Descrição de chapéu The New York Times

Hipnose auxilia na ansiedade e dor crônica, mas exige esforço do paciente

Especialistas dizem que nem todos conseguem chegar ao estado em que os benefícios da técnica são atingidos

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Hannah Seo
The New York Times

Na década de 1770, um médico alemão chamado Franz Mesmer causou sensação quando disse que podia curar doenças físicas e mentais colocando as pessoas em transe para realinhar seus campos magnéticos. O "mesmerismo" foi popular durante cerca de uma década até ser publicamente desacreditado em 1784, mas alguns elementos da prática persistiram.

Em 1841, o cirurgião escocês James Braid começou a usar uma técnica semelhante de atenção fixa para curar dores de cabeça, aliviar dores no geral e anestesiar pacientes. Ele a chamou de "hipnose", derivado de Hypnos, o deus grego do sono.

Hoje, a hipnose, também chamada de hipnoterapia, tem muito mais dados para respaldar seu uso em condições de saúde mental, como ansiedade e depressão. Também pode ser um tratamento eficaz para problemas de sono, dores, síndrome do intestino irritável e tabagismo, segundo mostram estudos. E ainda é usado às vezes como uma forma de sedar pacientes para cirurgia com pouca (ou nenhuma) medicação.

Hipnose pode ajudar no tratamento de condições crônicas - Pixel-Shot /Adobe Stock

Apesar dessas diversas aplicações, a hipnose não consegue afastar sua reputação como uma brincadeira cênica –em que você olha para um relógio de bolso e depois cacareja como uma galinha– ou uma maneira de recuperar memórias perdidas (que podem ser enganosas) e sondar "vidas passadas" (pseudociência).

Especialistas dizem que é uma técnica que requer diligência e foco, semelhante à atenção plena ("mindfulness") e à meditação. Aqui está o que é preciso saber.

O que é hipnose?

A maneira mais simples de descrever a hipnose é como um estado de relaxamento profundo e atenção concentrada, no qual sua mente está mais receptiva a fazer mudanças sutis em sentimentos e comportamentos.

A intensa concentração e o foco da hipnose podem soar estranhos, mas não são diferentes de "estar absorto em um bom livro ou filme, perder-se na internet ou navegar em seu telefone", diz Elvira Lang, radiologista e fundadora da Comfort Talk, serviço que treina equipes médicas para reduzir a ansiedade e a dor em pacientes hospitalares usando linguagem hipnótica (assim chamada porque as pessoas costumam ter medo do que ela chama de "palavra com H"). Você está absorto, menos consciente de seu ambiente físico ou sensorial, extasiado, mas ainda descontraído.

A hipnose terapêutica formal tem mais algumas etapas. Primeiro, um hipnotizador tentará induzir um estado hipnótico fazendo que você relaxe e se concentre em suas palavras. Assim que você for induzido, ele falará com você através de sugestões baseadas em seus objetivos naquela sessão. Se você estiver tentando superar o medo de voar, ele poderá dizer que o avião é uma extensão do seu corpo e fazer você se imaginar flutuando com o avião pelo céu.

O paciente deve ficar tão concentrado nas palavras do hipnotizador que todo o resto desaparece, diz David Spiegel, psiquiatra da Universidade Stanford e um dos principais pesquisadores da hipnose. O objetivo é que as sugestões que você escutar nesse estado de transe modifiquem sua perspectiva, sentimentos e, eventualmente, comportamentos.

Além da hipnose presencial tradicional, há sessões de hipnose online e uma série de aplicativos com vídeo e áudio pré-gravados; alguns também o conectarão com hipnotizadores remotamente. Geralmente são genéricos e funcionam para problemas comuns, como insônia e tabagismo.

Quem pode se beneficiar da hipnose?

Tonja Langis, 47, foi diagnosticada com transtorno de estresse pós-traumático complexo que, para ela, é acompanhado de dor crônica, ansiedade e perda de autoconfiança. Ela faz terapia individual e em grupo para traumas há 11 anos e tentou uma variedade de tratamentos.

Langis iniciou sessões de hipnoterapia em pequenos grupos há quase um ano, e agora faz sessões individuais uma vez por semana com seu psicólogo em Nashville, no Tennessee.

Durante as sessões, Langis conta que há um "distanciamento das sensações de dor" que ela costuma experimentar, e que ela se sente "muito confortável" em seu corpo. "Parece um estado de relaxamento mais profundo do que a meditação", diz.

A dor de cada pessoa é individual, com diferentes causas e reações ao tratamento. Mas "está muito claro agora" que a hipnose pode ser eficaz para a dor, pontua Afik Faerman, pesquisador de pós-doutorado em neuropsicologia clínica que trabalhou com hipnose. O controle da dor é uma das aplicações mais estudadas da hipnose, diz ele, e pesquisas sugerem que é eficaz para ajudar as pessoas a lidar com dores agudas e crônicas.

Langis aponta que a hipnose a ajudou com a síndrome do intestino irritável. Desde o início, "só tive duas crises, o que é uma grande redução para mim".

