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Mulheres falam sobre moda e combatem etarismo nas redes sociais

Elas discutem estereótipos de velhice e incentivam a liberdade de vestir

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São Paulo

O futuro é velho. A frase, da influenciadora Pati Pontalti, dialoga com dados do Sebrae, segundo os quais o consumo de produtos e serviços de pessoas com mais de 50 anos movimenta R$ 2 trilhões por ano no Brasil. "Nós somos o mercado", diz Pati, 49, que é jornalista de moda com 139 mil seguidores no Instagram, onde escreve sobre autoestima, feminismo e envelhecimento.

O mercado está se abrindo, mesmo que tardiamente, para o público mais velho. O da moda é um deles, que descobriu há pouco tempo que as mulheres envelhecem. Exemplo disso é a Vogue, ícone global, que estampou em sua edição italiana de outubro a atriz e modelo Isabella Rossellini, 71, sem lavar a idade de sua cara. "Obrigada por deixarem minhas rugas", escreveu ela em postagem nas redes sociais, onde sua foto repercutiu. Isso após a revista ser criticada por "photoshopar" supermodelos com mais de 50 anos.

É na internet que mulheres acima dos 50 anos estão falando sobre moda e combatendo o etarismo de diferentes formas. Uma delas é Rogeria Maciel, 64, arquiteta e consultora de estilo que possui 138 mil seguidores no Instagram.

Rô, como é chamada, dá dicas para mulheres maiores de 60 que, assim como ela, querem variar e adaptar as roupas ao seu gosto. Em um vídeo ela mostra como se vestir para ir à academia sem se sentir desconfortável, com blusas de tule coloridas que são leves, estilosas e não apertam. "O que existe é você ser autêntica com você mesma", afirma.

A influenciadora e também designer de acessórios sempre apresenta elementos que dão personalidade aos looks, como uma flor de couro preta e colar de correntes que cai sobre o corpo. "Quando você conhece e entende as suas verdades e o que te faz bem, está tudo certo, você pode tudo", diz.

Iara Sanny, 55, também usa as redes sociais para falar de moda sem idade. Formada em direito e funcionária pública da Caixa, ela sempre gostou de moda. Desde quando era criança, ia visitar a mãe em Nova York e tinha contato com marcas como Christian Dior e Tiffany.

Junto com o seu genro, Gustavo Tomas, ela criou uma série de vídeos chamada "esse look é estiloso mesmo ou é por que uma jovem que está usando?", em que adapta um modelo de roupa para si mesma.

No quadro, Sanny mostra uma foto de uma menina vestindo alguma tendência de moda, como o slip dress —vestido de cetim que parece camisola—, e recria o look a partir de peças do seu próprio guarda-roupa. Os vídeos no TikTok já somam mais de um milhão de visualizações

"As mulheres não se sentem livres para vestir o que elas querem, para expressar o que elas são por dentro e colocar isso na roupa delas", afirma. "A roupa não tem idade, a etiqueta só tem P, M e G, então, você pode usar o que você quiser."

A confiança que ela transmite em seus vídeos nem sempre esteve lá. "Eu achava que as pessoas não iam se interessar por alguém da minha idade", diz Sanny, que começou a fazer conteúdos para as redes sociais em junho de 2022 por influência do filho, Gabilo. "Eu tinha preconceito comigo mesma."

A influenciadora conseguiu atingir, além de mulheres na sua faixa etária, um público que não esperava. "O retorno dos jovens é muito positivo, eles conversam de uma forma sem barreira etária."

Ainda assim, recebe críticas de mulheres que questionam os looks de Sanny a partir da idade dela. "As posições negativas também me incentivam a continuar falando sobre etarismo, sobre estar na internet como uma pessoa da minha idade", afirma.

Quebrando estereótipos da velhice estão Gilda Bandeira, 81, e Sonia Massara, 85, donas do perfil Avós da Razão no Instagram com 287 mil seguidores e no YouTube, com 92 mil inscritos. Elas fazem conteúdos bem-humorados conhecendo novos bares, dando dicas de passeios e de receitas. No meio disso, a moda sempre as acompanha.

Sonia Massara e Gilda Bandeira, donas do perfil Avós da Rzão no Instagram
Sonia Massara e Gilda Bandeira, donas do perfil Avós da Rzão no Instagram - Divulgação

As amigas mostram também a liberdade de vestir, apesar de algumas restrições. "A gente já não usa mais aquele salto 15 belíssimo que a gente usava porque não dá, simples assim. Você cai, você não se equilibra mais como antes", diz. "Você adapta o seu guarda-roupa, que é o que eu estou fazendo".

Gilda nunca gostou de tênis, mas passou a usar depois que quebrou o fêmur. Já Sonia ama o seu All Star. "Só de a gente se apresentar assim, fora do padrão do velho, já influencia as pessoas", afirma Sonia. "A gente tem um retorno bem agradável sobre isso", diz Gilda.

"Aquela época em que os velhos e as velhas usavam um pretinho ou um pretinho com um branco, que se chamava de luto aliviado, já era", diz Sonia.

Segundo Pati Pontalti, as discussões sobre esse tema ainda são recentes. "Encarar a maturidade com outros olhos, com olhos de pessoas que podem continuar criando, sendo pertinentes, sensualizando e vestindo moda é algo muito novo", afirma.

Monayna Pinheiro, professora da FAAP e consultora na área de moda e sustentabilidade, diz que há uma euforia em relação ao padrão de beleza da juventude. "É muito difícil a gente ver uma expressão de modelos em uma faixa etária acima dos 35 anos em campanhas de moda e publicidade, que dirá modelos com seus 50, 60 anos".

Levantamento do The Fashion Spot mostra queda de representação de modelos acima dos 50 anos na temporada de moda de outono de 2022 em Nova York, Londres, Paris e Milão. Foram 23 aparições no elenco total, sendo que na primavera do mesmo ano eram 35 modelos mais velhas. O número é quase a metade do pico que ocorreu no mesmo período em 2020, com 44 modelos.

Se o futuro mesmo é velho, dada a projeção do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que indica aceleração do envelhecimento dos brasileiros até 2100, o mercado ainda não está preparado. É o que afirma Pinheiro.

"Estamos ignorando um público-alvo enorme, em potencial", afirma a professora. "Enquanto modelo de negócio é muito promissor, mas a moda precisa também entrar em contato e desconstruir esse tabu em relação à idade."

Pinheiro se refere à falta de uma modelagem direcionada a essas mulheres. "É preciso avaliar aspectos de caimento, o biótipo da mulher é alterado, tem regiões que têm acúmulo de gordura que são diferentes de uma menina mais jovem."

O processo começa na confecção da roupa, quando as medidas e referências são tiradas de uma modelo jovem. "A gente também precisa ter uma identificação com um corpo que seja mais maduro para conseguirmos entender essa transformação. Entender que isso não está ligado a algo pejorativo, pelo contrário, é a transformação do ser humano", diz.

A falta de representação também está na publicidade. Ana Luiza Nascimento, 68, modelo há 11 anos na área de moda e beleza, conta que ficou impressionada com a reação de mulheres diante uma campanha de verão para as Havaianas. Ela aparece de biquíni na praia segurando um cachorro.

Comentários positivos de mulheres diziam que elas estavam se vendo em uma campanha pela primeira vez. "Esse foi o momento que eu me dei conta de que existe uma grande carência dessas mulheres de se verem de biquíni, de qualquer jeito, nas revistas, nos outdoors, em muitos lugares."

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