, deve uma explicação à sociedade.”

Bebel disse à reportagem que “não há nada de ilícito” no áudio. “A engenharia é como nós conseguimos, a engenharia jurídica. E eu vou explicar para a minha diretoria”. Ao ser questionada sobre qual foi a engenharia jurídica, ela disse que foi “a ação judicial, o parecer do dr. Saldiva, eu falo disso, não tem maldade nenhuma”.

Sobre o áudio, Saldiva disse que “não teve engenharia nenhuma”. “O sindicato e o governo não têm uma relação das mais amorosas, o que não é bom”.

A retomada das aulas presenciais mesmo nessas fases mais críticas foi autorizada pelo Plano SP, do governo estadual, com base na orientação do Centro de Contingência do Coronavírus, formado por especialistas da área de saúde.

O entendimento é o de que as escolas, além de não se mostrarem tão relevantes como focos de transmissão, devem ser consideradas atividades essenciais, como hospitais e mercados, permanecendo aberta com protocolos de segurança. A reabertura considera na equação, além da Covid-19, riscos do fechamento, como violência doméstica, subnutrição, evasão escolar e problemas de saúde mental de crianças e jovens.

Para as fases vermelha e laranja, é permitida a presença de 35% dos alunos. Na amarela, sobe para 70% e na verde, todos os estudantes podem frequentar a escola.

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