As condições que Langis enfrenta –dor crônica, síndrome inflamatória intestinal, estresse e ansiedade– são algumas em que a hipnose é mais comumente aplicada. Também é frequentemente usada para insônia e dependência química. Mas não funciona para todas as pessoas.

Indivíduos com doença mental extrema, esquizofrenia e outras formas de psicose não são bons candidatos à hipnose, indica Lang, em parte porque tendem a não ser hipnotizáveis e também porque o tratamento pode ser emocionalmente difícil para pessoas com essas condições.

A própria capacidade de ser hipnotizado é outra limitação. Uma pessoa pode sucumbir imediatamente e prontamente aceitar sugestões, enquanto outra nunca sentirá que está entrando em estado hipnótico.

Essa capacidade apresenta uma curva em forma de sino, diz Spiegel. Estudos sugerem que de 10% a 15% das pessoas são facilmente hipnotizáveis, enquanto outros 10% a 15% têm dificuldade para ser hipnotizados ou simplesmente não conseguem. O restante, a maioria de nós, está em algum lugar no meio –de leve a moderadamente hipnotizável.

É difícil dizer o quão hipnotizável você é sem uma triagem formal. Lang afirma que viu pessoas extremamente céticas se tornarem muito hipnotizáveis, e pessoas que estão animadas para tentar descobrirem que não funciona para elas.

"Vejo a hipnose como um talento ou uma habilidade", como um bom ouvido para música, diz Mark P. Jensen, psicólogo da saúde na Escola de Medicina da Universidade de Washington. "Algumas pessoas são Mozarts, mas a maioria de nós não."

A hipnose é melhor usada em combinação com diferentes tipos de terapia, como a TCC (terapia cognitivo-comportamental), segundo Faerman. "A hipnose com TCC é mais eficaz do que qualquer uma delas individualmente", aponta ele, conforme demonstrado em pesquisas sobre sua eficácia no tratamento de obesidade, dor e angústia em pessoas com fibromialgia e transtorno de estresse agudo.

Para Lindsey C. McKernan, psicóloga clínica do Centro Médico da Universidade Vanderbilt, que usa a hipnose em seu trabalho, o treinamento veio com sua formação como psicóloga clínica. Mas nem todo psicólogo clínico necessariamente terá esse treinamento. Para encontrar um hipnotizador, primeiro procure um terapeuta licenciado que possa trabalhar com você na hipnose ou encaminhá-lo para alguém capacitado. (Os especialistas recomendam primeiro consultar um profissional antes de começar com aplicativos ou gravações.)

Se quiser experimentar, saiba que haverá esforço

Como hipnotizador, diz Spiegel, "meu trabalho é identificar sua capacidade de ser hipnotizado, estimulá-lo e ensiná-lo a usar essa capacidade para resolver um problema". Assim como em outras terapias, ver os resultados da hipnose exige tempo e prática. Se você estiver lidando com uma condição crônica, exigirá tratamento regular.

Rachael Howe, 32, enfrenta dores crônicas nas costas desde que identificou hérnias em três discos entre 2013 e 2016. A dor física e o sofrimento mental impediram que ela tivesse um sono reparador. Howe, que mora em Auburn, em Washington, tentou anos de terapia física e psicoterapia, além de medicamentos, mas eles não ajudaram muito, segundo disse.

Cerca de um ano e meio atrás, ela tentou uma sessão de hipnose remota após indicação de um terapeuta anterior. Em uma sessão inicial de relaxamento e sono, o psicólogo a levou para um passeio imaginário pelas montanhas Cascade, onde ela havia se casado. Ele descreveu flechas no chão que a levariam a níveis mais profundos de relaxamento.

Conforme ela andava, afirma Howe, ela sentiu sua dor desaparecer enquanto seu corpo diminuía a tensão. "Na verdade, acabei adormecendo", diz ela –seu terapeuta encerrou a sessão e eles remarcaram. "Não acredito que consegui algumas horas."

Howe fez muitas sessões desde então, concentrando-se em aumentar a tranquilidade, controlar a dor e reformular os pensamentos negativos.

"O cenário ideal é que os pacientes trabalhem com um hipnotizador e aprendam as técnicas para realizar essas sessões sozinhos", indica David Patterson, especialista em dor e psicólogo clínico da Escola de Medicina da Universidade de Washington, que é o clínico de Howe. Praticar dessa maneira é especialmente importante para condições "como dor crônica, em que você precisa de alívio por um longo período de tempo".

Langis notou que o alívio imediato da dor e da fadiga que ela obtém por meio da hipnose diminui após alguns dias. Ela reforça regularmente, revendo gravações das sessões anteriores, e diz que está se aprofundando no estado hipnótico com o tempo. "Conforme pratico, vejo cada vez mais benefícios e, portanto, fico mais animada a praticar mais", diz ela.

Depois de ouvir novamente as sessões e treinar para permanecer em estado hipnótico, Howe disse que agora sente que tem disciplina e habilidade para acalmar seu corpo e sua mente quando a dor aumenta.

"Não é que funcione 100% do tempo", diz ela, mas "quanto mais você faz, mais você ganha."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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