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Poluição do ar está associada a alto risco de demência, diz estudo de Harvard

Tabagismo e escolaridade ainda são apontados como ameaças maiores do que os poluentes, segundo os autores

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Nápoles

Partículas finas de poluição dispersas no ar aumentam as chances de desenvolvimento de algum tipo de demência ao longo da vida. Essa foi a descoberta feita por pesquisadores de Harvard, que leram mais de mil trabalhos científicos sobre o tema. A neurodegeneração se soma a muitas outras consequências da degradação ambiental.

Segundo os próprios cientistas, mais de 57 milhões de pessoas no mundo convivem com doenças que afetam a capacidade cognitiva, como o Alzheimer ou Parkinson. Interessados em entender como a poluição do ar pode afetar o desenvolvimento do cérebro, os especialistas fizeram um levantamento nas principais bases de dados científicos disponíveis.

Estudo de Harvard mostra que a poluição atmosférica está relacionada a alto risco de demência - Brian Snyder/Reuters

Eles encontraram 1092 trabalhos originais que satisfaziam critérios de qualidade previamente estabelecidos: 18 anos como idade mínima dos participantes, acompanhamento ao longo do tempo, uso de parâmetros de qualidade do ar oficiais nos Estados Unidos e levantamento dos relatos de demência entre os voluntários. Após filtrar os materiais, eles chegaram a 16 publicações científicas de maior relevância.

Partículas muito finas, com menos de 0,0025 milímetros de diâmetro, chamadas PM2.5, são o poluente mais perigoso encontrado. Nos EUA, a legislação estabelece como concentração mínima o valor de 12 microgramas por metro cúbico, mas os estudos encontraram concentrações ainda menores, de 2 microgramas. Elas foram suficientes para aumentar os casos de demência. No Brasil, a legislação estabelece 25 microgramas como nível mínimo diário.

Admir Targino, professor da UTFPR (Universidade Tecnológica Federal do Paraná), afirma que as principais fontes de emissão do material nas cidades são os escapamentos de carro, a queima de material orgânico e a ressuspensão de poeira. Mas não são só os moradores urbanos que estão sujeitos a esse problema. No campo, as queimadas também jogam grande quantidade do material no ar. O especialista acrescenta que, uma vez na atmosfera, não existe limite mínimo seguro para substâncias que não são naturais.

Outros poluentes analisados pelos cientistas foram os óxidos de nitrogênio e o ozônio. O último não mostrou correlação clara com a perda de cognição. Os resultados foram publicados no início do mês na revista científica The BMJ. Targino pontua que também existe uma preocupação crescente com a toxicidade de compostos minoritários, como as dioxinas, furanos e o carbono negro, também conhecido como fuligem, que causam efeitos nocivos na saúde.

Dentre os aspectos investigados pelos cientistas estão os mecanismos biológicos pelos quais a poluição afeta o corpo humano, mas os pesquisadores concluem que eles ainda não estão completamente esclarecidos. Uma das principais suspeitas dos especialistas é que os poluentes causam problemas cardiovasculares, o que pode levar a quadros demenciais.

Em outra pesquisa, publicada na mesma revista científica, pesquisadores europeus analisaram dados de mais de 300 mil pessoas reunidos em oito grupos de diferentes países e mostraram que um aumento de 5 unidades de concentração do mesmo material particulado está associado a 13% mais de mortes por causas naturais, mesmo em níveis permitidos pela lei.

Professor e pesquisador da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), Helotonio Carvalho diz que além de sintomas mais leves, como irritação de nariz e garganta, náuseas e dor de cabeça, sabe-se hoje que a poluição está associada a asma, bronquite, infarto, enfisema pulmonar, AVC, câncer (principalmente de pulmão), e doenças descobertas recentemente, como o autismo e a redução de fertilidade, além de baixo QI entre recém-nascidos. "Ao longo dos anos, essa lista tem aumentado, infelizmente", afirma.

Os autores da pesquisa ressaltam que, apesar da correlação, os efeitos da poluição do ar são menores do que outros fatores de risco associados à doença, como escolaridade e tabagismo. Estima-se que até 40% dos casos de demência mundo afora possam ser evitados com mudanças de hábitos e medidas preventivas. Ainda assim, argumentam, o tamanho da população mundial que está exposta aos poluentes atmosféricos justifica a tomada de medidas de saúde pública para reduzir esse agravante.

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