Presidente da federação de indústrias de Goiás chama quarentena de desastre e compara coronavírus a césio-137

Sandro Mabel criticou quarentena em Anápolis (GO) e disse que evacuados deveriam ir para SP; governador reagiu chamando-o de canalha

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São Paulo

A Fieg (Federação de Indústrias de Goiás) divulgou nesta sexta-feira (7) uma nota em que o presidente do órgão, Sandro Mabel, diz que o governo estadual errou ao aceitar que o governo federal instalasse em Anápolis (GO) uma base de quarentena para os brasileiros que serão evacuados de Wuhan, epicentro da epidemia do novo coronavírus.

Mabel também disse que a população "não suportaria outro trauma" como ocorreu com o acidente radiológico com césio-137 em Goiânia, em 1987.

“Goiás pode ser prejudicado com a discriminação, impactando no turismo, nos negócios, com queda na produção e comercialização de produtos. É um desastre para o estado. Podemos sofrer segregação do que é produzido em Goiás, afetando a exportação de industrializados e carne, por exemplo”, diz o presidente. 

Nota da Federação de Industrias de Goiás diz que quarentena de brasileiros evacuados de Wuhan no estado é um desastre
Nota da Federação de Industrias de Goiás diz que quarentena de brasileiros evacuados de Wuhan no estado é um desastre - Reprodução

O governador do estado, Ronaldo Caiado (Democratas), classificou a nota como "monstruosa". "Estou na Base Aérea de Anápolis onde vamos fazer vistoria ao lado dos ministros da Defesa e da Saúde antes da vinda dos brasileiros da China. Fui informado da nota monstruosa assinada por Sandro Mabel. Chocou nosso Estado de Goiás a posição desse mercenário, canalha e desumano", escreveu em seu perfil no Twitter.

À Folha Mabel disse que tentou falar com Caiado por dois ou três dias, mas não foi recebido. "A gente tem o dever de alertar, é algo que se tem que falar", disse. 

Para ele, o estado de São Paulo deveria receber os brasileiros que serão evacuados de Wuhan.

"Esse é um caso que não tem nada a ver com Goiás. A maioria das pessoas é paulista. Tem um monte de lugar em São Paulo para quarentena. Não é um problema nosso. Nós somos todos brasileiros, mas o problema não é em Goiás, a população é de outro estado, que deveria tomar conta disso. Não é preconceito nenhum, cada um com sua responsabilidade." 

Mabel citou ainda a cerveja Corona, marca do Empório da Cerveja, que foi associada em notícias falsas e piadas na internet com o a epidemia do novo coronavírus. "É muito simples, liga para a fabricante da cerveja Corona e pergunta o que aconteceu com a cerveja deles." 

A Ibrachina (Instituto Sociocultural Brasil-China) publicou nota de repúdio sobre o caso na qual diz que o momento é de solidariedade e não de segregação. "Consideramos que esta manifestação foi de uma insensibilidade desnecessária para com os brasileiros que retornam à sua pátria e para com as famílias que os aguardam. Rezamos para que possam estar juntos em breve", diz o comunicado.

Mais cedo, em evento para divulgar o local, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, cumprimentou o presidente Jair Bolsonaro por realizar a operação.

"Isso vai fazer com que os brasileiros passem a refletir mais sobre o que é ser brasileiro e a importância de serem protegidos por sua nação. Imagino uma pessoa que está em um país e o país nega para ele a condição de ser repatriado. Uma nação que não cuida dos seus próprios filhos, que imagem passa para fora?", disse.

Para o prefeito de Anapólis, Roberto Naves (PP-GO), a população da cidade pode ficar tranquila. "Existe toda uma estrutura montada, até para cuidar das roupas que essas pessoas trarão", afirma. 

O acidente radiológico de césio-137

Uma cápsula de fonte radioativa brilhante foi encontrada e aberta em 13 de setembro de 1987 em um ferro-velho de Goiânia.

A cápsula fazia parte de um aparelho de radioterapia. Doses precisas de radioisótopos servem para destruir células cancerosas.

Só duas semanas depois é que se descobriu a natureza do material. O equipamento pertencia a uma instituição privada, o Instituto Goiano de Radioterapia, que foi desativado em 1985, mas deixado no local.

Na ocasião, pouco mais de 112 mil pessoas foram monitoradas. Destas, 129 apresentaram contaminação, ficaram isoladas de acordo com a gravidade e foram encaminhadas para tratamento. Quatro morreram por síndrome de radiação aguda.

Cerca de 1.100 pessoas receberam uma dose superior a um ano de radiação "de fundo", natural. A chance de desenvolverem câncer pode chegar em 1 para cada 100 casos de exposição.

Uma lei estadual prevê o pagamento de pensão às vítimas da radiação, bem como assistência médica.

Colaborou Natália Cancian, de Brasília

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